Se está confuso, não se preocupe, o Brexit é mesmo confuso, alertava hoje um apresentador de televisão, aludindo à incerteza em torno da pretendida saída do Reino Unido da União Europeia (UE) em 29 de março.
Brincadeiras à parte, a verdade é que a dez dias da data pactuada para o divórcio, ninguém se atreve a vaticinar qual será a futura relação de Londres com o bloco de 17 nações.
Por um lado, a primeira ministra Theresa May se empenha em consumar a separação na data prevista, mas seus planos já se chocaram duas vezes contra uma muralha de parlamentares, próprios e alheios, que se uniram contra o acordo entre Londres e Bruxelas.
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A variada oposição ao Brexit proposto por May está motivada por uma cláusula que foi incluída no pacto, por solicitação da UE, para impedir o estabelecimento de uma fronteira dura entre a Irlanda e a província britânica da Irlanda do Norte.
Segundo essa salvaguarda, conhecida em inglês como Irish backstop, o território norte-irlandês continuaria sob os regulamentos aduaneiros e comerciais europeus até que o Reino Unido e a aliança firmem um novo acordo.
Nem sequer o compromisso legalmente vinculante que a UE ofereceu na última hora sobre o caráter temporário dessa medida consegue convencer os eurocéticos britânicos, que temem que o país continue atado ao bloco, mesmo depois de concretizada a ruptura.
Na véspera, a Câmara baixa do Parlamento britânico também recusou, por duas vezes, a possibilidade de que o Reino Unido abandone a UE sem haver firmado antes algum tipo de acordo.
Uma saída intempestiva, alertam os analistas, submergiria o país em uma crise econômica e social, devido à escassez de remédios e alimentos, ao incremento do desemprego e ao aumento da inflação, ao colapso da libra esterlina e à queda do Produto Interno Bruto.
Inclusive o ministro da Economia, Philip Hammond, admitiu que um Brexit sem acordo provocará a curto e médio prazo uma redução da capacidade produtiva do país.
Os deputados devem votar uma moção introduzida pelo executivo que propõe um adiamento da saída até 30 de junho, mas com a condição de que o Parlamento torne a votar o plano de May nesta semana.
Em qualquer caso, como a outorga da prorrogação requer o consenso dos 27 membros da aliança europeia, a primeira ministra advertiu que Londres terá que explicar muito bem a Bruxelas os motivos da solicitação.
Partidária de abandonar a UE com ou sem acordo, a mandatária conservadora recalcou que uma demora além do 30 de junho obrigaria o Reino Unido a participar das eleições para a Euro-câmara, com o que, disse, aumenta o risco do país ficar para sempre dentro da aliança.
Nesse sentido advertiu que a não consumação do divórcio equivaleria a trair o desejo expressado pela maioria dos britânicos no referendo de 2016.
Como era de se esperar, a oposição, com o trabalhista Jeremy Corbyn à cabeça, tanta tirar vantagem do limbo em que se encontra o Brexit para fazer em pedaços a política do governo conservador.
Segundo Corbyn, depois das duas derrotas consecutivas sofridas na Câmara dos Comuns, o Brexit de May “está morto”, e por isso o Parlamento deveria se encarregar, a partir de agora, de negociar os termos do divórcio.
O impasse também poderia ser aproveitado pelos partidários de permanecer na UE (pouco menos de 50 por cento do eleitorado, segundo o referendo) para pressionar pela celebração de uma segunda consulta popular, mas isso já seria tema para uma segunda temporada desta novela.
* Tradução: Beatriz Cannabrava