O primeiro acusado do assassinato do candidato presidencial Fernando Villavicencio, autor dos disparos, morreu a caminho do hospital quando poderia ter sido socorrido em uma clínica ao lado da escola onde ocorreu o crime.
Após a execução, numa penitenciária de Guayaquil, de seis presos colombianos acusados de envolvimento na trama, o assassinato de mais um suspeito, identificado como José M. em uma cadeia no norte de Quito, eleva o tom macabro da novela de terrorismo de Estado.
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Da mesma maneira que no final do primeiro turno – quando Luisa González, do movimento Revolução Cidadã (RC) poderia ter vencido as eleições antecipadamente – os principais meios de comunicação equatorianos tentam transformar uma mentira, repetida um milhão de vezes, em verdade, e virar o resultado em favor de Daniel Noboa.
De forma monocórdica, jornais, emissoras de rádio e televisão, fazem os mais surpreendentes malabarismos para vincular o governo de Rafael Correa (2007-2017) com o assassinato de Villavicencio, ocorrido no dia 9 de agosto, a 11 dias das eleições.
Queima de arquivo: execução de acusados de matar Villavicencio é fruto da omissão de Lasso
Jornalista apaniguado do governo dos Estados Unidos, com livre acesso na Central de Inteligência Americana (CIA), Villavicencio acusava Correa de proteger Julian Assange e o WikiLeaks na Embaixada do Equador em Londres. Os apologistas e financiadores do candidato morto não suportavam o respaldo dado por Correa a Assange nas denúncias ao império. Villavicencio, bem adestrado, vestia o figurino e seguia o prontuário.
Mas, ainda não se sabe o porquê do escriba de aluguel ter sido executado. Logo depois, numa bela operação de propaganda e marketing, a Embaixada dos Estados Unidos passou a oferecer US$ 5 milhões a quem propiciasse informações que levem ao autor intelectual do seu assassinato. Tudo concatenado para que surja uma voz “esclarecedora”, casualmente a poucos dias das eleições.
“Sempre se disse que Villavicencio era um informante da CIA e que quando ele se destaca demais junto a eles, quando suas ambições estão transbordando e quer ser presidente, ele pode se transformar em um estorvo para a CIA”, ressaltou Correa logo após o crime.
Montagem
Rafael Correa: "Guillermo Lasso tenta, no apagar das luzes, forjar homicidas a fim de impedir a vitória oposicionista"
Resolvidos dois problemas com três tiros
O fato é que a execução de Villavicencio pode ter resolvido dois problemas com três tiros na cabeça: acabar com a incógnita do que ele poderia vir a se tornar e, principalmente, impedir a vitória, já no primeiro turno, da candidata correísta.
Uma vez morto, Villavicencio foi substituído na chapa presidencial por Christian Zurita, seu parceiro de “convicçõe$”, que, turbinado pelas emoções, conseguiu chegar em terceiro lugar nas eleições – com 16,37% dos votos – e viabilizar, pelo desgaste momentaneamente infligido a Luisa, a realização do segundo turno no próximo domingo, 15 de outubro.
Consternado e convocado a “fazer justiça”, o eleitorado retirou naquele 20 de agosto preciosos votos da candidata, que embora tenha superado em mais de 10% (33,61% a 23,47%) o segundo colocado, Daniel Noboa, não atingiu os 40% para liquidar a fatura, forçando um novo processo eleitoral.
Na tentativa de que a verdade da oligarquia prevaleça – e no caso do Equador estamos falando da megabilionária casta Noboa, detentora de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) – transbordam manchetes buscando incriminar o veterano líder progressista.
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As capas desta segunda-feira (9) são um bom exemplo disso: “Ministério Público diz que testemunha falou sobre quem deu ordem para matar Villavicencio” (Primicias); “Christian Zurita disse que as ameaças contra o círculo mais próximo de Villavicencio são cada vez maiores: ‘sem dúvida querem nos ver mortos’” (MetroEcuador); “Zurita afirma que US$ 200 mil foi o pagamento pelo assassinato de Fernando Villavicencio” (LaHora); “A testemunha chave e inesperada que antecipou sua versão no caso Villavicencio” (Extra).
“O depoimento prévio da única testemunha que não mataram (e que foi protegida) afirmou sob juramento que os responsáveis pelo assassinato de Fernando Villavicencio são o ‘Governo Correa’”, declarou Zurita. Seria cômico se não fosse trágico. Que valor tem o juramento de alguém que viu oito presos serem executados para clarear sua memória sobre o que deveria dizer?
Zurita vai além nas “informações” que dispôs ao público equatoriano: “O valor acertado com os pistoleiros para acabar com a vida de Fernando foi de US$ 200 mil. Houve uma primeira tentativa no dia 1º de junho na grande caravana de Santo Domingo (dos Tsáchilas), mas a completaram no dia 9 de agosto”.
Eleições no Equador: sucesso em último debate presidencial aproxima Luisa da vitória
Desmascarando a farsa, o presidente Correa anunciou com antecedência o que estava por vir, esclarecendo que “foram oferecidas (à testemunha) todas as garantias para criar este falso positivo”.
Copiando o manual dos “falsos positivos”, prática de crime de Estado utilizado na vizinha Colômbia, em que cerca de dez mil jovens inocentes foram executados como “guerrilheiros” pelo governo de Álvaro Uribe (2002-2010), o presidente Guillermo Lasso tenta, no apagar das luzes, forjar homicidas a fim de impedir a vitória oposicionista.
“Nós lhes dissemos: eles assassinam Villavicencio, atrasam a investigação preliminar por um mês, matam todos os pistoleiros menos um, que mantêm num quartel militar e fazem que nos acuse poucos dias antes das eleições, para impedir nossa vitória”, alertou Correa, apontando “uma tremenda fraude processual”.
Caio Teixeira e Leonardo Wexell Severo | Especial para ComunicaSul, direto de Quito
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A Agência ComunicaSul está cobrindo as eleições presidenciais e à Assembleia Nacional do Equador graças ao apoio das seguintes entidades: jornal Hora do Povo, Diálogos do Sul, Barão de Itararé, Portal Vermelho, Correio da Cidadania, Agência Saiba Mais, Agência Sindical, Federação dos Trabalhadores em Instituições Financeiras do RS (Fetrafi-RS); Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe-RS); Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos; Federação dos Comerciários de Santa Catarina; Confederação Equatoriana de Organizações Sindicais Livres (CEOSL); Sindicato dos Comerciários do Espírito Santo; Sindicato dos Hoteleiros do Amazonas; Sindicato dos Trabalhadores das Áreas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisa, e de Fundações Públicas do Rio Grande do Sul (Semapi-RS); Federação dos Empregados e Empregadas no Comércio e Serviços do Estado do Ceará (Fetrace); Federação dos Trabalhadores no Comércio e Serviços da CUT Rio Grande do Sul (Fetracs-RS); Intersindical, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Central Única dos Trabalhadores do Paraná (CUT-PR); Associação dos Assistentes Sociais e Psicólogos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (AASPTJ-SP), Federação dos/as Trabalhadores/as em Empresas de Crédito do Paraná (FETEC-PR), Sindicato dos Trabalhadores em Água, Resíduos e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema-SP); Sindicato dos Trabalhadores em Água, Resíduos e Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (Sintaema-SC), Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada no Estado do Paraná (Sintrapav-PR), Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp Sudeste-Centro), Sindicato dos Escritores no Estado de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal de Santa Catarina (Sintrajusc-SC); Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário do Estado de Santa Catarina (Sinjusc-SC), Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário Federal em Pernambuco (Sintrajuf-PE), mandato popular do vereador Werner Rempel (Santa Maria-RS) e dezenas de contribuições individuais.
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