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Os 10 anos da guerra civil na Síria nas páginas da Cadernos de Terceiro Mundo

Há praticamente uma década o país vive uma verdadeira catástrofe com um número de vítimas que varia entre 300 mil e 500 mil
Gabriel Rodrigues Farias
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Nesta semana completaram-se 10 anos da guerra civil na Síria. Há praticamente uma década o país vive uma verdadeira catástrofe com um número de vítimas que varia entre 300 mil e 500 mil dependendo da fonte. Segundo fontes da ONU, das 22 milhões de pessoas que moravam no país antes da guerra, cerca de 11,5 milhões de sírios tiveram que deixar suas casas devido as consequências do conflito tais como a violência generalizada, a fome e o caos econômico. Desses mais de 11 milhões, pelo menos 6,7 milhões estariam desabrigados e 5,5 estariam no exterior como status de refugiados.


Muito se tem dito sobre as causas dessa guerra. A mídia hegemônica, por exemplo, coloca como o principal culpado o presidente sírio Bashar al-Assad pelo modo como ele reprimiu as forças oposicionistas nos eventos da chamada ‘’Primavera Árabe’’ em 2011. Sendo esse argumento válido ou não, o fato é que a situação da Síria só virou um conflito de Guerra Total, atingindo as proporções conhecidas hoje, devido às interferências estrangeiras no país. Sabe-se que governos como os dos EUA, da União Europeia, da Arábia Saudita, de Israel, da Turquia e etc ajudaram belicamente forças oposicionistas ao regime de Assad. Do outro lado, como reposta a essas interferências, o governo sírio conseguiu ajuda de aliados como Rússia e Irã. Nesse sentido, a Síria virou um verdadeiro xadrez da geopolítica mundial da década de 2010.

Há praticamente uma década o país vive uma verdadeira catástrofe com um número de vítimas que varia entre 300 mil e 500 mil

Reprodução
Na imagem, vemos o presidente sírio Hafez al-Assad, o líder libio Muammar al-Kaddafi e o chefe da OLP Yasser Arafat em 1980.

Devido a essa conjuntura, decidimos resgatar duas matérias sobre a situação síria na década de 1980. As duas reportagens, datadas de, respectivamente, 1983 e 1984, já mostravam as possibilidades de possíveis conflitos e agressões estrangeiras na Síria. Era um contexto marcado pela invasão das tropas israelenses no Líbano, causando a guerra de 1982 na região. No primeiro texto, é analisado as consequências da assinatura do tratado que pôs fim ao estado de Guerra entre Líbano e Israel. Nesse caso, o governo da Síria foi totalmente contra o tratado, pois acreditava que esse tratado ameaça sua segurança nacional. No segundo texto, é abordado um possível confronto entre Síria e EUA devido aos bombardeios norte-americanos em posições militares em território libanês. Na época, uma das causas para o conflito não ter ocorrido era o fato do governo de Damasco, chefiado por Hafez Assad (pai do atual presidente) ter como um dos principais aliados a União Soviética. 

Com essas duas reportagens dos anos 80, percebe-se que o desejo de intervenções na Síria já era algo de longa data. Na década de 2000, o governo da Síria foi colocada como um dos integrantes do chamado ‘’Eixo do Mal’’ da Doutrina Bush. Entretanto, as agressões estrangeiras só ocorreriam, de fato, a partir de 2011, causando essa tragédia na qual vemos hoje. 

‘’Os riscos de um conflito entre Síria e Israel’’ por Mohamed Salem  

A família Assad no poder 

Como abordamos na postagem anterior, o desejo de potências geopolíticas para ações militares na Síria já era algo antigo. No entanto, pouco se sabe sobre as questões internas sírias. Por isso, decidimos colocar, na integra, uma pequena reportagem do ano de 2000 sobre o país. Foi a época da morte do líder sírio Hafez al- Assad e da ascensão do seu filho ao poder, Bashar al-Assad. O breve texto faz um pequeno resumo da situação em que o país se encontrava em relação a questão de Israel e de como a Síria era governado por Hafez al-Assad. Também foi colocado quais seriam os desafios do então jovem  Bashar al-Assad na presidência do país. Além do mais, no final do texto é relatado alguns dados importantes sobre o país naquela ocasião.

‘’UMA NOVA ETAPA: Com a morte de Hafez Assad, os olhos do mundo se voltam para a Síria, na expectativa de retomada do processo de paz com Israel 

A morte por enfarto do presidente da Síria, Hafez Assad, o Leão de Damasco, em 10 de junho, anos 69 anos de idade, antecipou a posse de seu filho, Bachar Assad, de 34 anos. O sucessor já acenou com a continuidade da negociação de paz perseguida por eu pai durante anos, mas paralisadas desde janeiro. O país árabe não abre mão da recuperação das Colina de Golã, na fronteira om Israel, região que ocupada militarmente por tropas israelenses desde a Guerra do seis Dias em 1967. A retomada do Golã é crucial para os sírios, não ó pela sua localização e estratégica como pelo fato de estarem situadas nessa região as principais fontes de água doce utilizadas por Israel. Como se sabe, a água doce é um bem e casso no Oriente Médio.

Nos 30 anos em que esteve à frente do país, Hafez Assad exerceu um papel fundamental em praticamente todos o evento relevantes do Oriente Médio. Seu principal objetivo nos últimos anos, porém não alcançado, era formar uma união com os seus vizinhos que forçasse Israel a abandonar todos os territórios árabes ocupados. Por isso, a chegada ao poder de Bachar, que representa não só uma nova geração, mas também uma linha de pensamento mais moderna e aberta, gerou expectativas de mudanças e em particular de avanços no processo de paz. Essa expectativa é reforçada pelo fato de a morte de Assad ter ocorrido menos de um mês depois da retirada das tropas israelenses do sul do Líbano, em 25 de maio, após 22 anos de ocupação. Esse desfecho teve influência da Síria, que apoia o grupo guerrilheiro Hezbollah, cujos integrantes forçaram a retirada dos soldados israelenses seis semanas antes do prazo previsto. 
O líder Hafez Assad tomou o poder após um golpe em 1970. A Síria vivia grande turbulência política desde a independência da França, em 1946. Uma sucessão de golpes deixou o país arrasado e impôs um sério atraso socioeconômico a seu povo. Desde então, Hafez Assad liderava um regime de partido único, fortemente repressivo. A internet e o fax, por exemplo, foram proibidos e até hoje apenas uma parcela da elite tem acesso ao mundo virtual em fronteiras.

Nas décadas de 70 e 80, milhares de sírios perderam a vida em ações repressivas contra os movimentos de oposição. Em 1982, foram mortas 20 mil pessoas do grupo fundamentalista Fraternidade Muçulmana, na cidade de Hamah. 

A posse de Bachar gera expectativas também em torno das questões internas, pois muitos observadores acham que ele poderá se empenhar em responder aos anseios da maioria da população, impulsionando a modernização da Síria. Médico oftalmologista, Bachar Assad morava na Inglaterra quando precisou retomar a seu país, em 1994, após a morte de seu irmão mais velho, Basel, num acidente de carro. Foi a partir desse ano que ele começou a ser preparado para suceder o seu pai no poder. Com a morte prematura de Assad, a Constituição precisou ser alterada para que Bachar pudesse assumir a presidência com menos de 40 anos, até então a idade mínima para poder ocupar o mais alto cargo do país. No entanto, a negociação da paz com Israel, sem abrir mão de Golã, parece ser a prioridade do jovem chefe de Estado, prosseguindo assim o sonho do pai.

Resta saber se ele terá pulso firme o suficiente para manter-se no poder, num país caracterizado por acirradas disputas pelo comando, inclusive familiares. Um dos seus tios, Rifaat Assad, que se sentiu prete1ido na sucessão presidencial, insinuou que Bashar não era a melhor escolha para o cargo. Ele vai ter que demonstrar o contrário.

Capital: Damasco 
População: 14.574.000 (1996)
Religião:,A maioria é muçulmana
Idioma: Arabe (oficial). 
PNB Per capita: U$: 1.160 
Moeda: Libra síria 
Serviço da dívida: 3,8% das exportações

ECONOMIA: A extração de petróleo é a maior indústria da Síria
POLÍTICA: O Partido Baath Árabe Socialista, fundado em 1947 por Michel Aflaq, é o eixo da coligação que está no poder desde os anos 60, a Frente Nacional Progressista. A Irmandade Muçulmana representa a principal oposição, atuando na clandestinidade. 
DATA NACIONAL: 17 de abril (independência) 
GOVERNO: Além do presidente, há um primeiro-ministro e o Conselho Popular é o Legislativo Unicameral, de 195 membros ‘’

‘’Uma nova etapa’’ por Edouard Bailby


Memória

Tema complexo, que requer uma análise de longo prazo e a compreensão da geopolítica atual. Para uma visão histórica do tema, compartilhamos reportagem publicada na revista Cadernos do Terceiro Mundo de 1997.

A Diálogos do Sul é a continuidade digital da revista fundada em setembro de 1974 por Beatriz Bissio, Neiva Moreira e Pablo Piacentini em Buenos Aires:

A recuperação e tratamento do acervo da Cadernos do Terceiro Mundo foi realizada pelo Centro de Documentação e Imagem do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ, fruto de uma parceria entre o LPPE-IFCH/UERJ (Laboratório de Pesquisa de Práticas de Ensino em História do IFCH), o NIEAAS/UFRJ (Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre África, Ásia e as Relações Sul-Sul) e o NEHPAL/UFRRJ (Núcleo de Estudos da História Política da América Latina), com financiamento do Governo do Estado do Maranhão.


Textos publicados originalmente na página Revista Cadernos do Terceiro Mundo – Acervo Digitalizado


CADERNOS DO TERCEIRO MUNDO. Rio de Janeiro: Terceiro Mundo, ano 6, n. 62, jan. 1984, p. 72-75 


CADERNOS DO TERCEIRO MUNDO. Rio de Janeiro: Terceiro Mundo, ano 26, n. 220, abr.-maio 2000, p. 56-57


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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