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Após Fernandez anunciar projeto de Reforma Judicial, Macri faz viagem suspeita à Suíça

A viagem tem sido considerada por alguns, como um suicídio político; ou um abandono da política
Helena Iono
Buenos Aires

Tradução:

Pairam no ar da Argentina suspeitas sobre a repentina viagem de “férias” de Macri à Suíça, via Paris, no dia seguinte ao anúncio oficial do Projeto de Reforma Judicial de Alberto Fernandez e seu governo. 

O grande escândalo é que tal ato questionado como individualista e irresponsável frente ao país no seu momento mais trágico de Pandemia, surte um alto custo político para sua imagem, ressoa como uma tentativa de fuga ao exterior.  

Algo considerado por alguns, da própria área de “Cambiemos”, como um suicídio político; ou um abandono da política, do empresário que enganou, vendeu o país, deixou terra arrasada e agora, ancora-se no pretexto de dirigente da FIFA (na Suíça), tendo já auto garantido fortunas pessoais nos paraísos fiscais que, justiça funcionando, deveriam ser repatriadas aos cofres do Estado e aos trabalhadores argentinos.

A viagem tem sido considerada por alguns, como um suicídio político; ou um abandono da política

Reprodução: Flickr
Todos têm perguntado os reais motivos por trás da viagem de Mauricio Macri a Suíça

O fato é que a situação de Macri se complicou enormemente nas últimas semanas como figura central implicada em várias causas judiciais. Uma delas, a de ser mandante da rede de espiões ilegais, apoiados em fundos reservados e secretos da AFI (Agencia Federal de Inteligência) para perseguir opositores, sobretudo a ex-presidenta Cristina Kirchner; tudo com a cumplicidade de jornalistas da mídia hegemônica. 

A outra, no envolvimento na chamada Causa dos Pedágios das Autopistas do Sol, na qual acabam de processar seu ex-ministro do Transporte, Guillermo Dietrich, por administração fraudulenta a favor de concessionárias (sem licitação devida) recargando no pagamento astronômico de pedágios da cidadania durante o governo Macri. 

E mais outra, onde Macri aparece como executor das ordens judiciais para a prisão dos empresários da Indalo, proprietários do Canal de TV C5N, Fabian de Sousa e Cristobal López. 

E outra mais, de usar o seu cargo presidencial para remissão da dívida de sua empresa familiar Socma com o Correio Argentino. Isso, sem contar a participação no esquema da criação da farsa judicial-midiática, do lawfare dos tais dos “Cadernos” (da Lava Jato argentina) inventados pelo processado e pseudo-advogado D’Alessio e do procurador Stornelli (que se nega a depor), com o fim de perseguir e encarcerar lideranças e empresários afins ao governo peronista-kirchnerista. 

Macri e Vicentin

Mas, a mais contundente revelação devido à qual se suspeita que Macri decidiu tomar o avião para a Suíça, é a de poucos dias atrás: no programa Minuto Uno do jornalista Gustavo Silvestre, da TV C5N, revelou-se como através dos chats no celular de Dario Neto, ex-secretário de Macri, acusado de espionagem ilegal, evidenciam-se ordens de Macri, evitando controles legais, em fins de novembro, quando já derrotado eleitoralmente e antes de deixar a presidência, para que o Banco La Nación concedesse um empréstimo gigantesco à empresa agro-exportadora Vicentin, já falida; portanto, um roubo, sem chances de retorno ao Estado. Leia detalhes no artigo de Raul Delatorre no Página12 e veja o video do ElDestape. “Apesar de que a empresa Vicentin já havia deixado de pagar empréstimos ao Banco La Nación, foram outorgados empréstimos de US$ 61 milhões em novembro de 2019 , entre as eleições presidenciais e outros US$ 43, 9 milhões antes de que se iniciara dezembro.”

A viagem suspeitosa de Macri acionou imediatamente a Justiça a ocupar as dependências da empresa Vicentin e sequestrar ontem todos os livros contáveis. Portanto, tudo indica que se reconstruirão conexões societárias, fraudes do Banco La Nación, sob a presidência do ex-diretor macrista, González Fraga, incluindo o percurso da venda de parte da empresa rumo ao Paraguai. Chamou muito a atenção, a coincidência da outra viagem de Macri, há 15 dias atrás, ao Paraguai, em avião privado, rompendo ordens da quarentena, para encontrar-se com o ex-presidente Horacio Cartes, acusado de chefe de um cartel mafioso-contrabandista. A viagem de Macri ao Paraguai se deu, logo após a declaração de intervenção do governo de Alberto Fernandez na Vicentin. É notável o exemplo que dá Macri, o instigador do ódio, dos minoritários manifestantes anti-quarentena, pró-liberdade e propriedade privada, agitando-se com violência no Obelisco de Buenos Aires, e nos panelaços “anti-infectadura” das varandas ricas do país, podendo dar-se ao luxo de violar as normas indo a Paris, e abandonando com covardia seu ex-secretário Daniel Negri à Justiça.

Projeto de Reforma Judicial

Nesse contexto, ontem foi apresentado por Alberto Fernandez na Casa Rosada junto à sua Ministra da Justiça, Marcela Losardo, o prometido Projeto de Reforma Judicial desde o seu discurso de posse presidencial onde havia dito: “Nunca mais aos porões da democracia” e,  agora, abre finalmente um processo para impedir a judicialização da política, e garantir o funcionamento de uma Justiça que não sirva ao lawfare golpista dos poderes concentrados da economia e das finanças internacionais.  “É hora de ter uma justiça verdadeira que esteja atenta a respeitar e fazer respeitar as regras do Estado de Direito. Uma justiça sobre a que não influam os poderes da mídia, os poderes fáticos e os poderes políticos. Se alcançarmos isso, teremos fortalecido esta democracia que tantas dívidas tem com os argentinos e as argentinas”.

Algumas das novidades operacionais são a desconcentrarão do poder atual em manos de um número reduzido de magistrados o que tem favorecido a manipulação dos tribunais em função do poder político. Cria-se um novo Fórum Federal Penal, unificando-se as 12 Varas Criminais com as 11 de Penal Econômico; amplia-se o número total de tribunais de 23 para 46. O Projeto ainda não se refere ao número de ministros da Corte Suprema (seria o STF) constituída hoje somente de 5 juízes. A coligação macrista de PRO-Cambiemos se ausenta, boicota e se opõe ao anúncio do projeto da Reforma Judicial, já instigando outros panelaços contra mudanças na Corte Suprema que sequer foram anunciadas. Apesar de que, magistrados progressistas deverão colocá-las brevemente em pauta. A Corte Suprema atual conta com juízes como Lorenzetti, o da famosa foto junto a Moro e Bonadio, os dois juízes agentes do lawfare brasileiro e argentino respectivamente. E conta com dois outros juízes colocados por decreto de Macri, sem haver consultado o Congresso, logo que assumiu a presidência. Tudo isso, não condiz com a nova Reforma Judicial. A ampliação do número e os novos critérios de eleição, de independência do poder Executivo, são os mais alinhados com a verdadeira democracia proposta por Alberto Fernandez e Cristina Kirchner no governo de Frente de Todos. O Projeto contará com a assessoria de um Conselho de Notáveis, composto de juristas, e será submetido à aprovação do Congresso.

Leia detalhes da Reforma Judicial.  Ela é um passo fundamental, mas há muito chão para chegar à justiça verdadeira. Por isso, ao mesmo tempo que ela foi anunciada, Cristina Kirchner se encontra com produtores do campo dos quais depende boa parte da economia e do abastecimento. Alberto Fernández se reúne com Horacio Larreta (Cambiemos), o prefeito da capital, e Axel Kicillof (Frente de Todos), o governador de Buenos Aires para resolver o problema emergencial da vida e da economia popular diante da constância da Pandemia. A urgência e concomitância da Reforma Judicial, aparentemente desligada da preocupação social frente à guerra pandêmica, corre em paralelo para assegurar que o lawfare, que é jurídico e midiático, econômico e internacional, não volte nunca mais; nem seja a maior causa da devastação e do endividamento do país, complicando os recursos sanitários e monetários do Estado, necessários para os bônus de emergência à salvação da população pobre, aos comerciantes e pequenas indústrias; a ajuda econômica do Estado, confirmada durante a pandemia,  tem sido enorme e prioritária.

Última notícia sobre a empresa Vicentin

No galope dos acontecimentos velozes, ao finalizar este artigo, o governo argentino acaba de assinar o decreto que revoga a intervenção da Vicentin.  Há indícios de que o atual diretório da empresa, com apoio do juiz interventor, está armando o esvaziamento dos seus ativos e passivos, no âmbito da intervenção, para comprometer e deixar o podre ao Estado. Vejam os twitters recentes de Alberto Fernández : “Dei instruções a todos os organismos públicos envolvidos para que realizem ações civis, comerciais e penais que permitam a recuperação dos créditos reclamados no concurso preventivo, definir responsabilidades e preservar os interesses do Estado.” “O juiz interventor no concurso não tem permitido, até o momento, que o Estado possa conhecer qual é o passivo real da companhia. Ele tem impedido também o acesso da intervenção à sua gestão e, o que é pior ainda, tem mantido suas funções aos mesmos diretores que, diante da passividade do tribunal, continua sem entregar o Balanço e a Memória do exercício 2019”. “Nestas condições, não estamos dispostos a adotar riscos que poderiam trazer como consequência a estatização da dívida privada para que os argentinos e as argentinas devam encarregar-se do procedimento irresponsável dos atuais administradores.” “Pedimos a revogação do DNU 522/2020 que ordenou a intervenção da Vicentin S.A.O.C por 60 dias”. “A intervenção por 60 dias era fundamental antes de declarar a Vicentin S.A.I.C como um bem de utilidade pública, para conhecer seu verdadeiro estado patrimonial.” “Nossa intenção sempre foi resgatar a empresa, preservar seus ativos, colaborar com os produtores danificados e manter as fontes de trabalho” “Mas, a nossa obrigação é que se investiguem as manobras que provocaram o estado de falência na qual caiu a empresa.”

A dinâmica dos últimos acontecimentos, de exacerbação de conflitos de interesses de classes, reclama uma Justiça íntegra e verdadeira que tenha a ver com o bloqueio da fuga de capitais, a garantia do imposto às grandes fortunas, expropriações sem calotes ao Estado, e o reforço das instituições públicas, sem o quê não há justiça, nem democracia, nem vida.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Helena Iono Jornalista e produtora de TV, correspondente em Buenos Aires

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