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Do Facebook à campanha real: os dilemas da eleição de 2018

joao-feres-junior

Tradução:

Ao final da primeira semana de campanha constatamos que o nível de ativação do Facebook está bem aquém daquele esperado por analistas até recentemente. As restrições impostas pela rede a partir da eclosão do escândalo da Cambridge Analytica, inclusive com a perseguição e banimento de sites produtores de fake News, parece ter diminuído sensivelmente a atividade política entre os usuários. Dito isso, os candidatos continuam usando o Facebook, a rede social mais popular do Brasil, para fazer campanha.

Ao final da primeira semana de campanha, as tendências de ativação das páginas dos candidatos no Facebook que observei no período pré-campanha parecem estar se consolidando. Vamos diretamente aos números dos candidatos na semana que vai de 17/8/18 a 23/8/18.

Novamente observamos a liderança disparada das páginas de Bolsonaro e de Lula em quase todos os quesitos, inclusive no número de fãs. Mais uma vez, contudo, a página do petista mostra dinâmica mais positiva que a do ex-militar. Lula supera Bolsonaro no crescimento semanal do número de fãs, mais que o dobro; no número de posts, quase o triplo; no número de reações (somatório de likes, corações, uaus e gargalhadas); no engajamento, mais que o dobro; no número de compartilhamentos, 70% superior; e no número de comentários, mais que o dobro. Eles praticamente cravam o mesmo número de likes.

Ordenamos as páginas pelo número de fãs, o que não é uma medida absoluta de sucesso no Facebook, uma vez que as pessoas podem curtir uma página (ser fã na linguagem facebookeana é curtir a página) mas interagir pouco com ela.

Esses dados indicam não somente vantagem relativa da página do petista, mas também levanta suspeitas sobre o real alcance da página de Bolsonaro, uma vez que seus usuários são exímios clicadores de likes, mas compartilham pouco e comentam ainda menos. Seriam eles usuários humanos?

Marina Silva, por seu turno, continua em uma categoria própria. Milhões de fãs acumulados ao longo dos anos, mas baixíssima atividade no Facebook, seja qual for a variável que escolhemos. Sua página é a segunda que menos cresce em número de fãs.

Pior que a candidata acreana está Geraldo Alckmin, um gigante das coligações partidárias amargando a traseira de dois candidatos nanicos, Amoêdo e Dias. O ex-governador de São Paulo até acumula um número respeitável de fãs, mas a atividade de sua página é pífia. Para cada comentário na página do tucano, Lula ganha 36 na sua. Para piorar, a página de Alckmin é a que menos cresce entre todos os concorrentes listados acima.

Se não pelo número de fãs, quesito no qual ainda perde para Marina, Amoedo seria o terceiro colocado. Sua página cresceu a proporção assustadora de quase 22% só essa semana. Já Dias, que como Amoedo é candidato bastante desconhecido do público em geral, mas tem enorme número de fãs no Facebook, parece não estar conseguindo manter a vitalidade de sua página. Da semana passada para essa teve uma queda bastante abrupta em todos os indicadores.

A página de Amoêdo é outra que apresenta uma discrepância muito acentuada na proporção do número de comentários para o número de likes, indício de possível uso de robôs. Para Lula a proporção é de 0,33, ou seja para cada 3 likes há um comentário. Proporção similar encontramos nas das páginas de outros candidatos, como Alckmin (0,28) e Boulos (0,41). Marina é campeã nesse quesito alcançando 0,64, ou seja, seus fãs se engajam a ponto de comentarem assiduamente os poucos posts da página.

Como notei acima, Bolsonaro já apresenta uma proporção bem mais baixa, 0,11, isto é, um terço da de Lula. Mas Amoedo é ainda mais pífio: 0,05. Em outras palavras, somente 1 comentário para cada 20 likes. Dado que o candidato tem perfil afeito aos eleitores mais escolarizados, ou seja, que têm mais fluência na expressão escrita, essa proporção levanta suspeita de intensa atividade de robôs na página, dando likes e compartilhando posts.

Boulos continua com uma página bastante ativa na produção de conteúdo, campeã no número de postagens, mas também limitada no alcance, como mostra seu baixo número de compartilhamentos, que em geral segue o de likes. E, por fim, Ciro é o lanterninha na lista acima, com a maior taxa de crescimento da semana, depois de Amoedo, mas longe de ser suficiente para catapultar sua página na rede social. Seu número de reações continua bastante baixo.

Ao final da primeira semana de campanha constatamos que o nível de ativação do Facebook está bem aquém daquele esperado por analistas até recentemente. As restrições impostas pela rede a partir da eclosão do escândalo da Cambridge Analytica, inclusive com a perseguição e banimento de sites produtores de fake News, parece ter diminuído sensivelmente a atividade política entre os usuários. Dito isso, os candidatos continuam usando o Facebook, a rede social mais popular do Brasil, para fazer campanha

.As restrições impostas pela rede a partir da eclosão do escândalo da Cambridge Analytica, inclusive com a perseguição e banimento de sites produtores de fake News, parece ter diminuído sensivelmente a atividade política entre os usuários.

O significado e a influência da atividade no Facebook no resultado eleitoral são coisas bem mais difíceis de estimar. Seria o Face simplesmente um termômetro da eleição ou teria ele um papel decisivo na busca e captura de eleitores por parte dos candidatos?

Arrisco-me a dizer que a segunda questão é bastante improvável, mas mesmo se for verdadeira, e a rede servir para esse fim de cooptação eleitoral, ela também será um termômetro do resultado eleitoral. Assim, é razoável tomar o Facebook como termômetro, com o cuidado de levar em conta também o fato de que ele não consegue medir a atividade da metade da população brasileira que está fora da rede. Para isso temos que ajuntar à análise outros elementos.

Temos dois tipos de campanha, no mundo real e nas redes sociais, e cada candidato tem capacidades diferentes para executar cada uma. Lula é forte nos dois âmbitos. Com fraca estrutura partidária e pouquíssimo tempo no horário eleitoral, Bolsonaro é forte nas redes. Alckmin tem a maior estrutura partidária e tempo de horário eleitoral, mas é fraquíssimo nas redes. Marina é fraca em ambos as campanhas. O mesmo podemos dizer de Ciro. Lula e Bolsonaro ainda tem a vantagem de contarem com muitos sites e páginas de apoio na internet e nas redes sociais em particular.

É claro que as capacidades de campanha não são tudo. Os candidatos contam com sua figura pública e o seu recall. Mas sem uma campanha forte para potencializar esses atributos, um candidato dificilmente será competitivo. Marina Silva e Ciro são casos típicos de bom recall mas baixa capacidade de campanha.

Resta ainda computar um fator comunicacional para fecharmos a equação, a velha mídia, tomada aqui por mim da maneira como ela é: um ator político. Com o tempo reduzido de campanha ela terá seu potencial comunicativo diminuído. Para ter efeito nas eleições, a mídia precisaria escolher em bloco um candidato e apostar todas as fichas nele. Ela fez isso no passado inúmeras vezes, quase sempre apostando em candidatos do PSDB. Desta feita, contudo, a centro-direita está com problemas sérios de emplacar Geraldo Alckmin, e as alternativas, como Álvaro Dias e Henrique Meirelles, são natimortos eleitorais. A janela para a decolagem da campanha do tucano já está se fechando e ele não mostra sinais de acelerar na pista. Quais candidatos sobrariam?

Marina Silva, muito incensada pela mídia na eleição de 2014 depois da morte de Eduardo Campos, agora parece vir em versão enfraquecida, seja pela falta de estrutura partidária e tempo de horário eleitoral, seja por seu recall ser maculado pelo fracasso da eleição passada. Ademais, Marina não parece ser nome que entusiasme o conjunto das famílias proprietárias das grandes empresas de comunicação do país. E mesmo se entusiasmar, a mídia teria que sozinha ser capaz de colocá-la no segundo turno.

Ciro Gomes seria mais viável eleitoralmente, mas sua identidade de centro-esquerda, a qual o candidato defende de maneira bastante corajosa, é avessa à agenda fortemente neoliberal da grande mídia.

É muito improvável que Lula ou Fernando Haddad consigam reverter o profundo misopetismo que orienta as editorias de todas as grandes empresas de mídia do país. Os números do Manchetômetro mostram que Lula é campeão de citações nas capas e páginas de opinião dos três grandes jornais, foram 137 no período de 1 a 23 de agosto. Dessas matérias, contudo, metade (69) são negativas.

É muito improvável que Lula ou Fernando Haddad consigam reverter o profundo misopetismo que orienta as editorias de todas as grandes empresas de mídia do país. Os números do Manchetômetro mostram que Lula é campeão de citações nas capas e páginas de opinião dos três grandes jornais, foram 137 no período de 1 a 23 de agosto. Dessas matérias, contudo, metade (69) são negativas.

Resta Bolsonaro. Sua cobertura até aqui tem sido bastante negativa. No mesmo período seu índice de negatividade foi similar ao de Lula. Mas Bolsonaro está ganhando enorme exposição nas páginas dos jornais. Se ao longo do ano, mês após mês, Alckmin esteve em média empatado com ele no número de menções em matérias, no mês de agosto o ex-militar saltou para 91, enquanto Alckmin ficou com 56. Em suma, defrontados com a falta de opções à direita e com o ultra-neoliberal Paulo Guedes à frente do programa econômico de Bolsonaro, não é impossível que os órgãos da grande mídia passem a tratar o candidato com mais simpatia e apostar nele como a única opção eleitoralmente viável para barrar mais uma vitória eleitoral da centro-esquerda no Brasil.

Para consultar dados de semanas anteriores, clique aqui


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
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