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Bolívia: OEA não está a serviço dos povos latino-americanos, mas sim dos Estados Unidos

Odalys Troya Flores
Prensa Latina
Havana

Tradução:

O golpe de Estado na Bolívia contra o governo legítimo de Evo Morales, concretizado em 10 de novembro último com sua obrigada renúncia, foi um acontecimento que pôs em risco a estabilidade desse país e da América Latina em 2019. 

De acordo com pesquisas, o golpe foi orquestrado e financiado pelos Estados Unidos com pagamento a militares e policiais que exigiram a renúncia do governante em um cenário desenhado para fazer ver uma suposta fraude eleitoral. 

O próprio Evo Morales, que teve que asilar-se no México e depois na Argentina, assinalou a Organização de Estados Americanos (OEA), o governo estadunidense e sua embaixada em La Paz, e setores reacionários da direita boliviana como condutores do golpe. 

“A OEA não está a serviço dos povos latino-americanos e menos ainda dos movimento sociais, está a serviço do império norte-americano”, disse Morales em sua primeiro entrevista coletiva ao chegar ao México. 

O líder indígena detalhou em uma entrevista ao diário La Jornada que a embaixada dos Estados Unidos urdiu o golpe e provocou o derramamento de sangue. 

Tudo começou com as discussões para modificar a constituição para uma nova reeleição com o que ele não estava de acordo. Depois começou uma guerra suja com base na mentira e a encabeçou a embaixada dos Estados Unidos, assegurou Evo. 

Nesse encadeamento de fatos, diversas fontes asseguram que o general Williams Kaliman, que pressionou o líder indígena a renunciar foi remunerado pelos Estados Unidos com um milhão de dólares. 

Kaliman recebeu esse montante das mãos de Bruce Williamson, encarregado de negócios da embaixada estadunidense, enquanto outros generais receberam a mesma quantia e vários chefes de polícia foram pagos com 500 mil dólares cada um. 

Após a proclamação de Jeanine Añez Chávez como presidenta interina, Kaliman, que havia assumido o cargo de chefe das Forças Armadas da Bolívia e, 24 de dezembro de 2018 foi imediatamente substituído.

OEA
Após mais de 44 dias dessa jornada crucial, a OEA apresentou o informe final da auditoria no qual não é possível encontrar certezas

Descrição adiantada do golpe

No passado 20 de outubro aconteceram as eleições na Bolívia, e o que parecia uma festa cívica desembocou em um golpe de Estado contra o governo de Evo Morales.

Desde muito antes, a direita conhecedora de sua nova derrota nas urnas, em cumplicidade com os Estados Unidos, vinha preparando o golpe, o que corrobora uma denúncia do portal Nicarágua Rebelde que foi uma descrição do acontecido.
Esse meio, antes das eleições alertava que se Evo Morales ganhasse as eleições de 20 de outubro um governo de transição cívico-militar ocuparia seu lugar.

“Este novo governo não reconheceria a vitória eleitoral de Evo e alegaria fraude durante as eleições”, descreveu a publicação digital. 

Nicarágua Rebelde formulou a denúncia sob o seguinte título: “Embaixada dos EUA em La paz continua sua ação encoberta na Bolívia para apoiar o Golpe de Estado contra o presidente Evo Morales”.

Para justificar a instauração de um governo paralelo no poder, a oposição necessitava criar um clima de instabilidade no país. 

Com essa finalidade as forças opositoras através dos comitês cívicos e em aliança com a denominada Coordenadoria Nacional Militar esteve preparando uma tropa de choque de jovens para executar ações violentas principalmente nas cidades de Santa Cruz e La Paz.

Segundo o portal, estes grupos se insertariam nos protestos convocados com a ordem de provocar confrontos violentos com a polícia, como aconteceu em Santa Cruz durante o fechamento da campanha do então partido oficialista Movimento ao Socialismo (MAS).

Simultaneamente, explicava a fonte, ocorreria um levantamento castrense, com ações organizadas pela Coordenadoria Nacional Militar com o apoio da União de Militares Retirados de Santa Cruz.

Esta última cidade seria a sede do denominado governo de transição para consolidar os planos opositores de dividir o país em duas frentes: Ocidente e Oriente, o que geraria um caos e até uma possível guerra civil, explicou Nicarágua Rebelde. 

Ao se referir aos preparativos desta operação, o portal assinalou que desde Miami partiram para o porto chileno de Iquique, próximo à Bolívia, embarcações com armas e munições dentro de contêineres, cuja carga foi declarada como “miscelânea”.

Pessoas não vinculadas à oposição foram recrutadas e contratadas com o único propósito de aportar seus nomes e retirar os contêineres do porto. 

Nicarágua Rebelde precisou que o cidadão boliviano Juan Carlos Rivero estava encarregado de comprar as armas nos Estados Unidos e fazê-las chegar à Coordenadoria Nacional Militar na Bolívia. 

Rivero está vinculado diretamente ao político Manfred Reyes, também radicado nos Estados Unidos e vinculado à embaixada de Washington em La Paz, e reapareceu ao público boliviano, quando na última semana da campanha eleitoral publicou nas redes sociais uma mensagem de apoio ao candidato da Comunidade Cidadã, Carlos Mesa.

O texto indicou que a embaixada estadunidense seguiu permanentemente a entrega de armas e munições através de colaboradores secretos, e com esse objetivo se reuniram de maneira clandestina com figuras de oposição boliviana.

A fraude não demonstrada

Conhecedora de sua derrota, a direita com seus aliados internacionais buscou fomentar a ideia de uma fraude para justificar o motim policial, os protestos dos comitês cívicos e finalmente dar o golpe. 

No entanto, até hoje ninguém demonstrou a existência de fraude nas eleições de 20 de outubro em que resultou reeleito Evo Morales.

Após mais de 44 dias dessa jornada crucial, a OEA apresentou o informe final da auditoria às eleições no qual não é possível encontrar certezas de fraude. 

No texto, o organismo reconhece que Evo Morales ganhou em primeiro turno, mas assegura que é “estatisticamente improvável” que tenha sido por um diferença de 10%. 

No vilipendiado documento, se alude em 75% de seu corpo à Transmissão de Resultados Eleitorais Preliminares (sem validade legal).

“O ministério das colônias publicou tardiamente um informe sem rigor, com falhas graves de métodos, generoso em percepções pessoais e políticas cuja única pretensão é aumentar a má literatura para a justificativa do Golpe na Bolívia que derivou em uma ditadura fascista”, escreveu a internauta Larissa Costas no Twitter.

A OEA achou irregularidades em 3471 votos em 226 mesas, mas se esses votos fossem anulados a diferença do MAS continuaria sendo maior que 10%, observou. 

No informe não figura a palavra fraude, ao mesmo tempo que a OEA assinala que não se pode contrastar a informação consignada com as atas de escrutínio e cômputo, por a queima de atas no contexto dos protestos. 

Denunciaram fraude queimando as ‘provas’ que podiam comprová-la, escreveu no Twitter, Bruno Sgarzini.

Uma centena de especialistas internacionais em economia e estatística apelaram à OEA que retirasse suas “declarações enganosas” sobre o processo eleitoral na Bolívia que propiciou o golpe de Estado contra o presidente constitucional Evo Morales.

Golpes de Estado na América Latina, EUA com a batuta

Há décadas, os Estados Unidos tem desempenhado um papel preponderante em dezenas de golpes de Estado, em particular na América Latina. Bolívia que ao longo do século XX encabeçou a lista, com mais de 160 levantamentos militares, soma-se outra vez à lista. 

A renúncia forçada de Evo Morales à presidência da Bolívia, “sugerida” pelas Forças Armadas, foi aplaudida pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

O mandatário estadunidense considerou como um “momento significativo” o fato e felicitou o povo “por exigir liberdade” e os militares bolivianos “por cumprir com seu juramento não só a uma pessoa, mas à Constituição da Bolívia”. 

Trata-se de um golpe a mais na história contemporânea da América Latina. A partir de 1940, em todas as décadas seguintes os golpes de Estado foram recorrentes, e de maneira geral tiveram como ponto em comum a mão assessora dos Estados Unidos.

Nos últimos anos foram aplicados contra a Venezuela, sob a presidência Hugo Chávez (1999-2013) e agora de Nicolás Maduro.

As formas para derrocar governos parecem não terminar: golpes militares, golpes suaves, bloqueios, sanções, paralisação petroleira, autoproclamação de um “presidente encarregado”.

São apenas algumas vias para destruir os processos sociais cujo objetivo principal seja transformar um sistema econômico onde a desigual distribuição das riquezas produza cada vez mais pobres. 

Inúmeras variantes tem sido utilizada pelo oposição mais reacionária em clara cumplicidade com os Estados Unidos e vários países da região para pôr fim à chamada Revolução Bolivariana.

Venezuela (1948), Paraguai e Guatemala (1954), República Dominicana (1963), Brasil (1964), Argentina (1966 y 1976), Bolívia (1971), Uruguai e Chile (1973), El Salvador (1979), Panamá (1989), Peru (1992), Haiti (2004) e Honduras (2009) dão fé da história golpista.

O julgamento político contra Fernando Lugo em 2012, e um processo também judicial Dilma Rousseff em 2016, de igual modo se inscrevem nessa trama. 

De acordo com Marcelo Colussi, escritor e cientista político de origem argentina radicado na Guatemala, na América Latina o verdadeira poder dominante final, o que tem a última palavras, é a classe dirigente dos Estados Unidos, que faz da região seu reservatório de matérias primas, mercado cativo e fornecedor de mão de obra barata. 

Assegura que por isso há acantonadas 74 bases militares de Washington na região que defendem milimetricamente o que considera seu natural quintal: “América para os americanos” (do Norte), segundo a tristemente célebre Doutrina Monroe.
Recorda em um artigo que a “maior instalação (Base Marechal Estigarribia) se encontra na Tríplice fronteira argentino-brasileira-paraguaia,  “custodiando” o Aquífero Guarani, uma das reservas de água doce subterrâneas maiores do mundo.

Acrescenta que a maior base está em construção nestes momentos, em Honduras, para “salvaguardar” as reservas petrolíferas do Venezuela”.

Colussi agrega que na Bolívia acaba de consumar-se um golpe que nucleia várias modalidades e adverte que as valiosas reservas de lítio (75% das reservas mundiais e futuro possível substituto do petróleo) assim como outros recursos naturais como gás, minerais estratégicos e terras raras esperam por ávidas corporações multinacionais, que não podiam entrar pelo presença do governo socialista de Evo Morales e do MAS.

*Chefa da Redação Centro-americana e do Caribe e coordenadora da redação da América do Sul de Prensa Latina

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Odalys Troya Flores

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