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Toggle“As democracias se desfazem gradualmente – e depois de repente”, escreve Lisa Allardice, modificando um pouquinho uma frase de Hemingway, em sua resenha no The Guardian da novela recém ganhadora do Prêmio Booker, Prophet Song, a qual imagina a Irlanda sob um regime fascista. Essa frase resume a conjuntura não ficcional de outro país, esse que sempre presumiu ser modelo mundial da democracia.
Esse processo gradual nos Estados Unidos se acelerou durante os últimos 40 anos sob esse modelo por definição antidemocrático, o neoliberalismo, com uma cúpula política cada vez mais longe do povo que finge representar. Gore Vidal dizia que “há um só partido nos Estados Unidos, o Partido da Propriedade – e tem duas alas direitistas: republicanos e democratas”.
David Brooks | A democracia em perigo e o perigo da democracia nos Estados Unidos
Continua sendo uma democracia onde não existe o voto direto popular para eleger o presidente, onde vários estados têm leis explicitamente desenhadas para suprimir o voto dos mais pobres e das minorias, e um processo eleitoral viciado pelo dinheiro (mais de 14 bilhões de dólares fluíram nas eleições federais de 2020).
O ex-presidente Jimmy Carter, que se dedicou durante décadas a promover e monitorar eleições livres ao redor do mundo através de seu Centro Carter, comentou em 2015, depois de uma decisão da Suprema Corte aprovando o dinheiro ilimitado nas eleições, que os Estados Unidos “agora são só uma oligarquia, com suborno político ilimitado”.
Carter advertiu em janeiro de 2022, um ano depois do intento de golpe de Trump, que “agora temo que isso pelo qual lutamos tanto para alcançar globalmente – o direito a eleições livres e imparciais… se tornou perigosamente frágil aqui em casa”.
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Foto: Spencer Means/Flickr
“Há um caminho claro para a ditadura nos Estados Unidos, e está se encurtando a cada dia”, afirma analista conservador
Desaprovação
As sondagens e taxas de aprovações das instituições políticas estadunidenses seguem registrando uma massiva desaprovação da cúpula política. Uma pesquisa de 2021, o Survey Center on American Life, registrou que quase 7 em cada 10 estadunidenses opinam que a democracia estadunidense só serve aos interesses dos ricos e dos poderosos.
Hoje em dia, 65,5% contra 26,3% creem que o país prossegue em uma direção equivocada, com uma maioria reprovando os executivos, segundo uma média de pesquisas, reporta RealClearPolitics. Pior ainda, a aprovação do desempenho do Congresso caiu a só 13% na pesquisa da Gallup mais recente, e uma maioria de 58% desaprova o desempenho da Suprema Corte.
Democracia dos EUA precisa escolher: ignorar crimes de Trump ou enfrentar trumpismo
Estes indicadores do grave deterioro do sistema político, e sua reprovação pela maioria, são acompanhados por uma economia cada vez mais antidemocrática, com a desigualdade tanto em riqueza como em renda, chegando a níveis não vistos desde pouco antes da Grande Depressão. Os três homens mais ricos do país gozam de mais riqueza que a riqueza total de 50% dos estadunidenses.
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Trumpismo
Enquanto isso, Trump, que está empatado ou ganha de Biden em pesquisas recentes no início do ano eleitoral, oferece uma opção cada vez mais explicitamente fascista – com promessas de repressão de dissidentes e “inimigos” dentro e fora dos Estados Unidos, campanhas xenofóbicas anti-imigrantes, ataques contra os direitos e liberdades civis, tudo enquanto seus fiéis ameaçam de violência política e seus aliados continuam com a censura e até queima de livros.
Os alarmes soam de novo, mas com até maior preocupação, sobre a extinção da democracia com um possível retorno de Trump, e não só entre liberais e progressistas.
A ex-deputada Liz Cheney, que era a terceira republicana de maior influência no Congresso, advertiu essa semana que “estamos caminhando como sonâmbulos para a ditadura nos Estados Unidos”. Robert Kagan, analista político neoconservador no Brookings Institution, ofereceu a mesma advertência no Washington Post sobre um retorno de Trump, afirmando que “há um caminho claro para a ditadura nos Estados Unidos, e está se encurtando a cada dia”.
Continuarão os EUA iluminando o (autoproclamado) farol da democracia?
Bônus Musical
Staple Singers | For What It’s Worth
Playing for Change | Waiting on the World
David Brooks | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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