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México: Senado deve iniciar processo para plebiscito sobre julgamento de 5 ex-presidentes

A Suprema Corte avalizou a consulta popular para decidir se ex-governantes serão julgados por crimes cometidos durante e após suas gestões, algo inédito no país
Luis Manuel Arce Isaac
Prensa Latina
Cidade do México

Tradução:

A Suprema Corte de Justiça do México avalizou a solicitação do Presidente Andrés Manuel López Obrador de consulta popular para decidir se cinco ex-governantes anteriores ao seu mandato serão julgados, algo inédito no país. 

Trata-se daqueles que governaram o país de 1988 a 2018, período neoliberal, durante o qual a corrupção cresceu como espuma e grande parte do patrimônio nacional foi entregue ao setor privado com prejuízo para o Estado, segundo o demandante.

Apesar de que por maioria de 6 a 5 a Corte considerou constitucional a consulta popular e portanto possível de ser realizada, a votação foi condicionada a uma modificação da pergunta da matéria de indagação formulada por López Obrador, a qual marcava o sentido da petição. 

A pergunta era clara e precisa: “Está de acordo ou não com que as autoridades competentes, com apego às leis e procedimentos aplicáveis, investiguem e se for o caso sancionem a presumida comissão de delitos por parte dos ex-presidentes Carlos Salinas de Gortari, Ernesto Zedillo Ponce de León, Vicente Fox Quesada, Felipe Calderón Hinojosa e Enrique Peña Nieto; antes durante e depois de suas respectivas gestões?” 

Ou seja, a pergunta precisava investigar e sancionar se fosse comprovado delito, mencionava com nome e sobrenome a cada um dos ex-presidentes e estendia a investigação desde antes e depois de assumirem seus mandatos.

A proposta estava baseada nas revelações feitas pelo ex-diretor de Petróleos Mexicanos, Emilio Lozoya, por delitos fiscais muito graves cometidos desde 1988 cujos efeitos prejudiciais para o estado perduram 32 anos depois.

No entanto, a Corte a modificou de tal maneira que a despojou de seu sentido de justiça e prestação de contas, e pôs em seu lugar o que porta-vozes de Morena qualificaram de horror jurídico, vazio de conteúdo, ambivalente, desinflado, ambíguo e sem maior definição:
“Estás de acordo ou não em que se levem a cabo as ações pertinentes, com apego ao marco constitucional e legal, para empreender um processo de esclarecimento das decisões políticas tomadas nos anos passados por os atores políticos, encaminhado a garantir a justiça e os direitos das possíveis vítimas? ” Foi, como indicou um deputado morenista, um cantinflazo.

Esvaziá-la de conteúdo foi uma iniciativa dos juízes conservadores como o autor da moção de inconstitucionalidade derrotada, Luis María Aguilar Morales, um magistrado imposto pelo ex-presidente Felipe Calderón em seus seis anos de governo (2006-2012).

Aguilar Morales é um magistrado de triste trajetória conservadora por ser a persona designada por Calderón para liquidar a Companhia Luz e Força do Centro em 2009, que deixou na rua mais de 40 mil eletricistas e sentou as bases para a entrega do setor a empresas estrangeiras, principalmente da Espanha e dos Estados Unidos.

Segundo fontes do Morena, os outros quatro que lhe apoiaram têm também compromissos pessoais com um ou vários ex-presidentes do neoliberalismo, o que explica sua posição negativa a que os cinco sejam submetidos a uma decisão popular e muito menos julgados.
De igual maneira, a votação confirma a advertência do próprio López Obrador da necessidade de reformular todo o Poder Judicial que mantém as mesmas estruturas viciadas do neoliberalismo, e foi o mecanismo para legalizar a impunidade.

Os magistrados que se opuseram ao calderonista argumentaram que as justificativas apresentados por Aguilar Morales para declarar inconstitucional a consulta, não foram substantivas nem apegadas à lei, pois ele assegurou que “a Constituição proíbe submeter a consideração da cidadania o cumprimento das obrigações de autoridades de procuração e administração de justiça”, quando o artigo 39 diz todo o contrário.

O próprio presidente da Corte, Arturo Zaldívar, rebateu seu critério e alertou a respeito o resto dos magistrados ao assinalar que “quando exercemos a competência revisora que a constituição nos designa, devemos ser muito cuidadosos de não frustrar indevidamente os objetivos de uma consulta”.

No entanto, dois dos seis que votaram a favor da consulta condicionaram seu voto a uma mudança da formulação da pergunta, e essa concessão destravou o debate com o apertado resultado assinalado.

Em sua entrevista coletiva desta sexta-feira, López Obrador criticou a mudança da pergunta, mas não lhe deu importância porque o mais transcendente é que a Suprema Corte de Justiça avaliza pela primeira vez a existência de elementos e evidências para consultar o povo sobre uma atuação presumivelmente delitiva de cinco ex-presidentes.

Por primeira vez uma instância de justiça no México aceita essa realidade de corrupção no Poder Executivo por mais que se trate de deformar a matéria de consulta, pois o fundo do problema, disse López Obrador, queda intacto, que é perguntar às pessoas – e que além disso decidam – se estão de acordo ou não em julgá-los.

Se for positiva, o povo os vê culpados das acusações de corrupção e impunidade, ou inocentes, se ganhar o não.

O assunto está agora em mãos do Senado que deve iniciar o processo legislativo na próxima semana, no que promete ser um acalorado debate já iniciado com as fortes reações de Calderón e Fox, dois dos ex-presidentes implicados.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul — Direitos reservados.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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