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ToggleA violência é o flagelo que mais cicatrizes deixa nas mulheres no Panamá, devido aos maus tratos psicológicos ou físicos de seus companheiros no lar e à vingança do crime organizado.
Segundo cifras oficiais, entre 2016 e dos dois primeiros meses de 2020, 191 mulheres foram assassinadas sob distintas circunstâncias; no entanto, 87 casos despertaram o interesse de autoridades e especialistas pelo grau da sanha na hora de perpetrar o crime.
A esta realidade se soma o questionamento sobre o grau de participação que cada vez mais têm as mulheres dentro da estrutura do crime organizado, fenômeno que cobra por ano, como média, mais de 400 vidas de mulheres nesta nação centro-americana, como registra um artigo do diário Panamá América.
Sobre o tema, a diretora do Instituto de Criminologia da Universidade do Panamá, Bélgica Bernal, sustentou que algumas dessas mortes violentas são resultado da relação e correlação de força que elas mantêm com algum membro de grupos de delinquentes.
De acordo com a especialista, o surgimento de pequenas organizações femininas, especializadas em delitos como fraudes bancárias, clonagem de cartões de crédito e extorsão telefônica, entre outros, está associado ao conceito de empoderamento, igualdade e competição com o homem.
No entanto, a realidade é que muitas das que estão atrás das grades são utilizadas para pagar por condenações de seu companheiro ou familiares, ao mesmo tempo que outras são assassinadas em meio a um ciclo de vinganças por guardar relação com pessoas vinculadas a delitos, precisou a psicóloga.
Dados da Direção Geral do Sistema Penitenciário revelam que apenas 20% da população de delinquentes no Panamá são mulheres, mas cerca de 80% delas estão presas por transporte de drogas, esconder mercadorias, participar da venda a varejo e estar vinculadas a um membro ativo de um grupo criminoso.
“Pagam por ser mulher, supostamente a parte mais fraca da delinquência, mas se delinquem, para elas é pior, e são vitimadas duplamente, porque têm filhos que não podem criar e companheiros que não podem atender por estar cumprindo penas”, afirmou Bernal.
Opinião com a qual coincide o pesquisador social Gilberto Toro, que assegurou que (as mulheres) não são membros ativos nem importantes dentro da estrutura da delinquência, “são irmãs, mães, esposas ou vizinhas que têm um valor sentimental para os membros das quadrilhas, o que as torna alvos de vingança ou mensagens de advertência entre inimigos”.
No meio da guerra entre bandos, elas levam a pior parte como no caso ocorrido em abril a oeste da capital panamenha, em que uma mulher e seu filho de três meses foram assassinados em um ajuste de contas entre grupos de delinquentes, a um dos quais pertencia seu companheiro.
Estatísticas da unidade de homicídios do Ministério Público (MP) revelam que a idade das mulheres assassinadas nos últimos anos oscilam entre os 18 e 36 anos, porque “ser companheira de um membro proeminente de uma quadrilha ou do crime organizado é atrativo para as jovens, sobretudo para aquelas que buscam reconhecimento sobre outras mulheres”.
Mas este não é o único problema que confronta o chamado sexo frágil no contexto da violência; outro, cada vez mais visível, as espreita até dentro de suas próprias casas.
LexLatin
A violência cada vez mais visível, as espreita até dentro de suas próprias casas
Feminicídios durante a pandemia
Das redes sociais ou através das frias estatísticas emerge o feminicídio, um fenômeno antigo no Panamá, aumentado em meio à pandemia da Covid-19, que entre janeiro e junho do atual ano acumulou 23 casos, 11 a mais em relação a igual período de 2019, segundo o MP.
Desta forma, 2020 se situa como o segundo ano com mais vítimas fatais por violência de gênero, se considerarmos que 2015 registrou 29 casos.
Um recente estudo do Centro de Pesquisas Científicas das Ciências Sociais (CENICS) da Universidade Santa María La Antígua refletiu que 71% dos 115 feminicídios reportados no Panamá entre janeiro de 2014 e dezembro de 2018 ocorreram dentro de casa, e o resto em lugares públicos e apartados.
Segundo a pesquisa, a maioria das vítimas vivia com seu companheiro, 38 eram casadas e 18 solteiras; as armas brancas e de fogo figuram entre as mais usadas para cometer os assassinatos, que se concentraram nas províncias de Panamá, Colón, Chiriqui e Panamá Oeste.
Outro aspecto importante da pesquisa é que a maioria das vítimas (109) são mulheres brancas e afrodescendentes entre 18 e 35 anos, às que se somam seis indígenas.
Em declarações ao diário La Prensa, o sociólogo Luis Carlos Herrera, um dos cinco pesquisadores que realizaram o estudo, ressaltou a necessidade de incorporar estratégias de prevenção da violência e assistência às vítimas, além de conscientizar a sociedade sobre este flagelo que causa luto, dor e dano psicológico à família.
Mais de 400 mulheres, entre elas 200 por violência doméstica, receberam ajuda no Panamá desde o início da quarentena obrigatória pela Covid-19 inaugurada em 25 de março.
Segundo a chefe da assessoria legal do Instituto Nacional da Mulher, Omaris Martinau, esta medida obrigou as vítimas a conviver com seus agressores, e por isso a entidade habilitou duas linhas telefônicas para atender as denúncias e oferecer orientação.
Diante da possibilidade de um aumento desses casos, a Defensoria do Povo desenvolveu a campanha informativa “Quarentena sem violência”, na qual alertava sobre a vulnerabilidade que mulheres e meninas podem enfrentar em casa por causa do confinamento.
No mundo, uma de cada três mulheres sofre maus tratos físicos, abuso sexual ou de outra espécie nas mãos de alguém conhecido, na maioria dos casos, referem estudos da ONU Mulheres.
No entanto, os serviços públicos de qualidade para a saúde mental raramente considera as mulheres, sua segurança e o processo que devem atravessar para se recuperar da violência, razão pela qual o Panamá dá passos importantes para melhorar esta situação.
Dados da Organização Mundial da Saúde revelam que a exposição a eventos traumáticos, como resultado da violência contra a mulher, pode causar estresse, transtorno do sono, medo, desolação, depressão e até tentativas de suicídio.
O “vazio legal” imposto pela Covid-19, após as medidas de restrições e fechamentos, não só deixou desamparadas as vítimas da violência, mas também muitas grávidas com contratos suspensos, trabalhadoras informais ou desempregadas.
Por isso não é casual que 1% nada desprezível das mulheres panamenhas se sintam invisíveis em meio a esta situação que lhes reserva a pior parte da crise econômica e social do país, apesar de ser o rosto mais visível no atendimento aos doentes, à família em casa e na educação a distância dos filhos.
Nubia Piqueras Grosso, Correspondente de Prensa Latina no Panamá
Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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