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Catalá, ultima catalã sobrevivente de um campo de concentração nazi, morre aos 103 anos

Graças à sabotagem organizada por Neus e outras mulheres presas em Flossenburg, 10 milhões de cartuchos de munição dos nazistas foram inutilizados
Daniel Caresia
Resumen LatinoAmericano
Barcelona

Tradução:

Neus Catalá, a última pessoa catalã que sobreviveu ao campo de Concentração de Ravensbrück, morreu no último sábado (13), aos 103 anos.

A voz de Neus Catalá, sobrevivente de um dos campos de extermínio nazista, foi um testemunho da luta contra o esquecimento de uma das atrocidades humanas mais impactantes da história. 

Enfermeira e comunista de vocação (durante a Guerra Civil foi parte das Juventudes Socialistas Unificadas da Catalunha), em 1939 cruzou a fronteira com 182 crianças órfãs e se instalou na França, onde se casou e passou a colaborar com a Resistência. Em 1943, foi denunciada aos nazistas. 

Graças à sabotagem organizada por Neus e outras mulheres presas em Flossenburg, 10 milhões de cartuchos de munição dos nazistas foram inutilizados

Reprodução
Neus Catalá nasceu em Guiamets, na Catalunha (Espanha), em 6 de outubro de 1915

Foi presa e deportada ao campo de Concentração de Ravensbrück, a 90 quilômetros de Berlim. Entre 1939 e 1945 estiveram ali — segundo registros — 132 mil mulheres e crianças, 20 mil homens e mil adolescentes. Destes, foram assassinados 92 mil.

Mais tarde, ela foi transportada ao Campo de Concentração de Flossenburg, onde fez parte do Comando das Glândulas, grupo de mulheres que se organizou para boicotar a fabricação de armamento para os nazistas. A ação consistia em cuspir no material que era produzido. Graças à sabotagem protagonizada por elas, cerca de dez milhões de cartuchos e outros equipamentos armamentícios foram inutilizados.

Mulheres sobreviventes do Campo de Concentração de Ravensbrück |
Foto: Wikicommons

Ao sair, se separou de Albert, seu companheiro “os casais que sobreviveram ao horror, a maioria não pôde voltar a viver juntos, porque já não se sentiam marido e mulher, mas irmãos”, disse Catalá.

Nos campos da morte, Neus conheceu o inferno, mas também a solidariedade e a irmandade sem limites. Anos mais tarde, voltou a se casar e, apesar de ter sido esterelizada em Ravensbrück pelos nazistas, como ocorreu com as demais mulheres, teve dois filhos, um menino e uma menina, que vivem atualmente na França.

Neus Catalá vivia em uma casa de repouso em sua cidade natal, Guiamets. Como os pássaros, que sempre voltam ao ninho para morrer.

Em 2015, quando completou cem anos de nascimento, recebeu a Medalha de Ouro da Generalidad (governo catalão). Na ocasião, proferiu as seguintes palavras:

“Quis ver tudo.

Ver para poder explicar.

Explicar a todos o que meus olhos viram, porque é um dever.

Porque sobrevivi e tenho um dever moral para com as mulheres, as grandes esquecidas, que morreram nos campos da morte.

Meu pai me dizia, quando era pequena: 'Não baixe nunca os olhos para ninguém, nunca'.

Eu quis olhar tudo, e nunca, nunca, nunca, chorei diante de um nazista. Era minha maneira de resistir. Eu só chorava às noites, porque as noites se tornavam eternas pela insônia… os nazistas me tiraram o sono, mas não me tomaram a liberdade nem a vida”.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Daniel Caresia

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