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Na Argentina, marcha história decreta que é proibido esquecer as atrocidades da ditadura

"São 30 mil desaparecidos", diziam as mensagens penduradas nos postes e bandeiras desdobradas na emblemática Avenida de Mayo; veja fotos
Maylín Vidal
Prensa Latina
Buenos Aires

Tradução:

A dor na Argentina enche outra vez de nomes e imagens as paredes e as calçadas de um país onde está proibido esquecer, que torna a se levantar para pedir verdade e justiça para seus mortos. 

“São 30 mil desaparecidos”, dizem as mensagens penduradas nos postes e bandeiras desdobradas na emblemática Avenida de Mayo testemunha de tantas marchas, onde a cada 24 de março, não importa de onde você seja, argentino, boliviano ou brasileiro, todos se unem para render homenagem às vítimas do terrorismo de Estado.

Passaram-se 43 anos do fatídico golpe militar que deixaria uma marca inapagável para um país hoje mutilado de dor, que se resiste a esquecer porque há que conhecer o passado para poder dar bom rumo ao futuro. Ali, sob as danças de diversos grupos, sob o bulício de coletivos que repicam tambores, entre bandeiras, consignas, as famílias se unem, é um momento impressionante, carregado de emoção e ainda mais quando irrompem com suas cadeiras de rodas as longevas Mães e Avós da Praça de Maio.

“Mães da Praça o povo as abraça” se ouve em uma onda que se estende até esse histórico lugar em que há quatro décadas, com seus lenços brancos que mais tarde se converteriam em símbolo de resistência, sem medo e em meio ao desespero, saíram a reclamar por seus filhos desaparecidos. 

"São 30 mil desaparecidos", diziam as mensagens penduradas nos postes e bandeiras desdobradas na emblemática Avenida de Mayo; veja fotos

Amanda Cotrim
Fotos ao longo da reportagem fazem parte do ensaio fotográfico realizado pela fotojornalista Amanda Cotrim

As imagens com os rostos de mulheres e homens, alguns realmente jovens, em um longo pendão de fundo azul se vislumbra pela longa avenida. São esses que já não estão, aqueles que foram lançados ao mar nos chamados voos da morte, ou quem sabe ainda hoje onde estarão seus corpos. 

É lindo ver tantas crianças e esses netos, hoje com 43 anos, que depois da incessante busca das Avós conseguiram recuperar sua verdadeira identidade. Este ano encabeçou o bloco das Avós, Manuel Gonçalves, um dos netos recuperados. Ao fundo se ouve música. Não nos venceram, dizem estas lutadoras.

Foto Amanda Cotrim

Enquanto isso, alguns dos que cometeram horrendos crimes pagam suas penas muito comodamente em suas casas, na rua se respira luta desde cedo, recordando uma época triste, dolorosa, dura, inapagável para a história deste país e da América Latina. 

Os vagões da linha A do popular metrô portenho estavam lotados de crianças, jovens, famílias inteiras que iam rumo à emblemática Praça de Maio para acompanhar as mães e avós nesta jornada.

Foto Amanda Cotrim

Mostrando seu descontentamento social pelas políticas aplicadas pelo atual Governo, se escutavam cantos e frases fortes contra o Executivo Nacional. “Olé, olé, olé, olá, como aos nazistas lhes vai passar, aonde forem os iremos buscar”, repetiam alguns.

A marcha era desbordante, centenas se abraçavam, cantavam, choravam e olhavam para o céu em honra aos desaparecidos.

Foto Amanda Cotrim

Ali, no meio da multidão, chegada da localidade bonaerense de Florencio Valera estava Leticia Bolaños com seu bebê de quatro meses e seu esposo. 

Todos os anos estamos aqui, declarou a Prensa Latina enquanto mostrava seu bebê de quatro meses, que chamou de Fidel Alejandro em honra ao líder histórico da Revolução cubana, Fidel Castro.

Foto Amanda Cotrim

Temos que estar aqui porque essa é um luta que não termina, continuamos buscando mais de 300 crianças desaparecidas e reivindicando  que são mais de 30 mil desaparecidos.

Não podemos esquecer que mataram uma geração completa com uma ideologia muito clara de uma pátria onde estejam todos incluídos, não só os oligarcas. e desde pequenos temos que trazer nossos filhos para que não esqueçam o que aconteceu neste país, remarcou. 

Foto Amanda Cotrim

Bolaños continua lutando porque quer uma Argentina melhor, um futuro para o seu pequeno Fidel Alejandro, diz, com a esperança de que junto a outros países possamos seguir construindo a Pátria Grande. 

É domingo, mas as ruas estão intransitáveis. O colorido dos blocos, organizações de todo tipo, sem distinção de raças nem credos, acompanhando as Mães e as Avós. 

Foto Amanda Cotrim

“Não é uma data de celebração, mas sim de memória, disse ao chegar à Praça a líder das Avós, Estela de Carlotto, que celebrou “a batalha que nos permitiu recuperar 127 netos”. Mas a luta continua. 

“Isto não tem tempo, mas tem que ter respostas. A sociedade não tem que ficar em branco com uma história tão tremenda, que foi totalmente clandestina. E por isso essa escuridão e incerteza que nos oprime há tantos anos”, assinalou em meio a uma multidão que a escoltava e as suas companheiras de luta pela recuperação dos netos. 

Pelos desaparecidos, por uma Argentina que não esquece nem esquecerá seus mortos, este 24 de março foi outro dia histórico para esta nação austral, cujos herdeiros, os jovens, se somam e tornam sua essa luta perene. 

Foto Amanda Cotrim

*Correspondente de Prensa Latina na Argentina

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Maylín Vidal

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