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Chile: Manifestações se intensificam e governo responde com ainda mais violência

A jornada de protesto pôs de manifesto uma vez mais a incapacidade do governo para recuperar a iniciativa política e restabelecer a normalidade
Aldo Anfossi
La Jornada
Santiago

Tradução:

A mobilização social recrudesceu em boa parte das cidades do Chile, com os estudantes universitários e secundaristas manifestando-se, aos milhares, ao longo do país, ao mesmo tempo que os transportistas — caminhoneiros, taxistas e outros — bloquearam as estradas urbanas da capital e de outras cidades, exigindo a revogação dos pedágios diferenciados por trechos e horários que são cobrados pelas concessionárias privadas.

A jornada de protesto pôs de manifesto uma vez mais a incapacidade do governo para recuperar a iniciativa política e restabelecer a normalidade e a ordem, apesar de o presidente Sebastián Piñera ter tentando ganhar protagonismo, após dias de ausência pública, mediante a promoção de sua denominada agenda social, um conjunto de medidas paliativas que unanimemente a oposição, e também algumas vozes do oficialismo, reconhece como insuficiente para conter os protestos. 

A expressão do fracasso do governo foi a entrada da polícia a uma escola de meninas, efetuando disparos de escopeta que deixaram duas menores de idade com impactos de chumbinho nas pernas e cenas de violência que foram gravadas. A Promotoria ordenou a detenção do major a cargo do pelotão e se informou que 12 carabineiros serão acusados de delitos de tortura e abusos sexuais durante os protestos. 

O presidente concretizou o envio ao Parlamento de um projeto de lei para aumentar em 16% os salário mínimo que passaria de $301.000 (US$420) a 350.000 (US$490). Descontadas as cotas de previdência e de saúde, o salário mínimo ficaria em $290.000 (US$ 400, aproximadamente). “Insuficiente”, disseram de imediato o mundo sindical e a oposição que reclamam que seja fixado em torno de $500.000 (US$700).

A jornada de protesto pôs de manifesto uma vez mais a incapacidade do governo para recuperar a iniciativa política e restabelecer a normalidade

Agência Brasil
Multidões ocupam as ruas de várias cidade do Chile

Manifestações em toda parte

Em cidades como Iquique, Antofagasta, Chillán, Curicó, Viña del Mar, Quilpué, Temuco, Punta Arenas e, evidentemente, Santiago os estudantes saíram às ruas manifestando-se, bloqueando ruas, levantando barricadas e enfrentando-se incessantemente aos Carabineiros (polícia). 

Na capital, a polícia havia impedido que o setor das praças Itália e Baquedano -onde confluem as avenidas Alameda, Providencia e Vicuña Mackenna-, ponto nevrálgico os protestos, fosse ocupado pelos manifestantes como ocorreu nas últimas semanas, e apenas observava que começavam a reunir-se agia para espantá-los. Pois bem, os estudantes mudaram o cenário e se transferiram para as comunas de Providencia e Las Condes, das mais ricas do país, e em suas ruas encenaram o descontentamento: dezenas de pontos comerciais foram vandalizados e saqueados, o mobiliário dos estabelecimentos e as placas públicas foram arrancadas e utilizadas para formar barricadas e como combustível para acender fogueiras. A intensidade dos enfrentamentos e o ar contaminado pelo lançamento contínuo de bombas lacrimogêneas, forçou o fechamento de várias importantes estações do metrô, causando aborrecimento e caos entre as pessoas que tentavam usar transporte. A sede da ultradireitista Unión Democrata Independiente (UDI), localizada na rua Suécia, foi atacada e sofreu múltiplos destroços em suas vitrinas e mobiliário. 

Enquanto tudo isso ocorria na zona oriente da capital – o chamado “bairro alto” em referência ao seu poderio econômico – forçando a polícia a se deslocar para lá, outros manifestantes se reagruparam na Praça Itália e a recuperaram para a sua causa.   

Às 20 horas o metrô de Santiago encerrou as operações e paulatinamente desapareceu todo o transporte público em ônibus. 

Enquanto tudo isto sucedia, um caos automobilístico produziu-se nas autopistas urbanas e de acesso a Santiago, com centenas de caminhoneiros circulando a “passo de tartaruga” ou simplesmente parados. Também nessas estradas houve bloqueios com barricadas. 

As concessionárias privadas de autopistas que, em 20 anos de operação aumentaram, em termos reais, em mais de 40% as tarifas de pedágio, se tornaram um alvo predileto das mobilizações, junto com as administradoras de fundos de previdência, o símbolo da apropriação da poupança previdenciária dos chilenos para colocá-lo a serviço dos grandes grupos econômicos, e do fracasso do sistema de poupança individual que, em boa medida encarnam aos olhos dos chilenos mobilizados a expressão do abuso e do mercantilismo do modelo econômico.

*Aldo Anfossi, especial para La Jornada desde Santiago do Chile

**Tradução: Beatriz Cannabrava

***La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Aldo Anfossi

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