Conteúdo da página
ToggleBuenas!
Ainda de quarentena, trouxemos mais dicas de filmes, músicas e livros latino-americanos para animar o final de semana.
Filme
No campo da sétima arte, destacamos uma iniciativa multi governamental entre o México, Bolívia, Equador, Uruguai, Colômbia e Peru chamado “Retina Latina”, que completa neste ano de 2020 seu quarto ano de existência.
Este portal reúne produções de curta e longa-metragem de produções latino americanas nos mais diversos gêneros e para todas as idades.
Um detalhe importante é que alguns títulos tem tempo limitado de permanência no portal, que varia de acordo com a produtora de cada película, sendo possível, após este prazo, alugar ou comprar a obra. Para isso, basta estar cadastrado no site: https://www.retinalatina.org.
Crédito: Alejandro Chaskielberg
Da série "Pixeles"
Canal
Outra dica bacana vem da Argentina. É o Canal Encuentro, TV aberta e canal no Youtube, criado em 2007 pelo Ministério da Educação argentino.
Além de desenhos animados, filmes, reportagens e documentários voltados para a América Latina, o canal no Youtube disponibiliza programação musical de produção própria, na qual podemos assistir a shows e entrevistas dos grandes nomes da música do continente, como Susana Baca, Jorge Drexler, Lila Downs, Mercedes Sosa e muito mais.
Destacamos aqui um passeio da cantora afroperuana Susana Baca pelas ruas de Lima, onde nasceu, e começou sua carreira de cantora, sendo uma das maiores representantes dos ritmos peruanos, como o Festejo e o Socabon, por exemplo.
Livro
Nada como um bom livro para passar o tempo e conhecer novas realidades. Com prefácio do sociólogo Emir Sader, o livro “A Venezuela que se inventa”, do jornalista Gilberto Maringoni, traz as peculiaridades do processo de ascensão de Chávez ao poder e seus feitos no contexto dos anos 2000 em nome da “Revolução Bolivariana”.
O estudo da Venezuela se faz fundamental para nos esclarecermos sobre sua proposta alternativa aos modelos econômicos anteriores e também compreender o movimento chavista e a adesão de grandes parcelas da sociedade que, até os dias de hoje, dão suporte a um processo político cheio de controvérsias e críticas por todos os vieses político-ideológicos.
Sua primeira edição é de 2004, momento final do primeiro mandato do ex-presidente Hugo Chávez Frias, que pouco antes havia sofrido um Golpe de Estado barrado por parte das forças armadas e pressão popular.
Homenagem
Aproveitamos este espaço para homenagear o escritor chileno Luis Sepúlveda, que morreu na última quinta-feira (16), vítima do novo coronavírus. Muito popular em seu país e em toda a América Latina, foi exilado nos anos 1970, durante a ditadura de Augusto Pinochet.
Seu livro mais conhecido é “O Velho Que Lia Romances de Amor”.
Sepúlveda morreu na Espanha, aos 70 anos. Em sua homenagem, reproduzimos o texto “Las mujeres de mi generación”, compartilhado conosco pela companheira Beatriz Cannabrava, grande conhecedora da cultura latino americana:
As mulheres de minha geração
Luis Sepúlveda.
A Carmen Yañez “Pelusa”, Marcia Scantlebury e Ana Schilling.
As Mulheres da minha geração abriram suas pétalas rebeldes
Não de rosas, camélias, orquídeas ou outras flores
De salas tristes, de casinhas burguesas, de costumes alheios, mas sim de ervas peregrinas entre ventos.
As Mulheres de minha geração floresceram nas ruas,
E nas aulas argentinas, chilenas ou uruguaias souberam o que tinham que saber para o saber glorioso das Mulheres da minha geração.
Usando suas minissaias coloridas nos anos setenta
As Mulheres da minha geração não ocultaram nem as sombras de suas coxas que foram as de Tania erotizando com o maior dos calibres os caminhos duros do encontro com a morte
Porque as Mulheres da minha geração beberam com gosto o vinho dos vivos responderam a todas as chamadas e foram dignidade na derrota.
Nos quarteis as chamaram de putas e não as ofenderam porque vinham de um bosque de sinônimos alegres:
Minas, Grelas, Percantas, Cabritas, Minones, Gurisas, Garotas, Jevas, Zipotas, Viejas, Chavalas, Senhoritas
Até que elas mesmas escreveram a palavra COMPANHEIRA
em todos os dorsos e nos muros de todos os hotéis
Porque as Mulheres da minha geração marcaram com o fogo indelével de suas unhas a verdade universal de seus direitos.
Conheceram o cárcere e os golpes
Habitaram em mil pátrias e em nenhuma
Choraram seus mortos e os meus como seus
Deram calor ao frio e ao cansaço desejos
Deram sabor à água e orientaram o fogo por um rumo certo.
As Mulheres da minha geração pariram filhos eternos
Cantando Summertime os amamentaram
Fumaram maconha nos descansos
Dançaram o melhor do vinho e beberam as melhores melodias
Porque as Mulheres da minha geração nos ensinaram que a vida não se oferece aos sorvos, companheiros, mas sim de uma só vez e até o fundo das consequências.
Foram estudantes, mineiras, sindicalistas, operárias, artesãs, atrizes, guerrilheiras,
até mães e companheiras nos momentos livres da Resistência
Porque as Mulheres da minha geração só respeitaram os limites que superavam todas as fronteiras.
Internacionalistas do carinho, brigadistas do amor, comissárias do dizer te amo
milicianas da carícia.
Entre batalha e batalha, entre amor e amor, entre fogo e fogo
As Mulheres da minha geração deram tudo e disseram que isso não era suficiente.
Foram declaradas viúvas em Córdoba e em Tlatelolco
Vestiram-nas de negro em Puerto Montt e em São Paulo. E em Santiago, Buenos Aires ou Montevidéu foram as únicas estrelas da longa luta clandestina.
Seus cabelos brancos não são cãs, mas uma forma de ser para fazer o que as espera.
As rugas que assomam em seus rostos dizem eu ri e chorei e faria tudo outra vez.
As Mulheres de minha geração ganharam alguns quilos de razões que grudam em seus corpos
Movem-se algo mais lentamente, cansadas de nos esperar nas metas.
Escrevem cartas que incendeiam as memórias
Recordam aromas proscritos e os cantam.
Inventam a cada dia as palavras e com elas nos arrastam
Nomeiam as coisas e constroem o mundo
Escrevem verdades na areia e as oferecem ao mar
Nos convocam e nos geram sobre a mesa posta.
Elas dizem pão, trabalho, justiça, liberdade e a prudência se transforma em vergonha.
As Mulheres da minha geração são como as barricadas: protegem e animam, dão confiança e suavizam o corte da ira.
As Mulheres da minha geração são como um punho fechado que resguarda com violência a ternura do mundo.
As Mulheres da minha geração não gritam porque elas derrotaram o silêncio.
Se algo nos marca, são elas.
A identidade do século são elas.
Elas: a fé no regresso, a coragem oculta em um panfleto,
O beijo clandestino, o retorno a todos os direitos
Um tango na serena solidão de um aeroporto
Um poema de Gelman escrito em um guardanapo
Benedetti partilhado no planeta de um guarda-chuva
Os nomes dos amigos guardados com ramos de lavanda
As cartas que fazem beijar o carteiro
As mãos que seguram os retratos dos meus mortos
Os elementos simples dos dias que apavoram o tirano
A complexa arquitetura dos sonhos de seus netos.
São tudo e tudo sustentam
Porque tudo vem com seus passos e nos chega e nos surpreende.
Não há solidão para onde elas olhem
Nem esquecimento enquanto elas cantem.
Intelectuais do instinto, instinto da razão
Prova de força para o forte e amorosa vitamina do fraco.
Assim são elas, as únicas, irrepetíveis, imprescindíveis, sofridas, golpeadas, negadas mas invictas
Mulheres, Mulheres, Mulheres da minha geração.
Até a próxima semana!
LatinidaDJ é colaborador da Diálogos do Sul
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
Veja também