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Nicolás Maduro e Vladimir Putin (Foto: Agência Brics Rússia 2024)

Ação militar contra Venezuela poderia motivar reação de China e Rússia

Os Senhores da Guerra não percebem que as coisas mudaram: um ataque à Venezuela seria um conflito continental, algo como um Vietnã no século 21
Gustavo Espinoza M.
Diálogos do Sul Global
Lima

Tradução:

Beatriz Cannabrava

A denominação parte de uma lenda. Consideram-se “Senhores da Guerra” aqueles que têm em suas mãos um grande poderio militar, ao qual somam um qualificado comando político que transforma sua vontade em fatos, exercendo seu domínio sobre uma região determinada. Sua força se explica certamente por sua predisposição à guerra e por sua elevada capacidade de ação no campo das armas.

Na China feudal, cunhou-se o termo para evocar um período histórico específico, entre 1916 e 1930, quando os Grandes Senhores herdaram o legado da histórica rebelião de Taiping, iniciada em 1850. Naqueles anos, homens poderosos lutaram agressivamente para consolidar seu domínio territorial, derrotando e humilhando seus adversários.

Foi uma luta envolta em expressões religiosas e sociais, que confrontou a Dinastia Qing e o Reino Celestial da Grande Paz, em uma guerra longa e prolongada, deixando um rastro doloroso de morte e destruição. Por isso, essa etapa já é considerada superada na China e no mundo.

E os avanços da civilização contemporânea nos ensinam que não é por meio desse tipo de confronto que a humanidade progride. Pelo contrário, retrocede às cavernas.

Os novos Senhores da Guerra

Mas agora parece que novos Senhores da Guerra estão buscando se estabelecer na América Latina. E procuram dar à guerra um conteúdo mais ideológico. Para eles, o inimigo genérico é o marxismo, mas o termo encobre muito. Vai desde o pensamento progressista até as ideias revolucionárias, as concepções práticas e até a língua usada como instrumento de comunicação.

Para eles, por exemplo, o Quéchua é uma ferramenta marxista e serve para incitar os povos. Não só deve ser proibido, mas também seus falantes devem ser perseguidos. Sob esse conceito, as populações originárias devem ser privadas de direitos, pelo menos até que aceitem sua condição de submissão em relação à casta dominante, branca e crioula.

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E, para que se adaptem a essa realidade, devem ouvir os poderosos exigindo a morte de seus adversários, mesmo que estes sejam fugazes, imprecisos ou diletantes. Por isso, até hoje se escuta o troar de alguns dinossauros que clamam: “Morte a Castillo! Morte a Cerrón!”

Aqueles que gritam assim, hoje ocupam cargos públicos que não lhes agradam. Prefeririam não ser chamados de prefeitos, mas de Governadores do Burgo, e aspirariam depois a um posto maior, não de presidentes, mas de vice-reis, pois preferem estar sempre aos pés da coroa. Adoram esse odor.

Trump, Marco Rubio…

Os Senhores da Guerra percorrem hoje o continente. Marco Rubio, representando Donald Trump – o Guerreiro Maior –, ronda Costa Rica, Guatemala, Panamá e outros países. E Edmundo González, o fictício “presidente eleito” da Venezuela, visita Equador e Peru. Ambos articulam o mesmo: uma intervenção militar contra a Venezuela. Mais ou menos como deseja Francisco Belaunde: com o uso de mísseis, como em Gaza.

Por ora, bloqueio total. Selvageria pura e dura. Nem um dólar, nem um euro; que ninguém compre um barril de petróleo, nem venda um pão; façam-nos uivar de fome e sair às ruas para derrubar Maduro e colocar González. E, se não o fizerem, bala neles e bombas, como se fossem palestinos.

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Para seus planos, têm três rotas: a agressão direta via Infantaria da Marinha dos Estados Unidos, como nos anos 1930 do século passado; a provocação fronteiriça, pela Guiana, reivindicando o território plano de Esequibo; e a agressão multinacional pelo Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, o TIAR. O problema é que, para que este último caminho funcione, é necessário que os países sejam “vizinhos” da Venezuela, o que não é o caso. Os outros Senhores da Guerra – o argentino Milei e o equatoriano Noboa – estão longe.

A terceira em disputa, Dina Boluarte – Senhora da Guerra –, está muito ocupada justificando seus latrocínios e muito distante também da estima popular. Além disso, ela não pode se dar ao luxo de mostrar o rosto. Mal aparece com seu perfil retocado, uma chuva de vaias a deixa sem fôlego e exausta. Recentemente, comprovamos isso na Praça de Armas de Lima em 28 de janeiro. Mal se mencionou seu nome, e houve provocações por toda parte.

Os tempos são outros

Os Senhores da Guerra não percebem que as coisas mudaram. Uma agressão militar à Venezuela não seria uma guerra local, mas continental. E daria lugar até à intervenção de países de outros continentes. Seria algo como um Vietnã no século 21.

E, como aconteceu naquela época, a vitória seria saboreada pelos povos. De qualquer forma, os “teóricos” do tema sonham que a Rússia “não se meta” e que a China “não se interesse” pela Venezuela. Então – acreditam –, os EUA poderão agir à vontade. Mas não será assim. Por isso, o que ocorreu em Lima no último 28 de janeiro foi um encontro espúrio.

Dois arlequins que se acham presidentes de um país abraçaram juntos sua orfandade. Embora muitos bajuladores cantem para eles, todos sabem que não valem nada.

Os Senhores da Guerra, ontem e hoje, foram derrotados pela história. Não é à toa que em 2025 se comemoram os 80 anos da derrota do fascismo e da vitória dos povos.

E não é à toa, tampouco, que a bandeira da dignidade, manchada com o sangue de soldados heroicos, foi hasteada no coração da Europa, consagrando a paz para os povos.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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