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Peru: Vizcarra dá as costas aos trabalhadores ao apoiar empresários durante quarentena

São eles que geram a riqueza, a produção, o bem estar social e a própria vida. Sem os trabalhadores, nada é possível; com os trabalhadores é possível tudo
Gustavo Espinoza M.
Diálogos do Sul
Lima

Tradução:

No Peru, ao impor o Decreto de Urgência 038-2020, o governo do Presidente Martín Vizcarra optou por um caminho equivocado. Objetivamente, deu de costas a milhares de trabalhadores e apertou a mão dos empresários e dos dirigentes de sua organização representativa, a Confederación Nacional de Instituciones Empresariales Privadas (CONFIEP).

É bem sabido que em um cenário de crise, quando está em perigo o equilíbrio social, e assomam colapsos na vida dos povos, as autoridades máximas de um Estado têm um dever indispensável; preservar as forças produtivas que assegurem a sobrevivência.

Neste contexto, um problema enraizado, muitos governantes insistem em não percebem um fato inequívoco: a principal força produtiva em qualquer país são os trabalhadores. São eles que geram a riqueza, a produção, a própria vida. Sem os trabalhadores, nada é possível; com os trabalhadores é possível tudo.

Ocorre, entretanto, que enebriados pelo efêmero poder da classe dominante, alguns governantes acreditam que os trabalhadores são algo assim como “uma força agregada”, e que a força principal por detentores do capital é dos empresários. E é Isso o que é preciso preservar! parecem dizer, sem se dar conta que o capital acaba, ou se multiplica, não por suas próprias leis, mas sim pela força dos trabalhadores. 

São eles que geram a riqueza, a produção, o bem estar social e a própria vida. Sem os trabalhadores, nada é possível; com os trabalhadores é possível tudo

Agência Brasil
Governantes insistem em não percebem um fato inequívoco: a principal força produtiva em qualquer país são os trabalhadores.

No Peru ou qualquer outro país, somos todos humanos

O Peru vive uma crise sanitária extraordinária. Uma crise também internacional porquanto se estendeu a numerosos países e cobrou vidas humanas em distintos confins do planeta. Mais de três milhões de pessoas estão infectadas e mais de 200 mil pereceram. Esta crise nos tem oferecido diversas lições. A mais importante delas é que os bens materiais nada valem em comparação com o que é fundamental: a própria vida.

Uma pessoa pode ter tanto dinheiro que nem consegue gastá-lo; escritório de luxo, que já não pode usar; roupa de moda que já não pode exibir; lindos adornos que ninguém pode ver. A quarentena o devolveu à sua real dimensão: é simplesmente um ser humano desprovido de bens, de riqueza e de poder.

O que necessita, então? Alimento, saúde, educação e repouso. E deve esperar que passe esta crise para ser outra vez um trabalhador. Sobreviveu com o aporte de milhões, e viverá com ele mais adiante.

Trump não se dá conta disso. Por isso corta o orçamento da Organização Mundial da Saúde, e incrementa o da OTAN. Para ele, a guerra. Para os povos, a paz. 

Desequilíbrio percentual

90% da população peruana está composta por trabalhadores do campo e das cidades. Uns semeiam à terra e fazem a colheita. Outros trabalham nas fábricas, nas empresas, nos escritórios, nas lojas.

Muitos outros. apenas “se viram” – uma situação justamente criada pelos efeitos da crise do sistema vigente – obrigados a criar sua própria fonte de trabalho: se fizeram motoristas de aplicativos ou ambulantes. Mas nunca deixaram de ser trabalhadores. Em outras palavras, nunca perderam sua essência. Hoje, estão chamados a mudar o país. 

É verdade que o Decreto de Urgência 038 não “afeta a todos” em termos reais. Diversos segmentos ficarão de fora de seus efeitos. E é verdade que proclama sua vontade de ser um dispositivo “transitório” – alude a 90 dias -. Mas nem um destes dois aspectos o justifica. Objetivamente reflete apenas uma vontade: posto na disjuntiva de amparar os empresários ou os trabalhadores, o governo optou por dar a mão aos “pescoçudos” como os definira lucidamente Isidoro Gamarra. Cobrar os impostos que as grandes empresas devem, e tributar os mais ricos, seria o indicado.

Vizcarra apenas imita Fujimori

Para os empresários 30 bilhões de soles. Para os outros – os trabalhadores – a “suspensão perfeita” de salários, de seu emprego e de seus direitos mais elementares. Esta “suspensão perfeita”, não é uma invenção recente. Foi formulada por Alberto Fujimori através do Decreto 003-97, em seu artigo 15, quando pela primeira vez, se falou da “suspensão temporária perfeita” como uma maneira de demitir dezenas de milhares de operários e empregados em nosso martirizado país. Algumas pessoas que hoje gritam contra o 038-2020 se calaram daquela vez quando o “chinesinho da mandioca” veio “pôr ordem” no mundo do trabalho. 

Para os empresários, hoje há várias alternativas: “Reativa Peru”, o pagamento de 35% da folha de pagamento, a postergação do pagamento de impostos; e agora, a “suspensão perfeita”. Para os trabalhadores, o fim da quarentena, a fome, e a vontade de chutar latas. 

Esta crise nos apresentou um desafio: precisamos mudar esta realidade e construir um país com progresso e desenvolvimento. Acabar com este Estado velho, dependente e submetido. E forjar uma Pátria verdadeira na qual os trabalhadores sejam não apenas a coluna vertebral, mas também a força dirigente. Esse é o dever que nos convoca. 

Gustavo Espinoza M*,  colaborador de Diálogos do Sul de Lima, Peru. 

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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