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Infância triste: negar a situação das crianças na Guatemala é um insulto inaceitável

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

Foi publicado no site Prensa Libreuma reportagem denúncia sobre o estado da infância na Guatemala e imediatamente surgiram vozes negando essa realidade cujos efeitos estão à vista de todos. Haver nascido no país é um castigo não merecido para milhões de crianças cuja infância permanece submergida na miséria, na subnutrição e na falta de acesso ao que a Constituição promete e seus governantes ignoram. Não é apenas em saúde e educação que a promessa é violada, mas na proteção integral em todos os aspectos do desenvolvimento.

Carolina Vásquez Araya*

Costumo revisar cuidadosamente as expressões compartilhadas por internautas nas redes sociais. São variadas e refletem em muitos aspectos a profunda crise do Estado da Guatemala e de todas as suas instituições, públicas e privadas. Ali se estampa com absoluta clareza o efeito catatônico provocado por um conflito armado cujos métodos repressivos foram cientificamente calculados pelos treinadores estadunidenses para não deixar qualquer possibilidade de rebelião em uma sociedade calada pelo medo.

A forma seletiva como foram perpetrados os assassinatos de líderes e povos indígenas não foi um arrebato irracional da soldadesca, mas uma estratégia desenhada no marco da Guerra Fria. Esses métodos não desapareceram e estão patentes nas estatísticas de um país supostamente democrático e em paz. O que foi vivido nestas últimas décadas e, sobretudo no último ano mostra como essa passividade temerosa da cidadania tem um efeito direto no empoderamento dos setores mais corruptos e destrutivos da sociedade.

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O impacto das decisões engendradas nos círculos poderosos das organizações empresariais, no exército, no Congresso da República e no poder executivo vai diretamente ao próprio coração da Nação. A Guatemala é um país saqueado vilmente e sem o menor recato. Os acordos e compromissos internacionais são ignorados pelos centros de poder e, pior ainda, são aprovadas e modificadas leis cujo único propósito é resguardar a impunidade daqueles que cometem delitos a partir dessas instâncias. Diante desse cenário a cidadania espera que alguém desça da Via Láctea, tome a iniciativa e aconteça o milagre da mudança.

Entretanto, enquanto isso acontece, a infância agoniza à vista de todos. A pobreza na Guatemala é um crime de lesa humanidade porque a riqueza abunda. O drama humano da desnutrição, da falta de moradia, da destruição planejada da infraestrutura com fins de privatização, da apropriação de bens do Estado, do abandono dos migrantes e muitos outros atos abertamente criminosos leva o país no rumo da perda total da pouca soberania que ainda resta.

A nomeação de amigos e cúmplices para os postos chaves do governo incide de maneira direta na degradação ambiental, na ocultação do saque, em garantias de impunidade para os envolvidos em delitos fiscais e eleitorais, mas, sobretudo na crua realidade desse desfile interminável de crianças, adolescentes, homens e mulheres de todas as idades em direção à fronteira, pessoas que preferem arriscar a vida nesse trajeto que fazê-lo em sua própria terra. Claudia Patricia — a jovem guatemalteca que foi assassinada com um tiro na cabeça por um agente da Patrulha Fronteiriça dos Estados Unidos— é o símbolo de outros milhares de jovens ansiosas por alcançar um sonho fora da sua pátria, porque nela foram condenadas à miséria por ser mulher, pobre e indígena. Assim é como a Guatemala responde ao seu povo. O mais perverso dessa política de exclusão é que ao reduzir drasticamente as perspectivas de desenvolvimento expulsam essas jovens do território para que, desde o norte, alimentem as arcas das quais os governantes e seu círculo de amigos obtêm sua riqueza mal havida.

Se as pessoas boas esperam que suceda um milagre, vão acabar ficando sem país.

* Colaboradora de Diálogos do Sul, da Cidade da Guatemala


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
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