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Caso Karol Eller: tentar curar o que não é doença é um risco à vida

Morte da influenciadora levanta debates sobre os danos causados por terapias de reorientação sexual, conhecidas como "cura gay", proibidas no Brasil
George Ricardo Guariento
Diálogos do Sul Global
Taboão da Serra

Tradução:

A influenciadora de direita Karol Eller, 36 anos, morreu na noite de 12 de outubro após uma queda do prédio onde residia. O episódio chocou as redes sociais e revisitou preocupações sobre os riscos e os impactos devastadores que as terapias de reorientação sexual, conhecidas como “cura gay”, podem ter na vida de indivíduos LGBTQIA+.

Prima de terceiro grau da cantora Cassia Eller, ela havia iniciado um processo de renúncia à sua orientação sexual após retornar de um retiro religioso. Pouco antes de sua morte, Karol compartilhou mensagens em suas redes sociais, incluindo afirmações como “perdi a guerra” e “lutei pela pátria”. Ela também havia publicado um post no Instagram falando sobre suicídio, que depois excluiu.


A criação e a queda do projeto da “cura gay”

O método da “cura gay,” também conhecido como Terapia de Reorientação Sexual, Terapia de Conversão ou Terapia Reparativa, envolve um conjunto de técnicas destinadas a suprimir a homossexualidade em um indivíduo. Essas técnicas abrangem métodos psicanalíticos, cognitivos, comportamentais, tratamentos clínicos e abordagens religiosas. A principal controvérsia é que a prática enxerga a orientação sexual como uma doença, pois o termo “cura” implica a eliminação de algo considerado prejudicial.

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Morte da influenciadora levanta debates sobre os danos causados por terapias de reorientação sexual, conhecidas como "cura gay", proibidas no Brasil

Foto: Reprodução/Redes sociais
É fundamental que a sociedade promova aceitação e apoio a todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual

No entanto, a Organização Mundial da Saúde (OMS) já há décadas rejeitou a ideia de que a orientação sexual seja uma doença, definindo a homossexualidade como uma variação natural da sexualidade humana. No Brasil, em 1999, o Conselho Federal de Psicologia proibiu seus profissionais de participarem de qualquer terapia destinada a alterar a orientação sexual de qualquer pessoa. Já o Conselho Federal de Medicina há mais de 30 anos deixou claro que a homoafetividade não é considerada uma condição patológica pela classe médica.

Não obstante a manifestação dos órgãos de saúde nacionais e internacionais, em 2011 o deputado federal João Campos, do PSDB de Goías, apresentou um Projeto de Decreto Legislativo (PDC) com o objetivo de suspender a resolução do Conselho Federal de Psicologia.

Após anos de tentativas infrutíferas de votação e ampla oposição pública, o projeto foi aprovado em 18 de junho de 2013 pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. 15 dias depois, no entanto, o próprio autor do texto, João Campos, solicitou o cancelamento da tramitação em resposta à manifestação contrária do seu partido, o PSDB.

A maioria dos partidos aprovou o arquivamento, com exceção do PSOL, que não apenas buscava o arquivamento da proposta, mas também a proibição de que fosse reapresentada.

Já em 4 de julho, apenas dois dias após o requerimento de João Campos para cancelar o PDC, acontece uma nova ofensiva: um novo projeto é apresentado na Câmara, desta vez com visando não apenas suspender, mas extinguir a determinação do Conselho Federal de Psicologia que proibia a “cura gay”. Desta vez, o pedido foi indeferido imediatamente.

Vale ressaltar que o indeferimento de projetos como esse tem limitações temporais, de acordo com o Regimento Interno da Câmara, o que impede a reapresentação de uma proposta de conteúdo semelhante no mesmo ano em que a primeira foi arquivada.


Violência que mata

Karol Eller vivia sob intensa pressão de apoiadores de Jair Bolsonaro ligados a instituições religiosas, que acompanhavam suas transmissões ao vivo nas redes sociais e tentavam persuadi-la a formar uma família heterossexual. Um exemplo é o senador Magno Malta (PL-ES), que em um vídeo publicado nas redes sociais após a morte de Eller admitiu que tentava moldar a sexualidade da influenciadora:
“Na última live eu falei com ela: ‘Deus está preparando uma família para você, eu quero muito estar no seu batismo… Deus está preparando um varão pra você’”, afirma o bolsonarista na publicação.

Em setembro, Karol havia participado de um retiro religioso e logo depois declarou em suas redes ter “renunciado à prática homossexual” e a “vícios e desejos da carne”. Tanto a pressão bolsonarista quanto a decisão de Eller após a participação do retiro refletem a pressão vivida por muitos indivíduos LGBTQIA+ muitas vezes obrigados a vivenciarem terapias de “cura gay”.


Controvérsias e opiniões divergentes

Karol Eller, embora tenha se identificado publicamente como lésbica, expressou opiniões controversas em suas postagens, frequentemente criticando o que ela classificou como “vitimismo” no movimento LGBTQIA+. Em um de seus vídeos, ela chegou a afirmar que “Não é porque um gay morreu assassinado que é homofobia”. As declarações geraram debates e discussões acaloradas.

Leia também: Após vencer eleição com mentiras sobre “kit gay”, governo exclui LGBTIs

Durante as eleições de 2022, a influenciador apoiou o ex-presidente Jair Bolsonaro, defendendo que ele não era homofóbico. Vale mencionar ainda sua participação nos atos golpistas do 8 de janeiro, o que levou à demissão de Karol da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC).


Depoimento de um amigo próximo

O jornalista Tiago Pavinatto era amigo de Karol Eller e desabafou em suas redes sociais a morte da ativista bolsonarista, atribuindo a pressão para a reorientação sexual como um fator determinante para o suicídio. Ele afirmou que “as terapias de reorientação sexual são sessões de tortura mental” e destacou que em 90% dos casos elas levam a ideações suicidas e que 100% dos casos agravam quadros de depressão.

A morte de Karol Eller é um lembrete angustiante de que as terapias de reorientação sexual não apenas são ineficazes, mas também potencialmente letais. O sofrimento emocional que muitos indivíduos LGBTQ+ enfrentam ao tentar se conformar com padrões impostos por essas práticas é motivo de grande preocupação. É fundamental que a sociedade promova aceitação e apoio a todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual, a fim de evitar tragédias como a de Karol no futuro.

George Ricardo Guariento | Jornalista e colaborador da Diálogos do Sul.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

George Ricardo Guariento Graduado em jornalismo com especialização em locução radiofônica e experiência na gestão de redes sociais para a revista Diálogos do Sul. Apresentador do Podcast Conexão Geek, apaixonado por contar histórias e conectar com o público através do mundo da cultura pop e tecnologia.

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