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Lideranças presentes na reunião da Apec, no Peru (Foto: Presidência do Peru)

Apec no Peru: China protagoniza reunião e renova perspectivas para América Latina

Xi Jinping, presidente da China, foi além das promessas e boas intenções que habitualmente marcam os encontros da Apec e aproveitou a cúpula para inaugurar um megaporto em Chancay, no Peru
Redação IPS
IPS
Santiago

Tradução:

Ana Corbisier

A cúpula de Lima, que coincidiu com o primeiro quarto de século de existência do Fórum de Cooperação Econômica Ásia Pacífico (Apec), finalizou sem abrir maiores expectativas para a América Latina, salvo as que decorrem do vigoroso avanço da China na região.

A reunião número 31 do grupo acabou no último domingo (17), com 20 documentos assinados, que incluem 11 declarações ministeriais, oito instrumentos técnico-políticos e a Declaração final dos líderes das 21 economias que integram o fórum. Tudo por unanimidade.

A Declaração reafirma o propósito do fórum de “construir uma comunidade Ásia-Pacífico que seja próspera, pacífica e resiliente, empoderando as populações mais vulneráveis e atores econômicos para receberem os benefícios da economia global”.

Um compêndio de boas intenções, como tantos dos que emanam de conclaves internacionais, que adotam propostas frente aos grandes desafios atuais da humanidade, como a mudança climática, as migrações e a segurança global, cuja implementação vai sempre atrás do agravamento dos problemas.

Assim, não é difícil apontar semelhanças com o libreto da cúpula do Grupo dos 20 (G20) — grupo composto destacadas economias industriais e emergentes —, realizada em 18 e 19 de novembro e onde se encontraram também vários dos líderes participantes da reunião da Apec no Peru.

China e livre comércio

Lima acolheu um fórum econômico em que o olhar dos analistas se viu impregnado pela política, enquanto o protagonismo do presidente chinês Xi Jinping teve o contrapeso de um ausente: Donald Trump, que assumirá o governo dos Estados Unidos em 20 de janeiro com uma guerra comercial contra Pequim como cavalo de batalha.

Sim, esteve presente o presidente de saída, Joe Biden, que na América Latina se despede da cena internacional, primeiro com a cúpula da Apec, e depois no G20. O mandatário estadunidense aproveitou para se despedir também de Xi, em um encontro bilateral na capital peruana.

Paradoxo dos paradoxos. Xi, líder da grande potência que em seu sistema político mantém um regime estatista com um Partido Comunista hegemônico, exaltou no marco da Apec as bondades do livre comércio frente à ameaça certa do próximo governante dos EUA, modelo do capitalismo avançado.

Não é demais recordar que a Apec nasceu em 1989 no contexto do nascente auge dos tratados comerciais que acompanhou a dissolução da União Soviética e o debacle dos socialismos reais.

Foi o mesmo ano do Consenso de Washington, que proclamou como fórmula quase mágica para a superação das crises financeiras e a garantia de estabilidade democrática uma supremacia incontestável do mercado, um ambiente propício para o capital financeiro e o Estado reduzido a um papel subsidiário.

Eram os anos em que o mundo se pintava de globalização e se anunciava o fim da Guerra Fria. O livre comércio seria o articulador de harmônicas relações internacionais, com tratados que poriam um ponto final ao protecionismo com uma gradual eliminação de taxas, ao contrário da arma que hoje esgrime Trump.

Os presidentes das duas grandes potências mundiais, Joe Biden, dos Estados Unidos, e Xi Jinping, da China, durante seu encontro bilateral em Lima, onde mostraram mais sintonia do que nos quatro anos do governo estadunidense que termina em 2024. (Foto: Casa Branca / Flickr)

Apec e América Latina

Os primeiros signatários do tratado da Apec foram dois países americanos, Estados Unidos e Canadá, acompanhados por Austrália e Nova Zelândia na Oceania, mais oito sócios asiáticos: Brunei, Indonésia, Japão, Coreia do Sul, Malásia, Filipinas, Singapura e Tailândia.

Em 1991, se somaram China, Taiwan e Hong Kong, ocasião em que a Apec fortaleceu seu perfil de fórum de economias e não de Estados, sendo assim uma das poucas instâncias em que convivem os dois países chineses e também participa com plenos poderes o antigo protetorado britânico.

O México foi o primeiro sócio latino-americano, tendo aderido em 1993, o mesmo ano em que a Oceania aumentou sua representação, com Papua-Nova Guiné. Chile se tornou o segundo participante da América Latina em 1994. Peru, o terceiro em 1998, o mesmo ano em que se somaram Rússia e Vietnã.

A carta oficial de apresentação do fórum Ásia Pacífico ressalta que seus 21 membros concentram quase a metade do comércio e 60% do produto interno bruto (PIB) do planeta. Cifras impressionantes que outorgam prestígio, mas cujos benefícios reais são difíceis de quantificar.

O mundo é hoje um mosaico quase interminável de tratados de livre comércio, seja por blocos interregionais ou bilaterais. O Chile tem hoje 34 tratados comerciais, Peru, 24, e México, 14.

Estes três países latino-americanos estão mais prósperos do que antes de seu ingresso na Apec? Se busca-se uma resposta em suas taxas de crescimento do PIB percebe-se, como no caso do Chile, um aumento do potencial exportador, mas que não se replica necessariamente em outras áreas da atividade econômica.

O certo é que na economia global aumenta a exposição dos países às crises financeiras, como ocorreu em 2008, e o livre comércio não é um antídoto contra esta dependência.

A adesão a grandes tratados comerciais é sempre polêmica na balança de custos e benefícios. México, Chile e Peru são sintomaticamente os três sócios latino-americanos que estão ingressando no TPP-11, o tratado de 11 países da bacia do Pacífico.

Dorotea López, do Instituto de Estudos Internacionais da Universidade do Chile, disse em setembro de 2022, a propósito do TPP-11, que nos acordos comerciais existe uma mescla de urgência por assiná-los e “uma posterior amnésia” que os torna momentos políticos mais do que instrumentos comerciais.

Chancay, símbolo de novos tempos?

Um momento político é a mais certeira caracterização que se pode fazer destas cúpulas da Apec e do G20, em um cenário mundial em suspense pela mudança de leme na Casa Branca, simultânea a conflitos armados na Europa oriental e no Oriente Médio, aos quais Trump planeja somar uma guerra comercial.

Durante sua visita a Lima, Xi Jinping suavizou asperezas com Joe Biden, que há quatro anos também iniciou seu mandato prometendo mão dura contra a concorrência econômica da China. Agora, o líder asiático parece estar em melhores condições para resistir aos embates alfandegários do futuro governo estadunidense.

Trump pretende castigar as importações chinesas com taxas de 60%, e também foram anunciados aumentos de taxas de 25% contra os produtos do México, cuja presidenta, Claudia Sheinbaum, não esteve na cúpula da Apec, mas sim na do G20.

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“Fazer a América grande outra vez” é uma consigna que desde já prognostica custos inflacionários para o povo estadunidense, mas que também pode deteriorar as sempre precárias relações dos Estados Unidos com a América Latina, além do simbolismo de Marco Rubio, filho de cubanos, como secretário de Estado.

Um panorama que favoreceria um aprofundamento dos já intensos vínculos comerciais da China com a América Latina, que terão na bacia do Pacífico um impulso de grandes proporções com seu megaporto de Chancay na costa central peruana, inaugurado pelo governante chinês em sua visita ao Peru.

Haverá uma maior integração portuária na América do Sul? Chancay favorecerá a habilitação de corredores bioceânicos com os países do Atlântico? O isolacionismo de Trump e a presença chinesa despertará interesse nos governos latino-americanos pelo bloco Brics+ (encabeçado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul)?

Perguntas válidas de prognóstico por ora reservado.

IPS, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Redação IPS

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