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“Que nossos opositores sejam conscientes das cinzas que deixaram", diz Alberto Fernández

O presidente eleito comprometeu-se a um contrato moral e ético com os argentinos para reconstruir tudo o que foi destruído nestes últimos quatro anos
Stella Calloni
La Jornada
Buenos Aires

Tradução:

“Vamos a tornar a construir a Argentina igualitária e solidária que todos queremos”, disse o presidente eleito Alberto Fernández na noite de domingo (27) diante de uma multidão desbordante que ocupava todas as ruas ao redor da sede da campanha da opositora Frente de Todos (FdT) e junto com a vice-presidenta eleita Cristina Fernández de Kirchner nas eleições gerais que foram realizadas este domingo, no marco de uma severa crise econômica, social e política, derrotando o oficialista Juntos por el Cambio, liderado pelo presidente Mauricio Macri, que tentava seu segundo mandato.

Apurados mais de 96% dos votos, o escrutínio oficial dava a Fernández 48,03% contra 40,44% de Macri.

Segundo a lei, para ser eleito presidente é necessário alcançar pelo menos 45% dos votos ou pelo menos 40 por cento e uma diferença de 10%, ou mais pontos percentuais com relação ao segundo candidato mais votado.

Em todo caso, Fernández subiu ligeiramente em relação às eleições primárias de agosto passado quando obteve 47,78%, enquanto Macri teve uma subida dos 32,30% conseguidos em agosto, de acordo com os resultados dados a conhecer esta noite. 

Macri reconheceu sua derrota mais de duas horas depois de divulgados os primeiros resultados oficiais e o triunfo de Fernández. Seu discurso foi um elogio para seus anos de governo, sem reconhecer nada e sustentando que deixava um país “muito mais sólido”. 

O presidente eleito pediu responsabilidade ao governo ante a situação do país. “Que nossos opositores sejam conscientes que nos deixaram, das cinzas que deixaram, e que se chegue a um diálogo que nunca tiveram conosco”, sustentou e agregou: “vamos fazer a Argentina que sonhamos, vamos entrar no mundo dignamente (…) com nossos melhores homens. Vamos fazer por todas e todos. O governo voltou para as mãos do povo”. 

Anunciou que na segunda-feira se reunirá com Macri, e “falaremos do tempo que resta e vamos colaborar em tudo; a única coisa que nos preocupa é que os argentinos deixem de sofrer e colocar o país em pé”, ao recordar que como chefe de gabinete do falecido ex-presidente Néstor Kirchner assumiram um país caótico, depois da crise de 2001, e “o pusemos em pé”.

Comprometeu-se a um contrato moral e ético com os argentinos para reconstruir tudo o que foi destruído nestes últimos quatro anos e rendeu uma comovedora homenagem a Kirchner de cujo falecimento se cumpriu nove anos este domingo.

O presidente eleito comprometeu-se a um contrato moral e ético com os argentinos para reconstruir tudo o que foi destruído nestes últimos quatro anos

Twitter / Reprodução
Fernández comprometeu-se com argentinos para reconstruir o que foi destruído por Macri

Outro momento emotivo foi o aparecimento de Cristina Fernández de Kirchner, que agradeceu o apoio dado pelo povo, em nome de seus filhos Máximo e Florencia e destacou a presença das Mães e Avós da Praça de Maio, tão atacadas durante os últimos tempos, em uma mensagem evidente para recuperar a política de direitos humanos, esquecida pela atual administração. 

A ex-presidenta e agora vice eleita voltou a recordar sua frase – “neoliberalismo nunca mais” – e felicitou o presidente Evo Morales, da Bolívia por seu triunfo, solidarizando-se ademais com os povos do Equador e do Chile ante os conhecidos acontecimentos em ambos os países.

Em seu discurso, o eleito governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof, referiu-se a grave emergência que vive essa província, uma das mais afetadas pelas políticas impostas pela aliança oficialista Cambiemos, pelo desemprego, pobreza,  indigência e o maior endividamento da história deste “arrasado” país ao que todos estão dispostos a “pôr em pé”, ante uma multidão delirante que havia recuperado uma esperançada alegria e a manifestava nas ruas da cidade, não apenas diante da sede da campanha do FdT no popular bairro da Chacarita.

Na província de Buenos Aires se registrava um triunfo histórico da fórmula do FdT, Axel Kicillof-Verónica Magario com mais de 52 por cento sobre a governadora oficialista María Eugenia Vidal com 32 por cento, que já reconheceu sua derrota. 

Na capital Buenos Aires, bastião da direita, triunfou o atual chefe de governo Horácio Rodríguez Larreta por 18 pontos sobre o jovem candidato do FdT, Matías Lammens, que em sua primeira incursão política alcançou 36 pontos. 

A manobra oficialista foi carregar para o primeiro anúncio os votos dos três lugares onde ganhavam seus candidatos. Apesar das falhas e irregularidades, do clima de dúvidas e incerteza pelas mudanças de último momento introduzidas pelo governo de Cambiemos para a contagem de votos, as pessoas saíram às ruas desde às 18h30 para festejar e marcharam de diferentes pontos da cidade convergindo para a sede da campanha do FdT.

“Triunfou a esperança, triunfou a vida contra o neoliberalismo”, foi uma das consignas escutadas entre a multidão, depois de um ressonante “Tchau Macri” ou aquelas frases que foram sendo cunhadas ao longo das manifestações de protesto de diversos setores contra a política do governo de Macri, mas também contra o Fundo Monetário Internacional. 

Precisamente Kicillof em seu discurso reconheceu que se chegou a este triunfo graças à mobilização que nunca deixa de estar nas ruas, às marchas que inclusive em alguns momentos obrigaram o presidente Macri a modificar um decreto ou retroceder em alguma medida antipopular. 

Esta noite o Banco Central da República, em uma reunião de urgência anunciou várias medidas, a primeira estabelecendo um limite para a compra de dólares, que agora passou a só 200 por mês, o que aprofunda o teto imposto de dez mil dólares. 

Estes anúncios não impactaram os festejos que cresciam inclusive nas últimas horas da noite. A multidão tomou também a frase de Alberto Fernández pedindo que a unidade conseguida agora entre o peronismo e seus aliados não se rompesse mais, para que o país não fique indefeso diante dos interesses externos. 

Também houve apelos à solidariedade dos países da América Latina, que se manifestaram contra o neoliberalismo, homenagens para os mortos, feridos e desaparecidos no Chile, país fronteiriço com a Argentina cuja população continua nas ruas em uma histórica rebelião depois de 30 anos suportando o que chamam de “ditadura neoliberal”.

“É a mesma luta, alguns puderam conseguir com votos, e uma presença constante nas ruas em todos estes anos e outros com uma verdadeira insurreição nunca vista e ao custo de vidas irmãs”, foi a reflexão e o envio de abraço solidário de um grupo da juventude sindical.

*Stella Calloni, Correspondente – La Jornada, Buenos Aires.

**Tradução: Beatriz Cannabrava

***La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Stella Calloni Atuou como correspondente de guerra em países da América Central e África do Norte. Já entrevistou diferentes chefes de Estado, como Fidel Castro, Hugo Chávez, Evo Morales, Luiz Inácio Lula da Silva, Rafael Correa, Daniel Ortega, Salvador Allende, etc.

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