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Leonardo Boff: a crise capitalista e o golpe

Revista Diálogos do Sul

Tradução:

boffReflexão sobre a conjuntura política brasileira do teólogo e pensador brasileiro Leonardo Boff.

1. No Brasil houve um golpe da burguesia comandada pelo capital financeiro e operado por um esquema do poder judiciário-parlamentar.
2. Há uma crise sistêmica em todo o mundo, pela crise do modo de produção capitalista e seus regimes políticos.
3. A crise brasileira tem um componente geopolítico. Nós somos a sétima economia do mundo, um país populoso e líder da América Latina. É óbvio que houve interesses do capital e do governo estadunidense no golpe perpetrado.
4. A nova política do capital e governo estadunidense foi resumida pelo pensador Moniz Bandeira, recentemente falecido, em:

a) o mundo deve ser controlado por um império;

b) controlar todos os espaços geopolíticos importantes. Lembre-se que os Estados Unidos têm bases militares em todos os continentes e todas com ogivas nucleares.

c) garantir acesso às riquezas naturais para suas empresas. Como, petróleo, minérios, água, biodiversidade, etc.

d) desestabilizar todos os governos progressistas, não mais com golpes militares, mas usando esquemas mídia + judiciário + parlamento.

e) desmoralizar a política (como direito da maioria decidir) com ações, que aparentemente representem a opinião pública. Que na verdade é a opinião dos ricos.

5. Segundo Joseph Stiglitz (Prêmio Nobel de Economia), o futuro da economia mundial, depende de quem tiver recursos naturais. E o Brasil é número um em recursos naturais entre todos os países.

  1. Repete-se o prognóstico de Nixon: “quem controlar o Brasil controlará a América Latina”.

7. Vivemos um período do capitalismo, que ele transforma tudo em mercadoria, até os sentimentos. Tudo se vende, tudo se compra. E isso é o fim da sociedade civilizatória.
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O Brasil e a classe dominante

8. O Brasil é a sociedade mais desigual do planeta. E a mais injusta.
9. A burguesia brasileira não só não considera os pobres, mas tem ódio deles. E por isso usa sempre o estado e as instituições públicas, para manter essa diferença. Políticas públicas boas para beneficiar os ricos, e poucos recursos para proteger os pobres.
10. Celso Furtado morreu se perguntando: “Porque um país tão rico, tem tantos pobres?”
11. Há um enorme desequilíbrio entre as classes sociais brasileiras, que nos impede de avançar para acordos coletivos.
12. Vivemos uma ditadura da toga. O poder judiciário não emana do povo, como diz a Constituição, eles se transformaram num poder à parte, monárquico, discricionário, que se auto-protege, em favores e na interpretação da lei, sem contestação.
13. O STF se transformou no único Parlamento do país, ele decide tudo. Mas ele não foi eleito por ninguém. 

Os desafios para a sociedade brasileira

14. Estamos num dilema, ou nos unimos e reconstruímos um país soberano, que enfrente os interesses do capital financeiro e estrangeiro, ou voltaremos a condição de simples colônia.
15. Nosso dever é defender a democracia, que emana das urnas, da vontade da maioria, da mobilização do povo.
16. Construir um novo projeto para o Brasil, que possa projetar um novo processo de desenvolvimento em prol do bem estar das maiorias.
17. Projetar um novo regime democrático de participação popular. Não haverá solução para os pobres, sem a participação deles!
18. Alimentar o sonho de refundação de nosso país, baseado no tripé virtuoso que temos: natureza, cultura e povo.

a) A natureza: temos as melhores condições naturais de todo planeta, com petróleo, minérios, água, biodiversidade, florestas, ar. Podemos oferecer uma via boa para todos, sem desequilibrar o meio ambiente.

b) Cultura: é a relação do ser humano com a natureza e entre eles. Temos uma civilização tropical, como dizia Darcy Ribeiro, formada por mais de 60 etnias originárias de todo mundo. Não há paralelo de que em outro território do planeta tenha se miscigenado tanta riqueza cultural.

c) Povo: Nosso povo tem um valor social impressionante baseado na convivência entre diferentes e na solidariedade entre os pobres.

Desafios para a esquerda e os militantes sociais

19. Retomar o trabalho de base, como trabalho militante de conviver, ouvir os trabalhadores, os mais pobres, recolher as ideias do meio do povo e educá-los para as mudanças. O povo precisa dizer: que Brasil precisamos e queremos.
20. Criar, educar um cidadão de pensamento crítico. Como nos ensinou Paulo Freire. Precisamos nos indignar diante das injustiças e estar dispostos a mobilizar-nos.
21. Alimentar, cultivar as virtudes populares, como:

a) Crer na justiça de nossa causa;

b) Ter coragem de tomar iniciativas e criar o novo;

c) Ter resiliência — aprender sempre com nossos erros;

d) Alimentar a esperança (como energia renovadora);

e) Dar vazão à criatividade;

22. Precisamos ir criando redes de base, de organização popular, comitês, que possam debater um projeto para o Brasil e depois dar sustentação a propostas de mudanças estruturais de nosso país.
23. Como cristão, estou muito animado com nosso aliado Papa Francisco e recorro à sua sabedoria para nos ajudar a enfrentar a crise geral, quando ele nos diz:

a) Não esperem nada de cima, somente o povo liberta o povo.

b) Criem a democracia social, popular, participativa.

c) Lutem pela justiça social. Única forma de construir a paz.

d) Cuidem da casa comum, que é nossa natureza, nosso meio ambiente. Onde todos os seres vivos somos interdependentes.

Termino esperançoso, devemos aproveitar a gravidade da crise deste modelo, desta classe dominante e construir um novo projeto de Refundação do Brasil.
*Anotações (sem revisão do autor) de palestra de Leonardo Boff, Teólogo e pensador brasileiro. São Paulo, 5 de fevereiro de 2018
 
 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
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