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Foto: AMLO Oficial

Aprendendo política com o México: 7 pontos para entender a popularidade de López Obrador

Para Obrador, a Política é uma arte nobre; ele mesmo diz isso constantemente e esmera-se em pôr em prática de múltiplas maneiras
Alfredo Serrano Mancilla
Página 12
Buenos Aires

Tradução:

Ana Corbisier

Passam-se os dias, as semanas, os anos, e o presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador (AMLO), continua com um apoio majoritário. Conta com uma imagem positiva alta e estável ao longo de todo o seu mandato. E não importa que pesquisa se consulte. Todas coincidem no mesmo veredicto: dois terços da população está com AMLO.

A essência é básica, mas nem por isso simples: fazer Política. Sim, Política. Esta palavra, maldita para muitos, que AMLO valoriza na contramão daqueles que a consideram uma reminiscência do passado.

Para o presidente mexicano, a Política é uma arte nobre. Isto é algo que diz constantemente e, o que é ainda melhor, esmera-se em pôr em prática de múltiplas maneiras.

Em primeiro lugar, parte de convicções; sem elas, não se pode fazer política. O que não significa ser dogmático, mas tampouco moderado nem fanático de centro. Pelo contrário, defende ideias, valores e princípios. E esta matriz ideológica lhe serve como âncora sólida cada vez que tem que lidar com uma conjuntura complexa. Assim se move taticamente. O quanto necessário, mas sem deixar de avançar no que foi definido previamente como estratégico.

Isto, aliás, tem um correlato imediato: permite-lhe fixar o adversário político sem ambiguidades. Esta é uma questão fundamental para evitar confusões entre os cidadãos cada vez que é preciso tomar partido, seja na hora de votar ou, simplesmente, no cotidiano de uma discussão familiar.

Em segundo lugar, não subestimou a importância que tem a gestão para que sua palavra tenha credibilidade. O atual Governo da Quarta Transformação (4T) – como se autodefine – obteve conquistas muito notórias no social e no econômico. A melhora no bem-estar social veio acompanhada da bonança macroeconômica. Por exemplo, hoje, sua moeda, o peso mexicano, foi a moeda que mais se valorizou nestes anos em toda a América Latina.

Outro bom exemplo é o da chamada ‘austeridade republicana’, que conseguiu implementar graças à seguinte equação: aumentar a arrecadação sem modificar a matriz tributária. Como fez isso? Eliminando a maioria dos gastos tributários desnecessários, por serem injustos e ineficazes. Também reduziu muito o grau de sonegação e eliminou gastos supérfluos da casta política (AMLO continua viajando em avião comercial depois de cinco anos e meio de governo -e não mudou de ideia aos quatro meses).

Em terceiro lugar, comunica sem frivolidade. Não fez caso de nenhum desses manuais modernos de comunicação política que sempre abusam de infinitos lugares comuns e que levam a que a Política se esvazie de Política. AMLO fala diariamente (nas Mañaneras) e responde a tudo; em cada explicação combina lições históricas com dados atuais, não foge de nenhuma controvérsia, faz pedagogia em cada assunto e instala agenda. E, aliás, se acha que necessita de mais de uma hora para responder em detalhe a uma pergunta difícil, estende-se. E assim mesmo, é indubitavelmente um dos principais youtubers da América Latina pela quantidade de reproduções.

Em quarto lugar, entende que o eleitoral se resolve na arena da Política. Isto é, chega o período de campanha e a primeira coisa que faz é ir ao Congresso para propor uma reforma constitucional para recuperar o espírito de 1917, propondo mudanças estruturais muito notáveis para o futuro do país (salários, soberania, saúde, educação, aposentadorias, etc.).

Em quinto lugar, sabe que sem batalha cultural é impossível manter um processo de transformação longevo. Sua base está no humanismo mexicano. A partir daí ressignifica velhos símbolos e cria outros, novos. O orgulho de ser mexicano é, seguramente, um de seus principais estandartes.

Em sexto lugar, exerceu um pragmatismo inteligente. Isso não implica em renunciar a sonhar; tampouco viver fazendo genuflexões. Em outras palavras: não se pode fazer Política desconhecendo a realidade. Por exemplo, não se pode desconhecer que o México tem uma fronteira enorme com os Estados Unidos. AMLO jamais se fez de míope frente a esta obviedade e, por isso, teve que fazer política exterior tendo em conta essa dificuldade. Seguramente, em alguns assuntos teve que ceder, mas jamais cedeu a soberania. E, graças a isso, conseguiu ser ainda mais autônomo em sua política exterior para a América Latina (vejam-se exemplos como os do resgate de Evo, o desconhecimento de Dina Boluarte como presidenta do Peru ou o asilo aos perseguidos políticos do Equador).

Em sétimo lugar, deu máxima prioridade a criar um ‘movimento’ capaz de gerar tensões criativas (como diria Álvaro García Linera). Atualmente, o Morena (Movimento de Regeneração Nacional) está no centro da Política no México. Tem uma militância altamente formada, organizada e muito ativa. O que é crucial para um encontro eleitoral, mas fundamentalmente para fazer Política no terreno, no mundo acadêmico, nas redes, etc.

Por estas e outras razões, o tão alardeado ‘avanço da direita global’ não cabe no México. Apesar do enorme Poder Midiático opositor; apesar do Poder Judiciário jogando contra; apesar do Poder Econômico apostando em outro modelo; apesar destes típicos argumentos que em outras latitudes são utilizados para explicar a chegada do inevitável, no país asteca isto não acontece.

Desculpem o spoiler: as alternativas conservadoras e neoliberais (quer se chame Xóchitl Gálvez ou Álvarez Máynez) não conseguirão vencer a candidata do Morena nas eleições presidenciais de 2 de junho. Claudia Sheinbaum será a próxima presidenta do México por tudo o que foi dito anteriormente; e, também, porque é uma mulher muito bem formada e capacitada, técnica e politicamente, com muita trajetória e experiência verificada (governou a Cidade do México) e com lealdade de sobra demonstrada, tanto a AMLO como ao marco ideológico do espaço político a que pertence.

Página/12, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Alfredo Serrano Mancilla Doutor em Economia e diretor do Centro Estratégico Latinoamericano de Geopolítica (CELAG).

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