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ToggleUm estudo internacional publicado na revista Science revela que os glaciares são ainda mais sensíveis ao aquecimento global do que se estimava até agora.
Mais de 75% da massa glacial desaparecerá se a temperatura global aumentar 2,7°C, rumo ao qual o mundo caminha segundo a trajetória definida pelas políticas climáticas atuais.
Mas cumprir o objetivo do Acordo de Paris de limitar o aquecimento a 1,5°C preservaria 54% da massa glacial existente.
“Nosso estudo deixa dolorosamente claro que cada fração de grau importa”, afirma Harry Zekollari, coautor da pesquisa e professor associado da Universidade Livre de Bruxelas.
Ele acrescenta que “as decisões que tomarmos hoje terão repercussões durante séculos e determinarão quantos de nossos glaciares poderão ser preservados”.
Segundo a principal coautora dos artigos, Lilian Schuster, os glaciares são considerados um bom indicador da mudança climática porque seu retrocesso permite aos pesquisadores observar como o clima está mudando.
“Mas a situação dos glaciares é, na verdade, muito pior do que se vê atualmente nas montanhas”, explica.
Derretimento avança em todas as regiões do planeta
O impacto do aumento das temperaturas é distorcido, em grande parte, pelos glaciares muito grandes que cercam a Antártida e a Groenlândia.
Segundo a pesquisa, os glaciares mais relevantes para as comunidades humanas são ainda mais sensíveis, e vários deles já perderam quase todo o seu gelo com um aumento de 2°C.
Regiões glaciais, como os Alpes europeus, as Montanhas Rochosas no oeste dos Estados Unidos e Canadá, e os glaciares da Islândia, poderiam perder entre 85% e 90% de seu gelo em comparação com os níveis de 2020, devido a um aquecimento de 2°C.
Enquanto isso, a península da Escandinávia deixaria de ter gelo glacial com esse nível de aumento de temperatura.
A região do Hindu Kush, na cordilheira do Himalaia — onde os glaciares alimentam bacias hidrográficas que abastecem 2 bilhões de pessoas —, poderia perder 75% de seu gelo em comparação com o nível de 2020 em um cenário de aumento de 2°C.
Manter o objetivo do Acordo de Paris sobre o clima, firmado em 2015, permitiria conservar ao menos parte do gelo glacial em todas as regiões, inclusive na Escandinávia, com 20–30% nas quatro regiões mais sensíveis e 40–45% no Himalaia e no Cáucaso.
Este relatório reitera a crescente urgência de alcançar a meta de limitar o aumento das temperaturas a 1,5°C em relação à era pré-industrial, e, para isso, a descarbonização da atividade econômica continua sendo essencial.
Glaciares continuarão derretendo por séculos mesmo sem novo aquecimento
Uma equipe de 21 cientistas de 10 países utilizou oito modelos glaciares diferentes para calcular a perda potencial de gelo dos mais de 200 mil glaciares do mundo em uma ampla gama de cenários de temperatura global.
Para cada cenário, assumiu-se que as temperaturas permaneceriam constantes durante milhares de anos.
Os pesquisadores descobriram que, em todos os cenários, os glaciares perdem massa rapidamente ao longo de décadas e depois continuam derretendo a um ritmo mais lento durante séculos, mesmo sem aquecimento adicional.
Isso significa que continuarão sentindo o impacto do calor atual por muito tempo antes de se estabilizarem em um novo equilíbrio, à medida que recuam para altitudes mais elevadas.
Trópicos já perderam quase tudo; Europa vê glaciares desaparecerem
Mas os glaciares dos trópicos — nos Andes centrais do Peru, Equador e Colômbia, bem como na África Oriental e na Indonésia — parecem manter níveis mais altos de gelo, mas isso se deve apenas ao fato de que já perderam muito.
O último glaciar da Venezuela, o Humboldt, perdeu sua condição de glaciar em 2024, e o ironicamente chamado “Glaciar Infinito”, da Indonésia, provavelmente seguirá o mesmo caminho nos próximos dois anos.
Na Europa, a Alemanha perdeu um de seus últimos cinco glaciares durante uma onda de calor em 2022, e é provável que a Eslovênia tenha perdido seu último glaciar real há algumas décadas.