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Contra o sionismo, contra o antissemitismo, pela humanidade

Se opor ao massacre palestino operado por Netanyahu não é ser antissemita ou antijudeu
Claudio Albertani
La Jornada
Cidade do México

Tradução:

Há poucos dias, num protesto em frente à embaixada de Israel, alguém gritou palavras de ordem antissemitas. Ele era um provocador e foi rapidamente isolado. No entanto, a questão é delicada porque o Estado Sionista aproveita o inegável ressurgimento do antissemitismo após a invasão de Gaza para justificar os seus crimes. Esta narrativa é legitimada por um fato histórico: os judeus foram vítimas de um dos maiores massacres da história, o Holocausto (shoah em hebraico), perpetrado pelos nazis durante a Segunda Guerra Mundial. Isto justificaria o refúgio dos sobreviventes na Palestina, região que supostamente lhes pertencia por razões históricas e teológicas.

É aqui que começa a confusão porque o problema de Israel é duplo: não só o seu atual governo é inapresentável, mas a sua legitimidade histórica também é questionável. Segundo Netanyahu, os palestinos seriam um punhado de pessoas sem história que perseguem os judeus tal como os nazistas fizeram na época. Nestas condições, Israel não teria outra escolha senão defender-se, se necessário, recorrendo à força desproporcional. E, claro, todos nós que nos opomos a isso seríamos antissemitas ou, para ser mais preciso, antijudeus.

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No entanto, verifica-se que existem muitos judeus entre os antissionistas. No próprio Israel, a nova escola de historiadores desmascarou os mitos fundadores do sionismo. Uma delas é a chamada diáspora, o suposto exílio dos judeus após a destruição do segundo templo em Jerusalém (70 d.C.), quando teriam sido dispersos pelo Mediterrâneo. Em A Invenção do Povo Judeu (2008) e A Invenção da Terra de Israel (2012), Shlomo Sand, da Universidade de Tel Aviv, mostra que tal dispersão nunca ocorreu e que os romanos nunca os expulsaram.

Com os documentos em mãos, o historiador israelita mostra que as comunidades judaicas que existiram e continuam a existir em muitas partes do mundo são produto de diferentes ondas de conversões ocorridas a partir do século IV da era cristã e não de fluxos migratórios provenientes da Palestina. É claro que existiram e existem judeus espalhados por todo o mundo. É claro que foram vítimas do antissemitismo, a qual é uma mancha terrível na história da humanidade, mas afirmar que o povo judeu tem direitos ancestrais sobre a Palestina é tão absurdo como afirmar que os budistas os têm sobre a terra de Siddhartha Gautama.

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Por outro lado, dois arqueólogos, Israel Finkelstein, também da Universidade de Tel Aviv, e Neil Asher Silberman, da Bélgica, ao questionarem a fiabilidade da Bíblia, mostraram que se trata de uma história literária fascinante, mas de forma alguma uma fonte histórica credível. Após décadas de escavações em Israel, Líbano, Síria e Egito, os dois cientistas verificaram não haver provas da existência dos patriarcas, nem da fuga dos judeus do Egito ou da conquista de Canaã. Menos ainda se pode provar que David e Salomão reinaram sobre um extenso império (The Bible Unearthed, 2003).

Se opor ao massacre palestino operado por Netanyahu não é ser antissemita ou antijudeu

Foto: Elisabeth Skarðhamar Olsen
E é sempre útil lembrar que os primeiros praticantes do terrorismo na Palestina foram os membros de grupos paramilitares judeus




História do sionismo

A respeito da história do Sionismo, o historiador norte-americano de origem judaica Lenni Brenner ( Sionismo e Fascismo: Sionismo na Era dos Ditadores , 1983), mostrou que, nas décadas de 1920 e 1930, os principais líderes da Agência Judaica chegaram a negociar com Hitler e Mussolini para alcançar seus objetivos.

E é sempre útil lembrar que os primeiros praticantes do terrorismo na Palestina foram os membros de grupos paramilitares judeus, antecedentes das atuais Forças de Defesa de Israel. Contudo, é justo reconhecer que apenas uma minoria dos judeus espalhados pelo mundo eram sionistas.

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Brenner evoca a experiência da União Geral dos Trabalhadores Judeus da Lituânia, Polónia e Rússia, conhecida como Bund, que no início do século passado se opôs à emigração para a Palestina e incitou à luta contra o anti-semitismo e pelo socialismo nos países da origem. Em tempos mais recentes, o Matzpen, um pequeno partido comunista anti-sionista e anti-estalinista, composto por trabalhadores palestinianos e judeus, lutou contra a ocupação dos territórios palestinianos por Israel.


Sionismo de esquerda?

Já existiu sionismo de esquerda? O espírito humanista e utópico de, por exemplo, Martin Buber e outros que aspiravam criar o socialismo libertário na Palestina é inegável. Contra o slogan sionista de uma terra sem povo para um povo sem terra , Buber pensou numa terra para dois povos e criticou a política colonial da liderança sionista. Em 1947, às vésperas da partição, observou que a solução não era construir dois Estados, mas sim uma entidade sócio-política binacional comum. Tinha razão.

Contudo, as posições de Buber sempre foram minoritárias, mesmo na chamada esquerda sionista. Foi sob a liderança do Mapai, o Partido Trabalhista, que o Estado Judeu foi proclamado em 1948. Depois, dezenas de milhares de palestinianos foram massacrados, enquanto entre 700 mil e 800 mil foram forçados a fugir das suas casas.

Isto é o que se conhece no mundo árabe como Nakba , ou catástrofe, algo muito bem explicado pelo palestino Edward Said em A Questão Palestina, mas também pelo judeu Ilán Pappé em A Limpeza Étnica da Palestina. Uma limpeza étnica, especifica Pappé, que continua até hoje.

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Dias atrás, Ahvi Dichter, membro do gabinete de segurança do governo israelense, declarou abertamente que o Estado Judeu – o mesmo que negou o nabka por 75 anos – já lançou o nabka 2023. Como está: 80 por cento da população de Gaza ( 2,26 milhões de habitantes) já teve de abandonar as suas casas na pior catástrofe humanitária desde 1948.

E, no entanto, como escreveu o jornalista Gideon Levy, é impossível manter 2 milhões de pessoas na prisão sem pagar um preço cruel. Essa prisão tem de ser desmantelada agora e, embora possa parecer improvável, a longo prazo só a reconciliação entre judeus e palestinos que o utópico Buber defendeu poderá mudar o destino dos dois povos. Em 2009, a CIA dos Estados Unidos previu que Israel se desintegraria em cerca de 20 anos e agora o Pentágono sinaliza que o Estado Judeu poderia sofrer uma derrota estratégica na sua guerra contra Gaza. A contagem regressiva começou.


Palestra proferida no encontro Genocídio em Gaza, no campus da UACM Valle, no dia 6 de dezembro.

Claudio Albertani | Historiador italiano, especial para La Jornada.
Tradução: Amyra El Khalili


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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