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Nicolás Maduro, presidente da Venezuela (Foto: Reprodução / Presidência da Venezuela)

América Latina fraturada: a adesão de Brasil, Colômbia e Chile à ingerência dos EUA na Venezuela

Exigência das atas eleitorais por parte de governos aparentemente de esquerda é significativa e uma grosseira intervenção nos assuntos internos da Venezuela
Ricardo Arenales
Semanário Voz

Tradução:

Ana Corbisier

O alinhamento de pelo menos sete países da América Latina à cartilha de Washington, que garante que as eleições na Venezuela foram uma fraude, junto com a resolução da Organização de Estados Americanos, OEA, que exige a publicação de todas as atas do registro eleitoral, e o apoio desta posição pelas principais potências europeias, contribuíram para a fratura na unidade latino-americana. Além disso, iniciativas como a proposta de repetir as eleições, formar uma Frente Nacional ou promover um processo de transição no país bolivariano, intensificaram esta fragmentação.

O alinhamento de certos governos da região às políticas do Departamento de Estado dos Estados Unidos em torno a uma fraude, anunciada previamente por grupos de pensamento da ultradireita em Miami, revela que o objetivo não era examinar os votos e as atas, e sim apenas deslegitimar de antemão o governo de Nicolás Maduro e sua aspiração a ser reeleito. Esta estratégia buscava desobstruir o caminho para o reapoderamento do petróleo e outras riquezas naturais da Venezuela, a pátria de Simón Bolívar.

Alguns estudiosos indicam que este processo se assemelha à fratura provocada na Iugoslávia depois da queda do muro de Berlim e a derrubada do campo socialista. Naquele momento, este país se dividiu em subregiões, até agora antagônicas. Tanto na Iugoslávia como na Venezuela, as potências quiseram impor um modelo de democracia ‘made in USA’.

OEA atenta contra Constituição da Venezuela

Em 16 de agosto passado, a OEA votou uma resolução relativa às eleições presidenciais na Venezuela. Solicitou ao Conselho Nacional Eleitoral (CNE) que publique todos os detalhes das eleições o quanto antes: as atas, os registros de votação. A legislação venezuelana exige que o CNE anuncie os resultados nas 48 horas posteriores à jornada eleitoral, publique-os nos 30 dias seguintes e publique de forma tabulada os dados dos centros de votação.

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A legislação não indica a publicação solicitada pela OEA, petição que vai contra a Lei Orgânica de Processos Eleitorais (LOPE) da Venezuela. A OEA faz uma exigência a um país que não é membro dela. Na Venezuela, o Tribunal Supremo de Justiça é a autoridade competente para resolver qualquer desacordo na contagem de votos. E foi o que fez.

Mas os aliados dos Estados Unidos não reconhecem esta autoridade, o que é uma grosseira intervenção nos assuntos internos de uma nação. Não há outro antecedente no mundo em que organismos exógenos reclamem das autoridades de um país a publicação de seus registros eleitorais. Esta demanda, sustentada por vários governos latino-americanos, inclusive alguns de ‘esquerda’, fraturou a unidade latino-americana.

Alinhados com Washington

A política intervencionista contra a Venezuela tem outros filões. O presidente Nicolás Maduro denunciou a intenção de relançar o nefasto Grupo de Lima por parte de sete nações, com as quais suspendeu relações diplomáticas. Este grupo no passado posicionou Juan Guaidó como quinta-coluna, ‘presidente interino’, uma invenção de Washington, para derrotar o projeto bolivariano de mudanças sociais na Venezuela.

Agora, o ensaio se repete com María Corina Machado e Edmundo González. Os aliados de Washington ‘reconhecem’ este último como vencedor nas urnas. É significativo que, no caso da resolução da OEA, vários países com governos aparentemente de esquerda se unam aos Estados Unidos para aprovar a resolução; entre eles, Brasil, Chile e Colômbia.

O caso do Chile é significativo. O governo de Gabriel Boric, que diz admirar Salvador Allende, o presidente mártir assassinado no golpe de Estado projetado pelos Estados Unidos em 1973, alinha-se ao Departamento de Estado em temas como a condenação à Venezuela e o apoio ao regime fascista da Ucrânia.

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Mas há também o caso do Brasil e da Colômbia, cujos governos vacilaram em apoiar o processo bolivariano. O governo de Lula, na última hora, aparece com uma camaleônica posição em que não reconhece o triunfo de Edmundo González, mas tampouco o de Maduro, apesar de que tanto o Conselho Nacional Eleitoral como o Tribunal Supremo de Justiça fizeram a recontagem dos votos e ratificaram o veredicto das urnas em favor de Maduro.

Esta atitude vacilante seguramente levou a que, dos três países que estavam intercedendo para buscar uma solução negociada para a crise na Venezuela ─ Brasil, México e Colômbia ─, o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, se afastasse do grupo. López Obrador optou por apoiar a única solução possível: a que o povo venezuelano adotar no exercício de sua soberania e autodeterminação.

Destino da América Latina em jogo

Temos, pois, uma esquerda que não sabe que posição adotar neste caso. Nem o chanceler do Brasil, Mauro Viera, nem o da Colômbia, Luis Gilberto Murillo, são pessoas de esquerda; nem sequer de centro-esquerda. Ambos têm estreito vínculo com os círculos de poder dos Estados Unidos, onde foram embaixadores.

Outro ingrediente que contribui para a fratura regional é o surgimento de uma linha de extrema-direita, atualmente representada pelo governo de Javier Milei na Argentina. Enquanto a Venezuela reforça uma férrea intervenção estatal para consolidar o crescimento da nação, o governo argentino aposta no livre mercado e no neoliberalismo. Estas visões são duas linhas opostas entre as quais se debate o futuro latino-americano.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Ricardo Arenales

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