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ToggleDepois da queda do Império Otomano ao finalizar a I Guerra Mundial, a Grã Bretanha teve o mandato da Liga das Nações para administrar a Palestina. A gestão de Londres foi pouco eficaz, em parte pelas promessas contraditórias que fizeram aos árabes, aos sionistas e à França, a outra potência colonial com a qual dividiu a zona.
Mas o conflito é muito mais antigo. Já se cumpriram 30 séculos desde os primeiros enfrentamentos entre filisteus e hebreus e o acordo de paz impulsionado pelo presidente estadunidense Donald Trump entre Israel e duas pequenas ditaduras monárquicas arcaicas do golfo não será certamente a solução para a rivalidade milenar.
Os filisteus se estabeleceram nessa zona por volta do ano 1200 A.C. Nos finais do século XI A.C. os israelitas conseguiram expulsá-los de grande parte de seu território, mas continuaram sendo independentes na faixa costeira. E, apesar de nunca terem dominado completamente toda a área, o nome do gentílico procede precisamente da palavra peleset (filisteu) e o território Filasṭin, Falasṭn ou Filisṭin (Palestina).
Três mil anos mais tarde, o conflito parece não ter solução. Os Israelitas nunca aceitaram a existência de um Estado palestino.
Por sua parte, os dirigentes palestinos vivem utilizando uma retórica impossível, que os leva a perder muitas ocasiões. A corrupção da qual se lhes acusa, é certa, mas Israel tem uma história bastante negra.
Os sultões e sheiks árabes são pessoas com mentalidade da idade média; o único que lhes importa é o fanatismo religioso e o dinheiro. Trump gosta deles, porque de alguma maneira são parecidos. Os israelitas têm sabido aproveitar-se de tudo isso, e eliminar a possibilidade de um Estado palestino.
Resultado: os palestinos vão ter que viver sob o controle israelita. Vão ser cidadãos de segunda classe, e a composição de Israel vai mudar já que os ultra-ortodoxos haredim têm uma taxa de crescimento mais alta que os árabes e os demais judeus.
Monitor do Oriente
Israel vai adotando cada vez mais o caminho do apartheid
No futuro de Israel, ao invés da paz um apartheid
Os árabes são 20% da população, enquanto os “haredim constituem 12% da população. No momento da criação do Estado de Israel eram apenas 0,2%. São clãs medievais, que vivem em um mundo especial. Por exemplo, conquistaram o direito de não ir à escola, já que só estudam as escrituras sagradas. Não prestam o serviço militar e por direito não trabalham, sendo basicamente mantidos pelo Estado.
Benjamin Netanyahu sobrevive graças aos partidos ultra-ortodoxos. O futuro de Israel não é um futuro de paz. É um país que vai se “direitizar” sempre mais, que vai ter que continuar usando a força contra os palestinos, que vão se converter exclusivamente em um problema interno, já que serão abandonados pelos demais árabes. Vão viver em atrozes condições econômicas e sociais, e vamos presenciar a forma como Israel vai adotando cada vez mais o caminho do apartheid.
Estas vitórias curtas de Netanyahu pressagiam um futuro negro. Tenho visitado demasiadas vezes a região como para ter um prognóstico positivo. Em tudo isto, Trump impulsiona alianças com os fundamentalistas religiosos sunitas liderados pela Arábia Saudita, unidos contra os xiitas, liderados pelo Irã.
Irã, a antiga civilização persa, é muito mais tolerante que os sunitas. O problema é que foi capturada por um grupo de fanáticos, que se aproveitaram da impopularidade do Xá Mohammad Reza Pahlavi, para tomar o poder em 1979. Não são populares, mas se mantêm.
Cabe recordar que o regime teocrático se instalou com a decisiva ajuda do Ocidente.
O Aiatolá Ruhollah Khomeini voltou do seu exílio na França em um avião posto à disposição pelo governo conservador do presidente Valéry Giscard d’Estaing.
O Irã faz parte dos erros de leitura da realidade dos Estados Unidos, cuja política exterior é sempre de curto prazo.
Desencadear uma escalada para tirar o Xá, utilizando o clero, criou um regime que finalmente se voltou contra eles, coisa que Reza Pahlavi nunca teria feito. É o mesmo erro cometido no Afeganistão, quando financiaram um movimento contra a ocupação russa, criando fenômenos como Bin Laden, que terminaram em um caminho oposto.
Dito seja de passagem, é o mesmo erro que cometeu Israel quando apoiou no começo a Al Fatah, para debilitar a Organização para a Libertação da Palestina (OLP) de Yasser Arafat.
Os mullah não são nada populares, mas se mantêm pelo apoio dos camponeses e um forte aparato repressivo. Sem dúvida em algum momento os recursos serão retirados em uma crise interna sangrenta, e o Irã voltará à sua normalidade.
A este respeito, desejo sublinhar três assuntos:
a) o Irã tem universidades de altíssimo nível, um grande cinema, uma excelente arquitetura, uma boa categoria científica; todas realidades desconhecidas no mundo sunita.
b) Em Teerã há sinagogas e igrejas, coisa inexistente no mundo sunita.
c) Em todos os atentados terroristas ocorridos na Europa e nos Estados Unidos não há um só terrorista xiita. E tenhamos em conta que o Irã sofre sanções há 40 anos.
A lição é que o desastre político do Oriente Médio é um desastre de governabilidade no qual o Ocidente e Trump têm muitas responsabilidades. E também os europeus, que instalaram os reis, príncipes, emires e xeques quando repartiram entre eles o império otomano.
E Trump, com seu genro, que apesar de ser judeu, sabe raciocinar em termos árabes, ao fortalecer o mundo dos petrodólares e do pensamento medieval.
Em todo este panorama, os palestinos continuam como um povo sem pátria e sem nacionalidade, e os israelitas têm a resposta preparada: não aceitam o plano de paz, e não têm dirigentes que queiram a paz.
No entanto, persistir em manter milhões de pessoas ressentidas e na pobreza não é uma receita inteligente. E é evidente que o nível intelectual e artístico pouco tem que ver com esta fórmula.
Portanto, cair nesta armadilha só se explica pelo esforço de Netanyahu de manter-se no poder a qualquer preço, vendendo sua alma à ultra direita, com uma esquerda que se converteu em uma força simbólica…
Roberto Savio, Presidente de Other News, o ítalo-argentino é economista, jornalista, especialista em comunicação, comentarista político, ativista pela justiça social e climática, e defensor de uma governança global anti-neoliberal. Diretor de relações internacionais do Centro Europeu para a Paz e o Desenvolvimento. Cofundador, em 1964, e atual Presidente Emérito da agência de notícias Inter Press Service (IPS), que dirigiu durante mais de quatro décadas.
IPS, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados
Tradução: Beatriz Cannabrava
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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