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Entenda por que bilionários dos EUA não estão no Pandora Papers

Os mais ricos dos EUA, como Bezos, Musk, Bloomberg pagam quase nada em impostos federais sobre seus ingressos, e muitas vezes nem um só centavo
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

Os 400 estadunidenses mais ricos incrementaram sua riqueza total em 40% no ano passado, em plena pandemia, cujas consequências devastaram milhões de pessoas em seu país e ao redor do mundo, elevando o total de sua fortuna coletiva a 4,5 trilhões de dólares.

Quase todos neste exclusivo clube são mais ricos agora que há um ano, mas entre as exceções está um ex-presidente, segundo a lista anual dos 400 mais ricos dos Estados Unidos calculada e publicada pela Forbes.

Muitos destes mesmos indivíduos e suas empresas legalmente pagaram pouco ou nada de impostos federais, por taxas muito abaixo da grande maioria dos cidadãos contribuintes, a tal extremo que não requerem dos serviços para ocultar suas fortunas do fisco em contas e entidades offshore do tipo revelado pelos Pandora Papers esta semana.

Jeff Bezos novamente encabeça a lista

Jeff Bezos, fundador da Amazon, repetiu pelo quarto ano consecutivo seu posto número um na lista da Forbes dos estadunidenses mais ricos, com uma fortuna pessoal de 201 bilhões de dólares (sua agora ex-esposa Mackenzie Scott está no número 15 com US$ 58.5 bilhões). 

Elon Musk, da Tesla, é o seguinte, com uma fortuna de 190,5 bilhões, e em terceiro Mark Zuckerberg do Facebook com 134,5 bilhões. Bill Gates está em quarto lugar, com 134 bilhões (sua ex-esposa Melinda French Gates ocupa o número 158, com 6,3 bilhões).

Os fundadores do Google, Larry Page e Sergey Brin ocupam os seguintes dois lugares, e entre os 20 mais ricos também estão Michael Bloomberg, e nos lugares 11, 12 e 13 estão os integrantes da família Walton, donos do Wal-Mart.

confira a lista completa

Para entrar neste clube exclusivo dos 400 mais ricos, é requerida uma fortuna mínima de 2,9 bilhões. Aproximadamente 51 foram expulsos da lista de ricos supremos, entre eles o ex-presidente Donald Trump, que pela primeira vez em 25 anos não figura na relação — sua fortuna é calculada em só 2,5 bilhões. Foi um dos poucos ricos que não desfrutaram da alta dos multimilionários do ano passado, com a fortuna do autoproclamado “gênio” empresarial perdendo 600 milhões. 

Concentração de riqueza e mais desigualdade

A concentração de riqueza que este clube representa é parte da maior desigualdade econômica da história dos Estados Unidos desde 1928, tema que está no centro do debate político e social nacional. 

O fato de que os ricos ficaram mais ricos que nunca durante uma pandemia, com consequências econômicas em massa para as maiorias no país expressadas em maior pobreza, mais fome, e por níveis dramáticos de desemprego, só confirmou para muitos um sistema que alguns críticos — como o senador Bernie Sanders, intelectuais como Noam Chomsky, Cornel West e Robert Reich entre outros — qualificam de quase chegar a ser uma oligarquia.

Esqueça Mônaco: EUA se tornaram um dos maiores paraísos fiscais do planeta

Os Pandora Papers, projeto de investigação jornalística do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), que está provocando um terremoto ao revelar os clientes e cúmplices de uma economia clandestina internacional para os ricos e seus métodos de operação, lançou uma interrogante ao não encontrar a muitos estadunidenses entre os indivíduos ultra ricos que costumam usar os chamados paraísos fiscais.

Uma razão para isso, concluem alguns dos investigadores, é que estes estadunidenses não necessitam desses paraísos fiscais para ocultar suas fortunas já que sob a leis e o sistema tributário estadunidense conseguem evitar o pagamento de impostos de maneira legal.

Os mais ricos dos EUA, como Bezos, Musk, Bloomberg pagam quase nada em impostos federais sobre seus ingressos, e muitas vezes nem um só centavo

Montagem Diálogos do Sul
Estadunidenses mais ricos usam fideicomissos para evitar o pagamento de impostos quando passam suas fortunas aos seus herdeiros

Os mais ricos dos Estados Unidos, como Bezos, Musk, Bloomberg pagam quase nada em impostos federais sobre seus ingressos, e muitas vezes nem um só centavo, confirma uma investigação recente da ProPublica.

A organização de jornalismo investigativo obteve um enorme acervo da agência federal de imposto – o IRS – com dados sobre milhares dos indivíduos mais ricos do país ao longo de 15 anos, e concluiu que “destrói o mito da pedra angular do sistema de impostos estadunidense: que todos pagam sua justa parte e que os estadunidenses mais ricos pagam mais que todos”.

Os documentos oficiais mostram que os mais ricos, de maneira legal, conseguem pagar só uma mínima fração em impostos sobre o crescimento de bilhões, e até trilhões, de suas fortunas.

A taxa média de impostos federais de uma família estadunidense é de 14%, e o mais alto sobre um casal chega a 37%  se ganham mais de 628.300. Mas a análise realizada pela ProPublica descobriu que o que chamam de “taxa real de impostos” sobre um incremento de riqueza a cada ano dos 25 estadunidenses mais ricos é de só 3,4%.

Pandora Papers: Investigação revela os paraísos fiscais dos milionários

A taxa real para Jeff Bezos entre 2014 e 2018, quando sua fortuna cresceu 99 bilhões, foi de só 0,89%, a de Warren Buffett de só 0,10%.

Em alguns anos, estes mega ricos pagaram zero em impostos – esse foi o caso de Bezos, entre outros, em 2007 e outra vez em 2011.  

Fideicomissos evitam pagamento de impostos sobre heranças

Ao mesmo tempo, mais da metade dos 100 estadunidenses mais ricos usam fideicomissos para evitar o pagamento de impostos quando passam suas fortunas aos seus herdeiros, descobriu o ProPublica. 

Bloomberg, os irmãos Koch, a viúva do fundador da Apple, estão entre os que usam estes mecanismos especiais, tudo o que leva a que os cofres públicos percam, segundo alguns cálculos, centenas de bilhões. 

Chuck Collins, especialista nas manobras dos mais ricos para proteger suas fortunas e coordenador do programa sobre desigualdade econômica do Institute for Policy Studies, batiza os banqueiros, advogados e contadores dedicados a esta sagrada missão como “a indústria de defesa dos ricos” em seu livro Los acaparadores de la riqueza.

Assim, os estadunidenses mais ricos já vivem essencialmente em um paraíso fiscal, e não necessitam recorrer ao exterior, ou seja, offshore, sob as regras do jogo atual em seu país para evitar pagar impostos – embora muitos desejem ocultar parte de suas fortunas por outras razões, e várias empresas estadunidenses sempre buscam formas para transferir parte de seus ativos a outros “paraísos” para reduzir seus impostos. 

Com as revelações dos Pandora Papers, junto com o trabalho de outros como a ProPublica e IPS, é cada vez mais difícil pretender que os mais ricos nos Estados Unidos vivam sob as mesmas regras que todos os demais.

David Brooks, correspondente de La Jornada em Nova York.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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