Os argentinos decidem neste domingo (27) o modelo de governo que desejam para os próximos quatro anos no país. O fracasso da gestão do presidente Maurício Macri (Pro) é creditada na conta do neoliberalismo, que transformou a Argentina numa vitrine do modelo para a América Latina. Há quatro anos, Macri era saudado como uma espécie de garoto-propaganda de um produto que faria o Estado eficiente como um empresa e traria estabilidade econômica para a região a partir de agenda ortodoxa e privatista.
De lá para cá, a Argentina acumulou três anos de crescimento negativo, perdeu 200 mil postos de trabalho com carteira assinada (10,6%), viu a quantidade de pobres chegar a 41 milhões de pessoas e a população abaixo da linha da pobreza atingir 28%. O país mergulhou numa recessão e reviu um filme que parecia já ter saído de cartaz: o socorro financeiro do Fundo Monetário Internacional, cujo empréstimo de 56 bilhões do dólares é o maior já realizado pelo FMI a um país no planeta.
Elineudo Meira (Chokito)
Argentina acumulou três anos de crescimento negativo, perdeu 200 mil postos de trabalho com carteira assinada (10,6%).
A insatisfação dos argentinos pôde ser sentida já em agosto de 2019, durante as chamadas Primárias, tratadas como prévias das eleições. Naquela consulta, o candidato de oposição Alberto Fernandez ficou 17 pontos à frente de Macri e, desde então, todas as pesquisas de intenção de voto apontam a vitória, no 1º turno, da Frente de Todos, que além do advogado e professor de Direito Alberto Fernandez na cabeça da chapa traz no cargo de vice a ex-presidenta Cristina Kirchner, principal herdeira do peronismo na Argentina.
A presença de Cristina é muito forte entre os argentinos. Pesquisa divulgada durante a semana apontou que para 45% da população é a ex-presidenta quem vai governar o país, caso Fernandez vença as eleições.
Fernandez é ex-chefe de gabinete dos governos de Néstor e Cristina Kirchner. Ele rompeu com a ex-presidenta durante o último mandato dela por divergências políticas, mas reatou a aliança em 2019 de olho na Casa Rosada. Questionado pela imprensa local se poderia romper novamente, Fernandez foi categórico ao afirmar que não romperia jamais com a líder peronista. Cotada para voltar à presidência até a véspera da inscrição das nominatas, Cristina tem alta rejeição em determinados setores da Argentina, especialmente da classe média, e abriu mão da cabeça da chapa para garantir a vitória.
No último ato público de campanha, em Mar del Plata, Cristina fez um discurso duro apontando que as eleições será, na verdade, um plebiscito contra o neoliberalismo no país:
– “Hoje em Mar del Plata não estamos encerrando uma campanha eleitoral. Estamos encerrando um ciclo histórico: nunca mais a pátria deve voltar a cair nas mãos do neoliberalismo. Nunca mais estas políticas”, disse a ex-presidenta.
Além de Alberto Fernandez e Maurício Macri, os candidatos mais competitivos da disputa são Roberto Lavagna, Nicolás del Caño e José Espert. Além de eleger o presidente e o vice-presidente, os argentinos escolherão 130 deputados nacionais, 24 senadores nacionais e 43 deputados do Parlamento do Mercosul. Em várias províncias e no distrito federal também se elegem, nesse mesmo dia, autoridades executivas e legislativas.
A agência Saiba Mais se integrou em Buenos Aires ao coletivo brasileiro ComunicaSul para cobrir as eleições da Argentina. O que se vê nas ruas é um povo apreensivo, mas esperançoso. A população vem sentindo na pele os efeitos da crise. Como a economia do país é dolarizada, qualquer variação na moeda norte-americana é um baque para o comércio. O Real varia entre 13 e 16 Pesos, dependendo da casa de câmbio. A inflação em 2019 deve ultrapassar os 50%, maior do que a soma das inflações de todos os países da América Latina, incluindo a Venezuela.
A vendedora ambulante Andreia Fernandez cita o desemprego para traduzir os quatro anos do governo Macri e tem esperança num país melhor:
– Estamos mal com o Macri, há muito desemprego, estamos esperando que assumam Cristina e Fernandez para que tudo isso se reverta. Nesses quatro anos ficou muita gente sem trabalho. No governo de Cristina tínhamos o que comer, hoje tem muito gente sem comida”, disse.