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Violência policial e racismo explícito: ainda estamos “sobrevivendo no inferno”

Sociedade brasileira precisa estar disposta a enfrentar a questão e todo o processo de desumanização que essa mazela infringe à população negra
Verbena Córdula
Diálogos do Sul Global
Salvador (BA)

Tradução:

No último final de semana circulou um vídeo onde, de forma nítida, vimos um ato de racismo praticado pela Polícia gaúcha. Um homem negro que acabava de ser esfaqueado por um homem branco foi violentamente algemado, mesmo testemunhas afirmando que ele era a vítima.

Então fiquei pensando no enredo da Vai-Vai, que tanta polêmica tem causado no âmbito policial. A Escola de Samba, que homenageava uma obra musical que denuncia a violência contra a população negra (sobretudo a policial), sofre com tentativas de cerceamento em um país onde as forças policiais continuam violentando os corpos negros. Se não fosse desumano, seria irônico.

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Não é novidade o quanto os corpos negros sofrem violência desde que, forçadamente, foram trazidos de África para o território que posteriormente foi chamado de Brasil. As estatísticas não mentem. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número total de pessoas presas no Brasil saiu de 815.165 em 2021 para 826.740, em 2022. Destas, 442.033, são negras, o equivalente a 68,2%.

No quesito emprego, conforme o IBGE, a taxa de desocupação em 2022, na perspectiva da cor da pele, ficou em 5,9% para os brancos, enquanto para pretos em 8,9% e pardos 8,5%, ambos os grupos superando a média nacional. Quando observamos esses números, não há dúvidas de que o racismo está presente.

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Sociedade brasileira precisa estar disposta a enfrentar a questão e todo o processo de desumanização que essa mazela infringe à população negra

Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Jornada de Movimentos Negros Contra a Violência Policial defendem investigação e punição aos assassinos de Mãe Bernadete (SP – 24/08/2023)




Violência policial

A coisa fica ainda pior quando partimos para violência policial. De acordo com o Relatório Pele Alvo: A Bala Não Erra o Negro, com dados coletados junto às secretarias de Segurança Pública da Bahia, do Rio de Janeiro, do Ceará, do Maranhão, de Pernambuco e de São Paulo, a cada 100 mortos pela polícia em 2022, 65 eram negros. O equivalente a 87%, considerando-se apenas aqueles em que foi informada a cor da pele.

Dessa forma, o que vimos, no desfile da Vai-Vai foi nada mais do que uma infeliz realidade, retratada há mais de 20 anos, mas que ainda se faz presente em nosso cotidiano. 

O Álbum dos Racionais, intitulado Sobrevivendo no Inferno, lançado em 1997, chama a atenção para o extermínio das populações pobres e periféricas, através das forças de segurança do Estado, assim como para a falta de medidas no sentido da reversão dessa questão por parte dos governantes. E foi isso que a Escola de Samba retratou, tendo causado fúria por parte de muitos policiais, que se sentem ofendidos.

No entanto, o que infelizmente vimos, naquele vídeo veiculado em várias mídias no final de semana passado, protagonizado pela Polícia Militar Gaúcha, mostra que, infelizmente, a crítica dos Racionais ainda é vigente, mesmo transcorridos 27 anos do seu lançamento.


Taxas alarmantes de encarceramento

A população negra no Brasil, historicamente marginalizada, enfrenta obstáculos sistemáticos que contribuem para taxas alarmantes de encarceramento. A herança da escravidão deixou marcas profundas na estrutura social, e as desigualdades persistem, afetando o acesso a oportunidades educacionais, emprego digno e serviços públicos de qualidade.

As práticas policiais discriminatórias, como o perfilamento racial e abordagens agressivas em comunidades marginalizadas, frequentemente contribuem para o aumento das prisões da população negra. Além disso, decisões judiciais enviesadas e a falta de representatividade negra no sistema de justiça são preocupações que devem estar no bojo desse cenário. Outra questão se refere à guerra às drogas em nosso país, que também tem desempenhado um papel preponderante no encarceramento em massa e outras ações que têm impacto desproporcional sobre a população negra. 

Pronasci: Segurança Pública sob Lula vai encarar feminicídio, racismo e violência policial

Portanto, o Estado brasileiro precisa lançar mão no sentido de transformar essa realidade, sobretudo deixando de proporcionar às populações negras quase que exclusivamente o “braço” da violência. Por sua vez, a sociedade precisa estar disposta a enfrentar o racismo e todo o processo de desumanização que essa mazela infringe à população negra em nosso país.


Luta antirracista avança no Brasil

Embora a luta antirracista esteja tomando uma proporção cada vez mais ampla no Brasil, o fato de o Estado e a sociedade civil não encará-lo como um problema nacional, que é também histórico e ideológico e estrutural, determina que as iniciativas de superação dessa mazela se deem ao nível das superficialidades, fato que contribui de modo significativo com a falsa ideia de que o país está superando o racismo.

Portanto, em vez de sentirem-se ofendidos, os policiais precisam também refletir acerca dessas questões. Precisam deixar de assimilar os discursos dos grupos que se beneficiam da marginalização e do extermínio da população negra.

Verbena Córdula | Doutora em História e Comunicação no Mundo Contemporâneo pela Universidad Complutense de Madrid. Professora Titular da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhéus, Bahia.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Verbena Córdula Graduada em História, Doutora em História e Comunicação no Mundo Contemporânea pela Universidad Complutense de Madrid e Professora Titular da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhéus, BA.

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