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Imagem: Freepik

Sancionar Brics só vai acelerar uso de moedas nacionais, afirma Rússia sobre ameaça de Trump

“Cada vez mais governos estão começando a adotar suas moedas nacionais [...] É um processo que está ganhando impulso em todo o mundo”, acrescentou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Perkov
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

Beatriz Cannabrava

“O dólar está começando a perder seu atrativo como moeda de reserva para muitos países. Estamos diante de um processo de erosão do dólar que está em andamento e ganhando força”, afirmou nesta segunda-feira (2) o porta-voz do Kremlin, Dimitri Peskov.

Assim ele respondeu à pergunta sobre o que pensa a presidência russa em relação à ameaça do próximo inquilino da Casa Branca, Donald Trump, de impor tarifas comerciais de 100% aos produtos dos países do grupo BRICS+ caso eles criem uma moeda própria ou deixem de usar o dólar em suas transações comerciais.

“Se os Estados Unidos, como diz Trump, tentarem impor à força que outros países continuem utilizando o dólar, provavelmente conseguirão apenas o efeito contrário: fortalecer a tendência de migração para o uso de moedas nacionais”, refletiu Peskov em sua coletiva de imprensa diária.

Na realidade, acrescentou o funcionário russo, não se trata apenas dos países que fazem parte do BRICS+, porque “cada vez mais governos estão começando a adotar suas moedas nacionais para realizar intercâmbios comerciais ou concretizar projetos internacionais de natureza econômica”.

E enfatizou: “É um processo que está ganhando impulso em todo o mundo”.

Sobre a ideia de uma moeda comum no BRICS+, o presidente Vladimir Putin, ao falar no Clube de Debates Valdai, em 7 de novembro, afirmou que ainda é cedo para falar de uma moeda única enquanto “não houver uma maior interação entre as economias” de seus membros e elas não alcançarem um certo nível de semelhança, sendo compatíveis em qualidade e estrutura.

Nova ofensiva russa

Na madrugada da última quinta-feira (28), o Kremlin respondeu aos ataques contra seu território feitos a partir de Kiev com mísseis Atacms estadunidenses em 23 e 24 de novembro. O exército russo lançou contra a Ucrânia 90 mísseis e 100 drones, afirmou o presidente Vladimir Putin em Astana, Cazaquistão, em 28 de novembro, ao término da cúpula da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC), aliança militar de nações pós-soviéticas (mais informações sobre a reunião a seguir).

O mandatário russo declarou ainda que somando as ofensivas recentes, a Rússia disparou um total de 100 mísseis e 466 drones, destruindo 17 alvos na Ucrânia, e sublinhou: “é claro que responderemos a todos os ataques realizados contra nosso território com armas de longo alcance (de até 300 quilômetros)”. Putin não descartou que Moscou volte a empregar um míssil balístico hipersônico Oreshnik, mas pontuou: “não faz sentido atacar um alvo menor com esse tipo de arma; seria como querer derrubar um pardal com canhões”.

O líder russo destacou que o Estado-Maior do Exército “está avaliando quais alvos atacar na Ucrânia” e, entre esses, mencionou “instalações militares, fábricas de armas e centros de tomada de decisões em Kiev”.

Apesar de não ter especificado o que seriam os “centros de tomada de decisões”, o Kremlin costuma usar o termo para se referir às sedes do governo, do Ministério da Defesa e do Parlamento ucranianos, as áreas mais protegidas pelos sistemas de defesa antiaérea estadunidenses Patriot. Então, Putin fez uma piada da época soviética sobre a previsão do tempo: “Ao longo deste dia, pode acontecer de tudo”, acrescentando: “O regime de Kiev continua tentando atacar instalações críticas em Moscou e São Petersburgo. Vamos responder, e o Ministério da Defesa decidirá com quais armamentos e quando”.

Cúpula da OTSC

Em sua declaração final, a OTSC defendeu a criação de um sistema de segurança estável no mundo. “A autêntica segurança deve ser indivisível e igual para todos, deve levar em conta os interesses de todos os Estados e se basear nos princípios do direito internacional e da cooperação construtiva”, sublinha o documento.

Para a OTSC, não há alternativa a criar “um mundo multipolar que se sustente na diversidade de culturas e civilizações de nosso tempo, que permita aos povos escolherem por si mesmos suas vias e modelos de desenvolvimento, sempre com apego à Carta da ONU (Organização das Nações Unidas)”.

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Assinaram a declaração os chefes de Estado da Rússia, como principal promotora da organização, e de Belarus, Cazaquistão, Quirguistão e Tadjiquistão. O sexto membro, a Armênia, não compareceu à cúpula pela segunda vez consecutiva, ao suspender sua participação devido à recusa da OTSC em intervir em seu apoio diante do que considera UMA agressão de Baku contra seu território soberano em Nagorno-Karabakh.

Além disso, os líderes da OTSC assinaram 14 documentos, entre os quais se destacam os acordos para fortalecer os vínculos dentro da aliança e para proteger a fronteira entre Tadjiquistão e Afeganistão.

Merece destaque, ainda, a declaração das ex-repúblicas para reafirmar, na região, o significado histórico do 80º aniversário da vitória da União Soviética sobre a Alemanha nazista, que será celebrado em maio do próximo ano.

Equilíbrio estratégico

Desde que o inquilino da Casa Branca, Joe Biden, autorizou o uso de mísseis de longo alcance (até 300 quilômetros) — e apenas na região russa de Kursk —, Moscou e Washington – que possuem os maiores arsenais nucleares – entraram em uma sinistra dinâmica de ameaças, conscientes de que nenhuma de suas ações temerárias pode mudar o curso da guerra, mantendo intacto o equilíbrio estratégico entre ambos.

Na realidade, é impossível saber o que realmente acontece nos campos de batalha com base na versão de apenas uma das partes: segundo Kiev, por exemplo, os mísseis Atacms estadunidenses e os Storm Shadow e Scalp, britânicos e franceses, respectivamente, atingem todos os alvos, o que os russos negam. De acordo com Moscou, seu novo míssil balístico hipersônico é impossível de interceptar, enquanto os estadunidenses asseguram que se trata de uma modificação de versões obsoletas em fase experimental, muito longe de poder ser fabricado em série, e que não causou, segundo imagens de satélite de antes e depois do ataque, nenhum dano às unidades da indústria militar na cidade de Dnipró.

Mas, supondo que todos estejam dizendo a verdade – que os mísseis ocidentais de longo alcance sejam um problema para Moscou e que o Oreshnik faça Londres, Paris e outras capitais europeias tremerem –, é óbvio que os Estados Unidos não estão dispostos a entregar a Kiev todos os seus mísseis desse tipo, muito menos armas mais avançadas, assim como a Rússia carece de centenas de mísseis de “nova geração” e conta apenas com outros de características semelhantes, capazes de alcançar qualquer país europeu com ogivas nucleares, como o Iskander-M, o Kinzhal e o Kalibr, sem mencionar os mísseis de mais de 6 mil quilômetros de alcance.

De um lado e de outro – perdoe-se a analogia pugilística –, protagonizam uma espécie de round de sombras para exibir sua força enquanto aguardam que um novo boxeador, Donald Trump, suba ao ringue. O problema é que, quando um lado provoca tanto o adversário com golpes baixos e o outro responde com demonstrações do arsenal nuclear, pode-se desencadear, por erro ou por impulso suicida, uma conflagração atômica que não terá vencedor.

Haverá uma Terceira Guerra Mundial? Se prevalecer o senso comum, não é provável, mas enquanto continuarem testando até onde vai a paciência do outro, é possível.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul Global – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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