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Conselho que vai redigir nova Constituição no Chile é dominado pela extrema-direita

O grande vencedor do dia foi o Partido Republicano, de extrema direita, defensor da ditadura de Augusto Pinochet e contrário à substituição da Carta Magna
Aldo Anfossi
La Jornada
Santiago

Tradução:

A extrema-direita e a ala direita varreram a eleição de conselheiros constitucionais no Chile, conquistando 33 dos 50 assentos, e terão o poder de redigir um novo texto por conta própria, pois obtiveram muito mais do que os três quintos (30) mínimos necessários para aprovar o texto, enquanto a centro-esquerda obteve apenas 17, muito aquém dos dois quintos (21) que lhe dariam força para vetar e forçar uma negociação.

A eleição, de acordo com alguns analistas, também se tornou um teste para o governo do presidente Gabriel Boric, sobrecarregado por uma crise de segurança pública, pela entrada ilegal de migrantes e por uma situação econômica considerada ruim devido à alta inflação (13% em 2022) e ao fraco desempenho da economia.

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O grande vencedor do dia foi o Partido Republicano, de extrema direita, defensor da ditadura de Augusto Pinochet e contrário à substituição da Carta Magna herdada dessa ditadura, que se tornou a principal força política do país. Os ultradireitistas obtiveram 35,4% dos votos, ficando com 22 dos 50 conselheiros, o que facilita o controle do processo, pois eles têm mais de dois quintos do Conselho Constitucional.

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O líder republicano José Antonio Kast, em seu discurso de vitória, declarou: “hoje podemos respirar um pouco mais calmos, mais aliviados e dizer com responsabilidade e com esperança que hoje é o primeiro dia de um futuro melhor para o nosso país, é o primeiro dia de um novo começo para o Chile”; praticamente antecipando uma terceira corrida presidencial em 2025.

Ele garantiu que “não há nada para comemorar porque o Chile não está bem, porque nós, chilenos, não estamos bem”, embora “possamos estar felizes porque alcançamos um objetivo importante, mas não é hora de comemorar ou dividir o país, é hora, acima de tudo, de trabalhar em unidade para o bem do Chile”, acrescentando que hoje “as ideias do senso comum triunfaram”.

De acordo com Kast, “o Chile derrotou um governo fracassado, que deve ser dito em alto e bom som, incapaz de lidar com a crise de insegurança migratória”.

Leia também: Lei controversa e US$ 1,5 bi em “modernização”: as soluções do Chile para a Segurança Pública

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Ele não esclareceu qual seria a conduta de seu partido no Conselho, se facilitaria ou não a elaboração de um novo texto.

A direita “clássica”, composta pela UDI pró-Pinochet, Renovación Nacional (RN) e Evopoli, que concorreu como parte do pacto Chile Seguro, ficou em terceiro lugar com 21% e 11 cadeiras.

“Temos uma responsabilidade, hoje as forças de centro-direita e de direita representam mais de 3/5 dos vereadores, temos que estar à altura da ocasião para propor ao país uma Constituição que nos una, uma nova e boa Constituição”, disse o presidente da RN, Francisco Chahuán.

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O pacto governista Unidade para o Chile (Frente Amplio, comunistas e socialistas) obteve 28% dos votos para 17 delegados. Seus líderes não reconheceram a derrota e tentaram explicar o que havia acontecido, embora tenham insistido na necessidade de unidade no partido governista – que competiu em uma disputa dividida – e de acordos políticos para romper uma espécie de impasse político no parlamento.


Boric acusa golpe

O presidente Boric, reagindo aos resultados e acusando o triunfo da extrema-direita e da direita de ser um golpe para seu governo e para a centro-esquerda, refletiu que o processo constitucional desenvolvido em 2022 “fracassou, entre outras coisas, porque não soubemos ouvir uns aos outros entre aqueles que pensam de forma diferente”, acrescentando: “Quero convidar o Partido Republicano a não cometer o mesmo erro que nós”, pedindo aos conselheiros que ajam “com sabedoria e temperança”.

Boric, que votou em sua cidade natal, Punta Arenas, no extremo sul do país, e onde no sábado sofreu um acidente ao ficar preso dentro de um escorregador infantil no qual ele mesmo desceu, falou no domingo à noite do Palácio de la Moneda, a sede do governo, onde invocou a necessidade de diálogo e acordos políticos com a oposição.

“Chegar a acordos é difícil por natureza e, às vezes, em tempos de polarização, torna-se intuitivo (…) Os cidadãos, não tenho dúvida, exigem de nós um esforço ainda maior, que é o de sairmos dessa posição de conforto”, porque “quando o pêndulo da história oscila de um extremo a outro em curtos períodos de tempo, são sempre as populações mais vulneráveis que sofrem o confronto entre as elites”.

O grande vencedor do dia foi o Partido Republicano, de extrema direita, defensor da ditadura de Augusto Pinochet e contrário à substituição da Carta Magna

Reprodução/Governo do Chile
Eleição deste domingo, além de marcada pela contingência, foi influenciada, segundo analistas, pelos altos e baixos do Governo Boric

78% dos 15 milhões de eleitores aptos a votar votaram; houve mais de 2 milhões de votos inválidos e 500 mil votos em branco, basicamente pessoas que expressaram sua insatisfação com um processo constitucional que elas percebem como desprovido de soberania e autonomia, uma vez que os conselheiros trabalharão em um texto redigido por uma “comissão de especialistas” escolhida a dedo pelo parlamento.

O resultado dos cinco meses de trabalho que os conselheiros elegeram neste domingo será submetido a um plebiscito em dezembro, de modo que a questão constitucional no Chile ainda está longe de ser encerrada.


Eleição dos conselheiros

Oito meses depois que se recusou esmagadoramente um projeto de nova Constituição, o Chile foi novamente às urnas neste domingo (7) para eleger paritariamente 50 conselheiras e conselheiros que redigirão o projeto de Carta Magna, para o que disporão de cinco meses a contar de 7 de junho.z

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E embora se trate de algo transcendente – persegue finalmente substituir a Constituição de 1980 redigida durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) –, o processo e a campanha geraram pouco interesse, os aspirantes passaram despercebidos e para muitos cidadãos obrigados por lei a votar, o único interesse foi evitar a multa que implica não fazê-lo.

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Pior ainda, longe de centrar-se em temas constitucionais, o tom que caracterizou a campanha dos aspirantes é o debate sobre a crise de insegurança que padece o país, bem como impedir a entrada de imigrantes e inclusive sobre como não expropriar as economias de aposentadoria; todos assuntos que não abordam para nada o propósito central de uma Constituição: a definição de regras institucionais para as próximas décadas. 

Porém, além do mais é muito diferente ao que provocou a explosão social de outubro de 2019, que começou a partir de “folha em branco” com plenas faculdades para redigir o texto que fracassou em setembro de 2022. Entre as diferenças, basicamente impostas pela direita como condição para reviver o processo, um “marco de 12 princípios” que restringe a autonomia do Conselho Constitucional; e uma comissão especialista” de 24 membros que prepara um anteprojeto no qual deverão trabalhar, embora com faculdades aos conselheiros que serão eleitos para modificá-lo.

A eleição deste domingo, além de marcada pela contingência, foi influenciada, segundo analistas, pelos altos e baixos do governo de Gabriel Boric, cuja aprovação oscila entre 26 e 30%.

As pesquisas já previam uma alta participação, de até 74%, devido à obrigatoriedade de votar, mas ao mesmo tempo fez imprevisível os resultados porque a campanha esteve marcada pela contingência além da apatia e o desinteresse dos cidadãos; embora setores do oficialismo tenham dito que a noite do domingo poderia ser a “das facas longas” se os resultados fossem catastróficos.

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“A maioria das pessoas tem pouco interesse no processo e nos resultados porque acreditam que não se trata de nada tão dramático para mobilizá-las, mesmo sendo uma questão vital para o país ou para suas próprias vidas o que está em jogo”, diz o analista Marco Moreno. 

Em maio de 2021, na anterior eleição de convencionais, os independentes e a centro-esquerda obtiveram uma esmagadora maioria de 118 dos 155 participantes eleitos; enquanto a centro-direita mal alcançou 37, nem sequer um terço do que era requerido para bloquear.

Agora, é a extrema-direita pinochetista que vai redigir a Carta Magna que tinha por missão superar a Constituição de Pinochet.

Aldo Anfossi | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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