O debate em torno da necessidade de fomentar relações mais harmônicas dos seres humanos entre si e com seu entorno natural constitui um âmbito cada vez mais importante na vida cultural e política de nosso tempo. Encará-lo exige frequentemente ir na contracorrente de hábitos de pensamento e conduta coletiva muito arraigados em nossa história.
Já em 1905, por exemplo, o biólogo britânico E. Ray Lankester (1847-1929) – um dos cientistas mais respeitados de seu tempo – entendia a natureza como “o conjunto do mecanismo do universo, o cosmos em todas as suas partes” – cuja evidente relação com o ser humano “deveria ser […] o guia do governo do estado, a base confiável do desenvolvimento das comunidades humanas”. Não fazê-lo, acrescentava, era “tão monstruoso, tão ofensivo para a prosperidade de nossos semelhantes, que devemos fazer o que esteja ao nosso alcance para chamar a atenção sobre as condições e circunstâncias que dão lugar a este descuido, sobre os males que este provoca, e sobre os benefícios que devem resultar de superá-lo.”
Isso viria a tornar-se mais evidente com a posterior formação do conceito de ambiente a partir da década de 1970, até chegar à adoção do conceito de desenvolvimento sustentável como categoria de política pelas Nações Unidas em 1992. Contudo, trata-se de um conceito complexo, que estabelece uma relação de afinidade e contradição com o de natureza, enquanto ressalta o fato de que enquanto as demais espécies utilizam os recursos que este entorno lhes oferece, os humanos o transformam mediante processos de trabalho socialmente organizado para obter os recursos de que necessitam para seu próprio desenvolvimento como espécie.
Assim, a Encíclica Laudato Si (2015: 139) nos diz que o termo ambiente vincula entre si os termos natureza e sociedade, pois a expressão “meio ambiente” indica uma relação “entre a natureza e a sociedade que a habita [que] nos impede de entender a natureza como algo separado de nós ou como um mero marco de nossa vida. Estamos incluídos nela, somos parte dela e estamos interpenetrados.”
Capitalismo x meio ambiente: é possível construir futuro global sem visão socioambiental?
A esse respeito, diz a Encíclica, a magnitude das mudanças em curso demanda buscar “soluções integrais que considerem as interações dos sistemas naturais entre si e com os sistemas sociais”, dado que não há duas crises separadas, uma ambiental e outra social, mas uma única e complexa crise socioambiental. As linhas para a solução requerem uma aproximação integral para combater a pobreza, para devolver a dignidade aos excluídos e simultaneamente cuidar da natureza. (pag. 139)
Ter trazido este problema para debate na sociedade é um mérito maior do ambientalismo de nosso tempo. Toca agora passar da denúncia à análise, e do protesto às propostas para ir para um mundo que será sustentável, ou não será.
Alto Boquete, Chiriquí, 14 de setembro de 2024