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Kamala Harris (Foto: Gage Skidmore)

Eleições nos EUA: os preocupantes indicadores para Kamala Harris

Propostas econômicas de Kamala Harris direcionadas aos cidadãos latinos não tem surtido efeito nas pesquisas, enquanto metade dos EUA afirma estar em situação pior do que 4 anos atrás
Jim Cason, David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Duas semanas antes da eleição presidencial nos EUA, a ligeira vantagem da candidata democrata Kamala Harris sobre o republicano Donald Trump nas pesquisas foi reduzida a menos de 1% nos sete estados que determinarão o resultado nacional, com indicadores particularmente preocupantes sobre a erosão do apoio aos democratas entre os setores-chave de latinos, afro-americanos e árabe-americanos. Nestes dias, ambos os candidatos dedicaram tempo e recursos ao setor latino do eleitorado.

Na terça-feira (22), Trump continuou fazendo discursos cada vez mais caóticos, desta vez em um fórum com líderes latinos em um de seus hotéis em Miami, onde declarou que, se Harris vencer, será o fim da democracia e os Estados Unidos se parecerão com “uma Venezuela com esteroides”, e terminou reiterando que teve uma relação amorosa com os latinos durante sua presidência; “eu os amo, e eles me amam”.

A campanha de Harris emitiu uma série de propostas econômicas dedicadas aos latinos que prometem “reduzir custos, aumentar a oferta de moradia, ampliar oportunidades de emprego e assegurar que os latinos e suas famílias possam alcançar suas aspirações e realizar seu sonho americano”.

Mas sua mensagem, até agora, parece não ter grandes resultados. Uma pesquisa nacional divulgada pelo USA Today é a primeira sondagem a sugerir que Trump está conquistando uma vantagem entre os latinos por uma ampla margem de 49% a 38%, embora outras pesquisas continuem registrando uma margem substancialmente maior para Harris nesse setor. No entanto, o nível de apoio dos latinos para Harris continua abaixo do alcançado por Joe Biden e, antes, por Barack Obama. O voto latino pode ser decisivo em alguns dos sete estados-chave, incluindo Nevada, Arizona, Geórgia e Carolina do Norte.

Situação piorou com Biden e Kamala Harris

Trump conseguiu obter um nível inesperado de apoio, não só entre homens latinos e afro-americanos, em grande parte devido aos temas econômicos. Além disso, uma nova pesquisa da Arab News/YouGov sugere que Trump está vencendo entre árabe-estadunidenses, indicando os custos políticos do apoio do governo de Biden e Harris à guerra de Israel em Gaza, sobretudo no estado-chave de Michigan (com a maior população árabe-estadunidense do país), onde a eleição pode ser determinada por alguns milhares de votos, reportou a Al Jazeera.

Outra má notícia para a candidata democrata, que também é vice-presidente no governo Biden, é que uma pesquisa Gallup este mês revelou que mais da metade dos estadunidenses (52%) afirmam que eles e suas famílias estão em pior situação econômica do que há quatro anos – ou seja, durante o governo democrata em vigor atualmente – e 39% acreditam que estão em melhor situação. Este é o nível mais alto de pessoas que dizem estar pior desde 1992, informou a Gallup.

Subversivos: o riso e a sátira como antídotos ao caos político nos EUA

Enquanto isso, Trump foi criticado pela filha do falecido astro do golfe profissional Arnold Palmer por comentários em que fez referência ao tamanho do pênis do golfista; não é a primeira vez que o ex-presidente expressa sua aparente admiração.

Ao mesmo tempo, sobreviventes de violência sexual e aliados publicaram um anúncio de página inteira no New York Times na segunda-feira (21) para lembrar ao público que um tribunal declarou Trump responsável por abuso sexual: “ele é um abusador comprovado. Não é uma questão de opinião; é um fato”. Concluem: “não aceitaremos isso, exigimos algo melhor”. O anúncio é assinado por mais de 100 pessoas, incluindo a atriz Viola Davis, a líder sindical de trabalhadoras domésticas Ai-jen Poo e Cecile Richards, ex-presidente da organização de saúde para mulheres Planned Parenthood, entre outras.

Violência política ameaça eleições

A violência política nos Estados Unidos, que atingiu níveis não vistos em 50 anos, ameaça ensanguentar as eleições nacionais que serão celebradas em duas semanas, e não se pode descartar um período pós-eleitoral violento.

Os incidentes de violência política desde o assalto ao Capitólio por fanáticos de Donald Trump em 6 de janeiro de 2021, cujo objetivo era anular a eleição, são o maior e mais constante aumento desde os anos 1970, segundo estimativa realizada pela Reuters. A análise de incidentes detectou pelo menos 300 casos de violência política desde o início de 2021, incluindo mais de 50 só este ano. A maioria dos casos monitorados pela Reuters provém da direita, assinalam especialistas.

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Nos últimos meses, foram registrados dois atentados contra Trump – embora seja importante notar que, em ambos os casos, os responsáveis eram indivíduos aparentemente influenciados por correntes direitistas –, assim como incidentes locais, incluindo o uso de armas de fogo no Arizona, entre outros lugares.

“Alguns legisladores republicanos e democratas estão preocupados de que a violência política com mortes em massa possa interromper a continuidade governamental” durante este ciclo eleitoral, escrevem os ex-funcionários da Casa Branca Steve Simon e Jonathan Stevenson na edição mais recente do New York Review of Books. Por sua vez, o Departamento de Segurança Interna, em sua avaliação anual sobre ameaças à segurança nacional, alerta para “respostas violentas extremistas” durante este ciclo eleitoral.

Retórica de Trump: agressiva e mentirosa

Outros especialistas reiteram advertências de que esta conjuntura eleitoral pode ser caótica e violenta, destacando a retórica agressiva de Trump e seus aliados, que declaram que esta eleição é para “salvar” a América dos perigosos “esquerdistas radicais” – o próprio candidato republicano e ex-presidente sugeriu que talvez os militares deveriam ser usados para confrontar essa “ameaça” – além de se posicionar contra os imigrantes que estariam “invadindo” o país.

Repetidas vezes, ele usou linguagem violenta para atacar seus detratores políticos, incluindo a mídia, que classifica como “inimigos” dos Estados Unidos, e os juízes e promotores que lideram vários casos criminais contra ele.

Cinismo, terrorismo e a estranha democracia dos EUA

Nunca antes na história dos Estados Unidos havia sido interrompida a transição do Poder Executivo após uma eleição, até janeiro de 2021, quando Trump incitou seus fanáticos a tomar de assalto o Capitólio para frear a certificação da eleição nacional. A violência, incluindo ameaças de assassinar à então presidenta da Câmara dos Deputados, Nancy Pelosi, e ao próprio vice-presidente de Trump, Mike Pence, obrigou a evacuação de emergência deles e de todos os legisladores do Capitólio. Trump indicou recentemente que foi um “dia de amor” e reiterou que possivelmente perdoará as centenas de participantes que foram julgados e encarcerados. Além disso, Trump, mais uma vez, (se recusou a aceitar o resultado da última eleição) não tem se comprometido a respeitar os resultados desta eleição.

Portanto, especialistas advertem que o período pós-eleitoral, sobretudo se a margem de diferença entre os dois candidatos for tão estreita como por ora sugerem as pesquisas, poderia ser muito volátil, incluindo expressões violentas.

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Há meses, setores da direita têm nutrido o ambiente de violência política, declarando que, se Trump não ganhar, uma “guerra civil” será desencadeada nos Estados Unidos, e algumas seitas e grupos de direita têm se preparado para isso.

Eles contam com apoio de amplos segmentos do universo republicano. Uma pesquisa recente do PRRI revela que quase um terço dos republicanos acreditam que “patriotas” poderiam ter que recorrer à violência para “salvar o país”, e um em cada cinco opina que, se Trump perder a eleição, ele deveria declará-la inválida e fazer “o que for preciso” para assumir a presidência.

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Embora especialistas debatam se os atos de violência política aumentaram, não incluem em seus cálculos as ameaças de violência, incluindo de morte, contra funcionários públicos, autoridades eleitorais, juízes e jornalistas — algo que disparou, sobretudo contra aqueles que são percebidos como opositores de Trump e de seu movimento.

Especialistas assinalam que essas ameaças poderiam se transformar em ações rapidamente, já que este é um país “onde, em qualquer dia, há milhares de pessoas caminhando pelas ruas que estão abertamente armadas e apoiam a ideia de cometer violência política”, comentou Galen Wintemute, diretor do Programa de Prevenção de Violência da Universidade da Califórnia em Davis, em entrevista recente ao New York Times.

Armas demais nos EUA

Vale recordar que, nos Estados Unidos, dizem que há armas suficientes para armar toda a população do país — entre 300 e 400 milhões, embora não haja números oficiais precisos. A violência política não se limita ao cenário eleitoral. Desde sua primeira campanha presidencial em 2016 até hoje, defensores de direitos e liberdades civis têm advertido que a retórica de Trump e de seus aliados, incluindo vários governadores e legisladores, tem justificado e nutrido grupos e movimentos direitistas e desatado ações de ódio em várias partes do país contra minorias.

A mensagem anti-imigrantes central da campanha de Trump tem alimentado ataques contra imigrantes ao promover a ideia de que eles são invasores que vêm para assassinar, estuprar e roubar estadunidenses – até mesmo comer animais de estimação – e que estão “envenenando o sangue” deste país.

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Ao mesmo tempo, segundo um novo informe do Center for Strategic and International Studies, o número de ataques e complôs de terrorismo doméstico contra agências governamentais, funcionários, políticos eleitos, candidatos e representantes dos partidos nos últimos cinco anos é quase o triplo do registrado nos últimos 25 anos combinados.

Mas, como sempre, os Estados Unidos repetem que há um inimigo externo, inclusive em relação à violência política interna. Nesta terça-feira (22), funcionários das agências de inteligência do governo Biden alertaram que a Rússia e o Irã poderiam tentar nutrir a violência durante o período eleitoral estadunidense para “debilitar” a democracia e minar a confiança no resultado, reportou o Wall Street Journal. “Alguns atores externos têm a capacidade de nutrir protestos e tomar ações violentas durante este período”, disse um funcionário de inteligência ao apresentar essa avaliação a jornalistas.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Jim Cason Correspondente do La Jornada e membro do Friends Committee On National Legislation nos EUA, trabalhou por mais de 30 anos pela mudança social como ativista e jornalista. Foi ainda editor sênior da AllAfrica.com, o maior distribuidor de notícias e informações sobre a África no mundo.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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