No segundo domingo do mês de maio é comemorado o dia das mães que, assim como o dia internacional da mulher, é preciso muito mais do que uma simples comemoração, pois mãe é mãe todos os dias.
O que se comemora mesmo? Será que a dificuldade que impossibilita muitas vezes a mulher-mãe de seguir o fluxo da sua vida e dos seus sonhos, sobrecarregando-a na maternidade e nas tarefas cotidianas caseiras para que o homem-pai não desvie dos seus grandes objetivos de vida?
É no mínimo contraditório para aqueles que aderem ao sistema patriarcal, defendendo-o com unhas, dentes, cores e bandeiras, falar sobre dias das mães. Os mesmos que colocam a mulher na condição de objeto submisso ao todo-poderoso homem, descarregando sobre ela todas as funções domésticas como se fossem obrigações naturais de mulher, deixando-a em função da agenda e da masculinidade tóxica que sufoca cada vez mais a humanidade.
O sistema patriarcal que estamos inseridos não deixa escolha à mulher, a não ser manter-se em posições sociais inferiores aos homens, tirando-lhe, quase sempre, o poder de decisão e a deixando no lugar de menor capacidade de protagonismo.
Quantas mães solos encontramos hoje em dia? Mulheres que se separaram de seus companheiros e levaram como herança a maior parte da responsabilidade em relação à educação e sustento dos próprios filhos (as) ou aquelas que acabam, por pressão familiar e/ou social mantendo um casamento falido e instável por medo e receio do julgamento a que será conduzida.
Quantas mulheres geniais em nossa história não foram privadas de seguirem o seu caminho de sucesso por terem assumido o compromisso matrimonial e gerado filhos (as), tornando-as reféns? E quando estão divorciadas (na maioria das vezes) contam com pouquíssima participação do progenitor na vida dos (as) filhos (as) e no cumprimento da responsabilidade de pai.
Faz-se necessário com urgência, o rompimento com hábitos e costumes criminosos e cruéis que foram massificados e impostos a todos (as) nós, jogando-nos num limbo de contradições, injustiças e farsas onde nós mesmos (as) somos os (as) próprios alvos. Cabe a nós homens, filhos, maridos, companheiros e pais, buscar a nossa própria desconstrução social, quebrando tabus e regras de bons costumes que nos foram impostas para podermos compreender cada um (a) como parte de um todo, deixando de lado a masculinidade que nos intoxica.
Na formação da cultura ocidental, mais intensamente no surgimento das crenças religiosas que regeram por muito tempo o nosso mundo, criando e impondo leis que estimulavam cada vez mais as desigualdades, foi-nos colocada a importância da presença de um Deus que tudo enxerga e tudo repreende. Viemos de um Deus e por que não de uma Deusa? Nem sempre foi assim.
Reprodução
É no mínimo contraditório para aqueles que aderem ao sistema patriarcal, defendendo-o com unhas e dentes, falar sobre dias das mães.
As primeiras divindades da história da humanidade eram mulheres: Pótnia, Astarte, Ísis, Amaterazu, Nu Gua e representavam o começo e o fim de tudo.
Tudo o que nos foi colocado massacrou qualquer possibilidade de igualdade entre homens e mulheres perante a sociedade e o sistema.
No próximo final de semana todos (as) nós estaremos comemorando o dia das mães solos, mães que foram obrigadas a servir o lar, o marido, os (as) filho (as), mães que foram obrigadas a manter a aparência da família tradicional feliz, mães que abriram mão de seus sonhos para acumularem todas as funções, mães que sofrem violência doméstica, mães que foram estupradas, mães.
No próximo domingo estaremos comemorando o dia da mulher que se tornou mãe ou da mãe que como mulher foi deixada no pequeno e limitado espaço social que priva suas liberdades?
Mãe todos (as) nós temos, pois, diferente de um Deus, quem nos deu a vida foi uma Deusa real, de carne e osso que deve, imediatamente ser empoderada e reconduzida ao seu lugar por direito de igualdade na sociedade.
Deixo aqui a letra da canção “Angélica” composta por Chico Buarque e Miltinho em homenagem a Zuzu Angel, mulher-mãe que até sua morte (por assassinato) lutou por seu direito de poder enterrar o próprio filho morto pelo regime militar.
Quem é essa mulher
Que canta sempre esse estribilho
Só queria embalar meu filho
Que mora na escuridão do mar
Quem é essa mulher
Que canta sempre esse lamento
Só queria lembrar o tormento
Que fez o meu filho suspirar
Quem é essa mulher
Que canta sempre o mesmo arranjo
Só queria agasalhar meu anjo
E deixar seu corpo descansar
Quem é essa mulher
Que canta como dobra um sino
Queria cantar por meu menino
Que ele já não pode mais cantar
Que o próximo domingo nos desperte a consciência humana e de classe para que possamos, juntos (as) arrancar de vez um sistema que se apoderou dos nossos corpos e mentes, tornando-nos a própria caricatura de nós mesmos. Dia das mães é todo dia desde sempre!
* Danilo Nunes é músico, ator, historiador e pesquisador de Cultura Popular Brasileira e Latino-americana.
Instagram: @danilonunes013
Facebook: @danilonunesbr
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