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Paremos de eleger nossos ladrões para que nossos filhos não morram de fome

São intermináveis as drásticas condições de miséria em que nos submeteram os que nos governaram. De nada valem as nossas riquezas
Juan Verástegui Vásquez
Diálogos do Sul
Lima

Tradução:

Que todos saiam! Sim, que saiam, mas… Virão, de novo, todos!  Irão embora os Fujimoris, os Toledos, os Garcías, os Pedro Paulo Kuczynski (PPK)s, os Ollantas-Heredias, as Susanas, os Castañedas, os Becerriles e seus flagelos substitutos, mas virão os mesmos com diferentes roupagens, com diferentes máscaras, aparecerão renovados e frescos, como recém-nascidos, tudo diferente, só uma coisa não mudará, “A Corrupção”. Agora serão mais sofisticados, mais hábeis, mais experientes, mais espertos. São máquinas do engano, dos jogos sujos e da traição. Por isso, não troquemos ranhos por babas!

São todos filhos nascidos e criados em uma mesma cloaca, amamentados em uma mesma teta e irmanados em uma mesma causa: O roubo e a destruição do país. Não lhe interessa mais nada. 

A história de nosso Peru já está cansada de avisar-nos destes corruptos, e não percebemos suas tantas manhas que há centena de anos nos vêm prejudicando. 

Juram e perjuram e se santificam e prometem que nunca mais roubarão! Ou, em todo caso, roubarão, mas trabalharão, assim se purificam. E que prestarão contas de cada centavo gasto. Prometem ser infatigáveis, severos e implacáveis em julgar e sentenciar os pícaros; prisão perpétua, caia quem cair, os peixes gordos primeiro, dizem. Fazem gargarejos e enxaguam suas bocas – que arte de gênios – fabricando estruturas mentecaptas para ganhar votos e roubar o poder. Disfarçam mentiras, para poder enganar sem nem sequer corar e dizem ter “qualidade moral imaculada”. Os enganos são o pão de cada dia e são de todo tipo, ensalivados com argúcias e falácias para ganhar a confiança dos eleitores. São até hoje, cinco ex-presidentes consecutivos anteriores e alguns ex-ministros, ex-prefeitos e ex-governadores enlameados até o pescoço, mas também alguns congressistas, alguns magistrados e quanta laia de gentalha que nos governaram sempre. 

Rasgam as vestes prometendo solucionar os profundos problemas do país; erradicarão a fome e a miséria, nos dizem; já não haverá crianças desnutridas, nem anêmicas, nem com fome, nem nenhuma delas se deitará sem comer sua ração da noite; prometem construir colégios, hospitais, estradas e pontes, e se não há rio para essa ponte, promete também construir o rio, e também instalar na tua casa, tua biblioteca para que sejas culto e sejas lido e não te enganem jamais. Converteremos o Peru em um país pujante e do primeiro mundo. Emboscadas mafiosas montadas em um andaime sedento de poder. Pobres diabos.  

Criaremos e defenderemos o emprego digno e ninguém jamais te tirará do seu trabalho; teu salário será reajustado periodicamente para que possas manter-te e manter teus filhos e não morram de fome; garantiremos a saúde gratuita para ti e tua família; fortaleceremos a educação que será de qualidade e gratuita.

Canalhadas dantescas e monstruosas, montadas ao amparo de nenhuma lei que lhes obrigue a cumprir o prometido e prestar contas; tudo isto se converte em legitimado e legalizado. Blasfêmias envernizadas e disfarçadas para fazê-las digeríveis e enganar o povo. Por isso recordemos a Simón Bolívar, quando disse: “Mais que pela força, pelo engano nos dominaram”. 

Fabricam campanhas políticas e nos vendem o produto, que são eles mesmos, embrulhados no melhor papel de presente filigranado em ouro. É um investimento, dizem, e gastam milhares de dinheiros em sua campanha política, cuja origem é da máfia para devolvê-lo depois, como no caso da Odebrecht. 

Disfarçam o oportunismo eleitoreiro, com poses de feitiço mágico, tiram fotos sorridentes e cheios de felicidade, caras felizes, frases como se fosse para vender o melhor sebo de cobra, que tudo cura e que é oportuno e eficaz para nossos males, dizem como qualquer mascate. Marketing político, nos repetem. Mas, nenhuma ideia de planejamento governamental, nenhum vislumbre sobre a realidade nacional, nem qual é a visão, para o futuro, de um Peru melhor; repetem a mesma coisa, palavras ocas e pouca seriedade em suas propostas, jamais sabem sobre os problemas urgente e reais da população, e se sabem, não o dizem. A questão é votos e mais votos e mais votos, prometem tudo para depois esquecer do povo, de suas necessidades e de sua fome. Enchem de cartazes as avenidas e ruas, gastam milhões em anúncios na televisão, nos jornais, no rádio, painéis publicitários, caravanas e até compram aqueles que se vendem para transformar em editoriais mensagens que o façam vendível. 

É isto a democracia! Sintam-se felizes e votem cada vez que há que votar. Isto é civismo! É ser um bom cidadão! Cumpra teu dever patriótico! Nos martelam dia e noite. A democracia se reduz, assim, em emitir o voto, e depois eles decidem e gastam o dinheiro do povo, enquanto nós ficamos na miséria. 

São intermináveis as drásticas condições de miséria em que nos submeteram os que nos governaram. De nada servem as ingentes riquezas naturais que nosso país possui. O Peru é o segundo produtor mundial de cobre, prata e zinco; ocupa o terceiro posto no mundo na produção de chumbo; quarto lugar, no mundo, de estanho e molibdênio e sexto na produção de ouro.   

São intermináveis as drásticas condições de miséria em que nos submeteram os que nos governaram. De nada valem as nossas riquezas

Facebook/ Partido Comunista Pátria Roja
Em protesto, cidadãos peruanos pedem "eleições gerais já!"

Produz cobre com 2.44 milhões de TMF (toneladas métricas finas) que representam 11.8% do total mundial. De zinco, produz 1.47 milhões de TMF que representam 11.6% de tudo o que é produzido no mundo. Em prata, alcançou o volume 4,163 TMF, localizando-nos no segundo lugar no nível mundial com uma participação de 15.5% no nível global. Conta com as maiores reservas de prata do mundo, com um total de 110,000 TMF que representa 19.6% do total. Na produção de chumbo alcançou 289,195 TMF, sendo o terceiro maior produtor mundial. Em ouro produziu 142.6 TMF aportando 4.4% da produção mundial, ocupando o sexto lugar no mundo. Em cobre, zino e molibdênio ocupamos o terceiro lugar no nível global com maiores reservas. 

A agroindústria de Ica, Piura e La Libertad, cujas irrigações foram feiras com dinheiro do povo e hoje são propriedade de grandes transnacionais nacionais e estrangeiras, com uma produtividade assombrosa; o produto, na quase totalidade é destinado à exportação e para alimento de carros (etanol), ficando para o país uma ridícula porcentagem e da pior qualidade. As condições laborais dos trabalhadores desta indústria são deploráveis, têm férias de apenas 15 dias, muitos não têm seguridade social nem aposentadoria; os empresários pagam só 15% de imposto de renda, etc. 

De acordo com um estudo da FAO, mais de 99 por cento de nosso pescado vai para fora, ficando menos de 1 por cento para o país. É levado para o estrangeiro, sem pagar nada pelo alimento, nem sequer pagam impostos e, pior ainda, para alimento de animais de zoológico, enquanto nossas crianças sofrem de anemia por carência de ferro que o nosso pescado poderia proporcionar. 

Uma compatriota que vende ervas na esquina, paga relativamente mais impostos que uma transnacional mineira que nem paga pelo ouro, prata que leva, tampouco paga seu imposto quando exporta o mineral ou quando importa maquinaria para mineração; na etapa de exploração tampouco paga imposto quando compra, em nosso país, seus teodolitos, sapatos, capacetes, hospedagem, alimentação, etc. Se uma microempresa peruana fizer o mesmo, é fechada.  Cajamarca é o primeiro produtor de ouro no país e se encontra no primeiro lugar em pobreza; Echarate, Cusco, produz quase 100% do gás que é consumido no país e até exporta; o gás custa ali 60% mais caro que em Lima, mais de 90% de seus moradores cozinham com lenha e esse mesmo gás é exportado para o México a um preço muito inferior ao de Lima. 

Neste contexto de corrupção e de predomínio do neoliberalismo, nossa produção está estancada, carece de diversificação produtiva e está imersa em esgotamento tecnológico. Há ausência do setor manufatureiro doméstico e o que existe gera dependência tecnológica por ser de fora e está fincado fundamentalmente, na extração de matérias primas. Este processo de crescimento gera uma dinâmica produtiva truncada e isolada, carente de encadeamentos produtivos com a economia local e é inconsistente para a modernização de nossa economia, e impede, além do mais, de alcançar capacidades competitivas dinâmicas que permitam uma inserção exitosa. Somos uma economia primária exportadora que arrastamos há séculos. 

O setor agrícola se encontra estancado, com uma estrutura produtiva obsoleta e em decadência. A maior pobreza se encontra no campo com mais de 60%. Que contrassenso! Importamos quase 100% do trigo, 60% do milho, 35% do leite, enquanto nossas terras estão desocupadas e o camponês na maior pobreza. 

E o que aconteceu, igualmente, com a tremenda riqueza do guano da ilha (aportou cerca de 80% dos ingressos estatais), com o açúcar, o algodão, a borracha etc. 

Na atualidade, um trabalhador que ganha salário mínimo tem que trabalhar 48 anos para igualar o que ganha em um ano um funcionário do Banco Central de Reserva do Peru. 

Cerca de cinquenta por cento de nossas crianças são anêmicas; mais de dez por cento têm desnutrição crônica; cerca da quarta parte da população peruana se encontra na pobreza. 80% dos trabalhadores são informais; 70% dos trabalhadores mineiros são precários. Só 20% dos trabalhadores têm seguridade social etc., etc.  

Definitivamente, todo isto é consequência do capitalismo. Seguimos aprisionados nesta corrupção fortificada pelo neoliberalismo.  

Por que esta nossa riqueza engendra tanta pobreza, arrastando drásticos indicadores sociais e econômicos negando, muito severamente, a posse de abundante riqueza natural?

A corrupção, o engano e a astúcia arrastam nosso país ao abismo. 

Não vamos eleger nunca mais nossos próprios ladrões. Os que nos encarceram injustamente fabricando mentiras; os que judicializam e criminalizam nossas justas reclamações; os que nos reprimem e nos matam, quando discrepamos do modo de desenvolvimento mais conveniente para o país; os que promulgam leis contra o trabalhador e o povo; os que saqueiam nossa riqueza sem pagar nada; os que privatizam nossa educação e nossa saúde; os que se opõem a um desenvolvimento com presença nacional; os que estão contra o país. Os que negociam nossos recursos naturais que, como no caso de Cajamarca em 2016, as grandes transnacionais exportaram minério por um montante de 4 bilhões, 475 milhões enquanto à região correspondeu a miséria de 279 milhões; ou seja, para cada 100 soles exportado transferiram à região 6,2 soles. Nesse mesmo ano, Arequipa exportou 13 bilhões e 144 milhões, enquanto à região correspondeu 399 milhões de soles, o que evidencia que para cada 100 soles exportados a região recebeu a miséria de 3 soles. 

Convençamo-nos e prometamos que aqueles que nos roubaram, torturaram, reprimiram, humilharam, envergonharam e mentiram jamais ganhem nas eleições. Desprezemo-los com a negação de nosso voto tornando-o muito consciente de bem pensado. Não cometamos, de novo, o equívoco de elegê-los para que nos governem e nos saqueiem e nos alimentem com nossa própria fome; pensemos uma e mil vezes em eleger alguém que nos represente e esteja junto a nós nos momentos difíceis e complexos, mas sem enganos. 

Definitivamente, é possível sair dessa armadilha em que estamos. Que nossas riquezas fiquem para alimentar nosso povo e que não sejam levadas pelas grandes transnacionais e nos deixem na miséria. Tanta riqueza ancestral andina que herdamos e tanta riqueza de nossos recursos naturais, hoje serão suficientes para que nenhuma criança morra de fome e que tranquilamente possam curar-se de sua doença, o que não acontece hoje porque não têm dinheiro. 

Prometamos que nunca mais nos deixemos enganar para que nenhum de nossos filhos morra de fome.  

* Juan Verástegui Vásquez é economista e colaborador de Diálogos do Sul desde Lima, Peru

** Traduzido por Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Juan Verástegui Vásquez

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