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Arnaldo Mourthé*
É triste assistir pela mídia o massacre dos palestinos da Faixa de Gaza. Pior só a tragédia que eles vivem. Por que será que isso está acontecendo? Não tenho a resposta completa. Fogem-me os pormenores, mas penso compreender a questão de fundo de tudo isso. Vamos ao assunto.
A Faixa de Gaza é um território palestino na costa do Mediterrâneo, fazendo fronteira com Israel e Egito (Sinai). Com população de um milhão e oitocentos mil habitantes, ocupa um território de 360 quilômetros quadrados, um terço do município do Rio de Janeiro. Sua dimensão e sua população equivalem às de um município. Sua condição atual é de território sitiado, por muros, patrulha naval e o sexto mais poderoso exército do mundo, submetida a uma agressão militar genocida. A Autoridade Palestina é reconhecida pela ONU, mas não o é como Estado Nacional por todos os seus membros.
O conflito atual é um desdobramento de vários outros conflitos que ocorreram de forma intermitente desde a criação do Estado de Israel, em 1948. Em relação a ele, os diversos observadores, diplomáticos, jornalistas ou historiadores, têm opinião variada, segundo o aspecto abordado e sua própria posição política ou ideológica. Essa é uma longa história, que precisamos sintetizar.
O retorno à terra de Sion, antigo nome de Jerusalém, sempre foi um sonho dos judeus. Em 1897, sob inspiração de Theodor Herzl, judeu húngaro e escritor, foi realizado em Basel, na Suiça, o congresso constitutivo da Organização Sionista Mundial, que nasce com o objetivo principal de fundar o Foyer national juif – um asilo para o povo judeu, garantido por lei pública, como a ele se referia Herzl. Em 1903 os ingleses ofereceram aos judeus o território de Uganda, o que não foi aceito. Em 1917, em plena Primeira Guerra Mundial, o governo inglês se manifesta, por carta ao lorde e banqueiro Leonel Walter Rothschild, ser favorável ao estabelecimento do Foyer national juif na Palestina, com representação política em outros países. A partir daí os judeus ajudaram o Império Britânico no desmantelamento do Império Otomano, e no estabelecimento do mandato britânico na Palestina.
Esses fatos históricos, e seus desdobramentos, todos vinculados à exploração e posse do petróleo, criam para as autoridades diplomáticas dificuldades no trato dessa questão. Mas sem eles não há como encontrar um ponto de equilíbrio entre o radicalismo, que há muito tempo já abandonou a racionalidade, e as expectativas dos povos do mundo no estabelecimento da convivência pacífica entre os dois grupos.
O complicador maior é que a questão palestina ou a questão israelense, dependendo do ângulo de visão do analista, está colocada sobre bases falsas desde a criação do Estado de Israel, em 1948. Não se trata apenas de questões culturais ou históricas entre árabes e judeus. Essas existem, mas são irrelevantes para explicar o estado belicoso que caracteriza a região. A questão de fundo é a geopolítica, que tem como objetivo o controle do petróleo, agora também do gás, da região detentora de dois terços das reservas mundiais de petróleo, cerca de 700 bilhões de barris.
Tanto a diplomacia quanto a imprensa mundiais têm como tabu a questão geopolítica quando se trata de Israel. Melhor para eles é ficar com a dicotomia cultural ou religiosa que esconde as questões de fundo, a econômica, e a militar que sustenta a política do petróleo no Oriente Médio, praticada pela Inglaterra desde a Primeira Guerra Mundial, hoje sobre a batuta estadunidense.
O agravamento dos conflitos nos últimos anos, “primavera árabe” abrangendo Tunísia, Líbia, Egito, Síria, assim como a questão ucraniana, se deve ao derrame financeiro, que busca a hegemonia política e cultural em todo o mundo, pelas grandes corporações internacionais, ancoradas nos países anglo-saxônicos, enquanto esses visam o controle do petróleo e do gás. A crise de 2008 mostrou a debilidade do sistema financeiro internacional, construído artificialmente sobre o dólar sem lastro e sob a ficção patrimonial. Nele todo tipo de papel é contabilizado como riqueza, inclusive os títulos das dívidas públicas impagáveis por serem simples artifícios monetários com os objetivos de dar rentabilidade ao dinheiro sem lastro e submeter os governos periféricos pela pressão financeira.
Sem considerarmos essa nova realidade não é possível discutir objetiva e racionalmente a questão árabe-israelense, nem o caos dos países europeus em crise, ou as pressões estapafúrdias sobre os países latino-americanos, como ocorre atualmente com a Argentina.
A hipótese mais provável para a despropositada violência israelense é de uma grande provocação, numa terceira tentativa, depois da guerra civil na Síria e dos conflitos da Ucrânia, visando gerar um grande conflito na região envolvendo a União Europeia e a Rússia, com dois objetivos. O primeiro é cortar o fornecimento do gás russo para a União Europeia, tornando esta dependente do gás americano. O segundo é a tentativa de protelar o colapso inevitável do sistema financeiro internacional, queimando estoques e abrindo novos mercados.
A postura cínica dos dirigentes israelitas não é recente, sempre atendendo seus fundadores e protetores. Desta feita a demanda é dupla, do protetor Tio Sam e de um dos pais fundadores do Estado de Israel, o capital financeiro, empurrando as autoridades israelenses a ações muito além do tolerável. Elas perderam o senso ético, ao praticar o genocídio, e a compostura, com declarações estapafúrdias e indecorosas que revelam sua condição de desespero. Enquanto isso a imprensa vendida tenta esconder suas práticas perversas.
*Ex-secretário de relações internacionais do PDT