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ToggleEnquanto a pandemia de Covid-19 se expande sem que seja possível detê-la por todo o globo, sua difusão causa estragos inimagináveis na Itália, onde sobram as questões sobre seu aparecimento, letalidade e duração.
Segundo os dados oficiais mais recentes, publicados em 01 de março, na Itália foram registrados 105.792 casos de pessoas afetadas pela Covid-19, com 12.428 mortos, 15.729 curadas e 77.635 pacientes atualmente em tratamento.
Desde o surgimento dos primeiros surtos, a emergência se concentra em regiões do norte da península, principalmente na Lombardia, uma das mais desenvolvidas do país e a mais densamente povoada, com pouco mais de 10 milhões de habitantes.
Nessa região, cuja capital é a cidade de Milão, relatam-se 41.007 casos, com 6.360 mortes, seguida por Emilia Romaña, com 13.119 e 1.443 mortes; Piemonte, 8.206 e 684 mortes; e o Vêneto, com 8.358 e 392 mortes.
Embora na Itália a presença do Sars-CoV-2 tenha sido detectada pela primeira vez em 30 de janeiro, em um casal de turistas chineses procedentes de Wuhan, seu aparecimento autóctone deu-se em 21 de fevereiro, nos municípios de Codogno, na Lombardia, e VoEuganeo, no Vêneto.
Em apenas alguns dias, a doença propagou-se para outros oito municípios da Lombardia, o que não aconteceu no Vêneto, onde os três mil habitantes de VoEuganeo foram submetidos a uma quarentena de duas semanas e a testes por meio dos quais foi detectada a presença do vírus em 89 pessoas, a maioria delas assintomática.
Em ambos os surtos, foi comprovado que nenhum dos contagiados esteve na China recentemente nem houve indícios para chegar à fonte original, razão pela qual é muito provável que o vírus tenha deambulado inadvertido por essas zonas durante semanas até sua identificação em pacientes com sintomas de gripe.
Essa é a opinião de Pier Luigi Lopalco, epidemiólogo da Universidade de Pisa que em declarações ao jornal La Repubblica afirmou que foi um golpe de sorte interceptá-lo quando os médicos do hospital da localidade lombarda de Codogno decidiram comprovar sua existência na pessoa qualificada como o “paciente um”.
No mesmo sentido pronunciou-se Massimo Galli, professor de Doenças Infecciosas da Universidade de Milão e médico dessa especialidade no Hospital Sacco, que afirmou que sobre a base dos dados epidemiológicos pode-se dizer que o vírus começou a circular na Itália no final de janeiro.
Por isso, indicou, “percebemos o fogo quando o incêndio havia queimado grande parte do primeiro andar, mas foi uma situação casual que poderia ter acontecido em qualquer outra parte do mundo”.
Prensa Latina
A elevada cifra de vítimas fatais é outro aspecto que preocupa na Itália
Propagação da epidemia
A partir da identificação dos dois primeiros surtos, o novo coronavírus se propagou como fogo em pasto seco por regiões do norte do país, como Lombardia, Emilia Romaña, Piemonte, Vêneto e em menor medida Liguria, Alto Adige e Friuli Venécia-Julia, até cobrir, com maior ou menor intensidade, todo o país.
Mediante uma análise comparativa dos dados publicados pelo Departamento de Proteção Civil entre 2 e 29 de março, pode-se apreciar a evolução da epidemia com crescimento em espiral em todos os indicadores.
Nesse período passaram de 2.036 a 97.689 os casos, de 52 a 10.779 as mortes e de 1.835 a 73.880 os pacientes em tratamento.
O governo, por sua vez, recorreu à aplicação gradual e escalonada de medidas restritivas e de isolamento, até chegar à paralisação quase total do país; tais medidas começaram a dar sinais de efetividade com a diminuição esporádica do número de novos casos diários, embora o número de mortes se mantenha alto.
A elevada cifra de vítimas fatais é outro aspecto que preocupa na Itália, onde são frequentes as comparações entre o índice de letalidade do vírus aqui com o registrado em outros países o que, na opinião dos especialistas, leva a conclusões equivocadas.
Letalidade aparente e plausível
O tema é abordado por cientistas e pesquisadores nos meios de comunicação e estudos como o realizado pelo Instituto de Estudos Políticos Internacionais (Ispi), que explica a diferença entre os conceitos de letalidade aparente ou Case Fatality Rate (CFR) e letalidade plausível ou Infection Fatality Rate (IFR).
Baseado nas estatísticas publicadas por 11 países, o informe mostra índices de letalidade aparente que vão desde 0,5% na Alemanha e na Áustria, até 9,9% na Itália e 7,2% na Espanha, passando por 1,4% nos Estados Unidos, Suíça e Coreia do Sul, 4% na China, 4,9% na França, 5,3% no Reino Unidos e 5,6% nos Países Baixos.
Nesse sentido, o informe explica que em uma epidemia, o único modo de conhecer as pessoas contagiadas é por meio de um exame, ao qual não se submete toda a população por duas razões fundamentais.
Por um lado, pode existir uma parte da população assintomática ou com sintomas muito leves, que não se submete ao teste porque não percebe a doença e, por outro, na expansão da epidemia a cifra de casos cresce com tanta rapidez que se limitam os exames aos mais urgentes.
Tendo em conta essa e outras variáveis e com dados oficiais publicados em 24 de março, o Ispi concluiu que a quantidade real de contagiados na Itália, nesse momento, chegava a 530 mil e não a 55 mil.
Como é óbvio – indica o texto – o cálculo da letalidade aparente é imediato porque se conhece tanto o número dos casos confirmados como o dos falecimentos, enquanto o da plausível requer diversas operações para chegar ao resultado que, na Itália, seria de 1,14%.
Um fator importante para determinar a letalidade plausível na Itália é o alto nível de velhos em sua população, havendo uma esperança de vida de 80,8 anos para os homens e 85,2 para as mulheres. Resultado, 22,8% da população tem mais de 65 anos e 15 mil pessoas têm mais de 100.
De acordo com o monitoramento diário da epidemia, o Instituto Superior de Saúde (Iss) indicou que a idade média das pessoas falecidas com a Covid-19 é de 79 anos (82 as mulheres e 78 os homens) e a dos contagiados 63, enquanto 29,6% do total são mulheres.
Outro elemento determinante no alto índice de letalidade aparente na Itália, associado geralmente à idade, é o das patologias prévias, fenômeno presente em quase todos os pacientes falecidos.
A análise de 710 histórias clínicas realizada pelo Iss comprovou que só 2,1% das mortes foram pessoas sem doenças preexistentes, 21,3% tinha uma, 25,9%, duas e 50,7% três ou mais.
As patologias mais frequentes foram hipertensão arterial, cardiopatia isquêmica, diabetes mellitus, fibrilação atrial e câncer ativo nos últimos cinco anos, entre outras.
As complicações clínicas mais frequentes observadas na amostra foram a insuficiência respiratória, em 96,4% dos casos, seguida por danos renais agudos, 24,7%, infecções variadas, 10,4% e infarto agudo do miocárdio, 10,1%.
Até 26 de março, só 84 dos 6.801 mortos, tinham menos de 50 anos e 17 deles menos de 40, com 14 homens e três mulheres entre 30 e 39 anos, oito dos quais apresentavam patologias cardiovasculares, renais, psiquiátricas, diabetes e obesidade.
Nessas circunstâncias e sem informação que permita conhecer em cada caso a causa da morte, pode-se deduzir que a Covid-19 foi apenas o catalisador de processos desestabilizadores em organismos com avançado nível de deterioração e muito vulneráveis.
Duração da epidemia
Os especialistas indicam que a ligeira diminuição no aparecimento diário de novos casos, observada nos últimos dias de março, pode ser interpretada como um sinal positivo na evolução da curva epidêmica em direção ao ambicionado descenso definitivo.
No entanto, todos concordam que a duração desse processo dependerá do cumprimento individual das medidas restritivas aplicadas para conter a difusão do vírus, principalmente o isolamento domiciliar para impedir sua transmissão por meio dos contatos interpessoais.
Frank González, correspondente de Prensa Latina na Itália
Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.
Tradução: Ana Corbisier
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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