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Revolta da população equatoriana serve de alerta para Martín Vizcarra no Peru

O presidente peruano com um novo Chanceler poderia – e deveria – ter tido uma atitude mais prudente e mais sensível em torno ao tema
Gustavo Espinoza M.
Diálogos do Sul
Lima

Tradução:

Costuma-se dizer: “quando vejas que queimam as barbas de teu vizinho, põe as tuas de molho”. Pois bem, Martín Vizcarra, depois de ter ganho a adesão cidadã pondo cadeado à grotesca forma denominada de “Congresso da República”, pôs em risco sua imagem enviando nada menos que uma “saudação” ao Presidente do Equador, Lenin Moreno, cuja barba está hoje ardendo pela vontade de milhões de povoadores deste país irmão. 

Porque foram milhões, efetivamente, os que foram às ruas virtualmente em toda a República para repudiar um mandatário que não tem feito outra coisa que desrespeitar suas próprias promessas e compromissos eleitorais. Depois de ter sido eleito por um Movimento Cidadão que o levou primeiro como vice-presidente de Rafael Correa e depois como Presidente, o senhor Lenin Moreno trocou de bando, e se pôs ao lado dos adversários do povo. Hoje é um fervoroso propagandista do Fundo Monetário e do Banco Mundial, o que desatou a justa ira da população. 

Basta simplesmente revisar arquivos para se dar conta do calibre das adesões que este Moreno lançava antes, durante e mesmo sete meses depois das eleições que o honraram como Mandatário de seu país e que não tinham mais propósito que exaltar a figura de Rafael Correa, o homem da Revolução Cidadã, que hoje repudia sem ruborizar-se. 

Há quem diga que algo de razão poderia ter este Moreno da pátria de Olmedo. Talvez tenha acreditado em Correa até que chegou ao governo, e ali pode comprovar fatos incompatíveis com sua ética. Por isso mudou. Se assim fosse, o desenlace teria sido outro. Depois de “denunciar” o ex-presidente, teria corrigido seus erros e edificado uma versão mais legítima e coerente do movimento que o fez mandatário. Mas não procedeu assim. 

O presidente peruano com um novo Chanceler poderia – e deveria – ter tido uma atitude mais prudente e mais sensível em torno ao tema

Fotos Públicas
Martin Vizcarra

Simplesmente mudou de bando e nadou até a margem oposta, para ali desenhar um governo diferente ao que ele mesmo tinha proposto. Esticando a corda ao extremo, pactuou com o Fundo Monetário e com o Banco Mundial, comprometendo-se a restaurar em seu país o “modelo neoliberal”. 

Não era esse o seu compromisso eleitoral. Era o inverso. Ao decidir, então, seu “novo rumo”, Moreno não buscava fazer um governo melhor que o de Correa – corrigindo suas supostas “falhas” – mas recuar, retroceder a etapas já superadas na vida equatoriana e abrir caminho aos inimigos do povo. E estendeu as mãos a eles. 

Por qualquer lado que se olhe, então, Moreno é um “convertido”, um homem que traiu a si mesmo, e que traiu, ademais, o povo que o elegeu com a esperança de avançar com os ideais da Revolução Cidadã, à qual era devedor. Por isso hoje concita o massivo repúdio de sua população. Converteu-se, em pouco tempo, em um personagem pitoresco. 

Os que lhe deram os votos, cospem nele. E os que o recusaram nas urnas o adulam para que “não se sinta só”. Hoje, só ou “acompanhado” esse Moreno não podia estar pior. Seus amigos o abandonaram, e seus inimigos o rodearam. Como haverá de acabar? Mais rápido do que supunha, em primeiro lugar. E massivamente rechaçado pela população, que já o obrigou a abandonar seus prédios oficiais, em busca de um “lugar seguro”. Triste fim para sua pequena história. 

A luta do povo equatoriano, é heroica. Na ação, foram convocadas todas as forças. Ninguém se pôs a lutar reivindicando sua própria liderança. Todos somaram forças para alcançar a vitória. A Confederação Nacional de Nacionalidades Indígenas, a CONAIE, as centrais sindicais, os organismos estudantis, as entidades culturais, as organizações feministas, os coletivos sociais, os Partidos Políticos progressistas e revolucionários, todos marcaram encontro e lutam na rua para derrotar o Fundo Monetário Internacional e seu pacote neoliberal. Inclusive setores da Força Armada e da Polícia se somaram à causa. 

A Greve Nacional -que seguiu as gigantescas mobilizações sociais – é agora a arma de luta da população organizada. E se sente que em cidades e povoados as pessoas não querem voltar ao passado de instabilidade e desgoverno. Hoje se recorda, efetivamente, que nos primeiros tempos do século XXI o Equador teve 7 presidentes em só um ano e meio, até que chegou a Revolução Cidadã. Rafael Correa pôs ordem e seu Partido ganhou as eleições com Lenin Moreno, que agora voltou ao caos. A ele, já estão ardendo as barbas.

O Presidente Vizcarra, com um novo Chanceler poderia – e deveria – ter tido uma atitude mais prudente e mais sensível em torno ao tema. Afinal o Equador é um vizinho e se agora está convulsionado isso afetará, cedo ou tarde, a toda a região.

*Colaborador de Diálogos do Sul, desde Lima, Peru

**Tradução: Beatriz Cannabrava

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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