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O México de Obrador e os fluxos migratórios nas eleições dos Estados Unidos de 2020

O centro gravitacional do sentido eleitoral voltou-se para uma dinâmica que transtorna todas essas bandeiras: os fluxos migratórios
David Penchyna Grub
La Jornada
Cidade do México

Tradução:

A clássica temática eleitoral dos partidos políticos ao longo do século XX está sendo deslocada. Sim, a segurança pública, a economia, a seguridade social – saúde, educação, moradia – e os direitos civis continuam ocupando boa parte dos postulados de qualquer campanha, mas o centro gravitacional do sentido eleitoral voltou-se para uma dinâmica que transtorna todas essas bandeiras: os fluxos migratórios.

A inter relação econômica que de maneira acelerada se deu após a queda do Muro de Berlim, mercados abertos, acesso à tecnologia e novas rotas comerciais, estabeleceu as bases dos fluxos migratórios que temos hoje, basicamente, de países em desenvolvimento a economias consolidadas.

Vemos isso no Reino Unidos, na França, na Alemanha, e como em nenhum outro país do mundo, nessa relação assimétrica entre os Estados Unidos e a América Latina.

Para entender a complexidade do momento que estamos vivendo no plano de populações em mobilidade, temos que assumir que falar do México é, para efeitos práticos, falar da América Latina. Não apenas somos a terra que divide os centro-americanos do “sonho americano”, somos diante da racionalidade do governo e do eleitorado estadunidense, culturalmente idênticos.

O centro gravitacional do sentido eleitoral voltou-se para uma dinâmica que transtorna todas essas bandeiras: os fluxos migratórios

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O que o México está fazendo ou não para controlar a crise migratória

A eleição presidencial

Eu me refiro ao eleitorado e não à cidadania dos Estados Unidos, porque o tema migratório passa pelo filtro da eleição presidencial de 2020. Por muitas décadas, o México esteve na mesa de análises e tomada de decisões em Washington a partir de sua importância estratégica no nível regional, comercial e político; hoje, ao invés, estamos no centro do debate eleitoral. 

Em outras palavras, passamos do terreno exclusivamente geopolítico e diplomático, para o discurso local que busca manter viva em boa parte dos eleitores, a chama da xenofobia e do medo. Assim, os temas que tradicionalmente marcavam a agenda de campanha têm como comum denominador a migração: criação de empregos? É claro, mas “empregos para os estadunidenses nas chamadas “inner cities”; Seguridade social? importante, mas como melhorar o sistema de saúde ou as escolas, se o governo tem que gastar dinheiro na prestação de serviços a quem não nasceu nos Estados Unidos? Assim, na mente de milhões, para cada expectativa de país há um migrante que a está impedindo. 

De maneira absolutamente irracional, o estrangeiro indocumentado converteu-se no rosto cotidiano de tudo aquilo que falta ou incomoda: insegurança, drogas, falhas nos serviços públicos, e um longuíssimo etcetera. 

Conseguir duas coisas

Nessa linha, com o pragmatismo e a rudeza que o caracteriza, Donald Trump entendeu que para ficar na Casa Branca por quatro anos mais tem que conseguir duas coisas; fortalecer sua base a partir de uma posição firme contra a migração – legal ou não -, e convencer os que não votaram nele a partir de resultados positivos em matéria econômica. Aos primeiros, ele sabe falar-lhes ao ouvido com promessas como o muro; aos segundos, de forma mais sofisticada, vende a ideia de que as empresas estão regressando aos Estados Unidos, a partir de uma política que incentiva a criação de empregos e a redução de impostos. Em ambos os casos, o México aparece veladamente como o inimigo, o obstáculo, o fator de risco: os imigrantes passam pelo México ou são mexicanos; e centenas de empresas haviam mudado para o nosso país para aproveitar as condições do mercado NAFTA.

Assim, Trump nos felicitará ou assinalará em função dos números que os seus pesquisadores lhe apresentem. 

Ou seja, resta um longuíssimo caminho por percorrer nos meses que nos separam da eleição, e o acordo sobre migração continua sem ser aprovado. Cada dia que passa sem que seja assinado se incrementa o risco de que sua discussão seja – também – devorada pelo torvelinho eleitoral. 

Com uma vintena de pré-candidatos democratas em frente, Trump tem amplíssimas possibilidade de conseguir a reeleição e todos os incentivos para recorrer ao “tema mexicano” quando julgar necessário. 

Já se acabaram os tempos nos quais o México era um assunto a mais na ampla agenda internacional e de segurança dos Estados Unidos; estaremos em cada cédula eleitoral.

Ninguém escolheu estar no centro da contenda de 2020, mas essa é nossa realidade. Uma realidade com a qual teremos que lidar com paciência, inteligência e unidade.

Tradução: Beatriz Cannabrava

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
David Penchyna Grub

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