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Você sabe qual o verdadeiro significado da palavra Soberania no Brasil?

Quando a gente fala de Soberania, é preciso deixar bem claro o significado da palavra que aparece 16 vezes na Constituição Federal de 1988
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;”

Quando a gente fala de Soberania, é preciso deixar bem claro o significado da palavra. Alguns dicionários dizem que deriva da palavra soberano, alteza ou excelência não superada em qualquer ordem inmaterial, o poder político supremo que corresponde a um Estado independente. É o poder do Estado, veja bem.

Nas Nações Unidas, nas Assembleias especializadas em busca de concertação pra definir ações que propiciem o desenvolvimento o conceito de soberania foi ganhando amplitude na sua completa dependência da Independência, a tal ponto que ambos os termos adquirem praticamente o mesmo significado.

Vale o rondó redundante: só é independente um país soberano e soberania só é possível com independência.

Patriotismo significa amor à Pátria. Minha pátria é o lugar em que nasci ou adotei como cidadão sujeito à história, tradições, leis e costumes. A palavra é derivada de pater, ou seja, pai. 

Os pais da pátria são aqueles que conseguiram fazer do território uma nação, a sua pátria.

Nacionalismo vem a ser a ideologia, de quem luta pra que a nação se constitua como Estado. Estado soberano. Patriotismo é sentimento, nacionalismo é ideologia. Duas expressões sem o conteúdo das quais a Nação não se forma como Estado soberano, independente. 

Porque essas digressões?

É que costumeiramente os militares se autodefinem como patriotas. Agora que estão no poder justificam atitudes como de patriotas quando são exatamente o contrário daquilo que o significado da palavra indica. Eles, argumentam que por serem patriotas expulsaram o mal do nacionalismo, o demônio do comunismo, livrou-nos do inferno petista, libertou o Itamaraty e o sistema educacional do marxismo cultural e…..

E o que minha gente? 

O que mais é preciso acontecer para que se perceba que tudo isso é pura enganação?

Estão enganando a gente o tempo todo para perpetuar a ditadura do capital financeiro. A ditadura que impôs o pensamento único, de que só há salvação para a crise econômica com as regras do neoliberalismo furioso.

Nas últimas décadas já se comprovou que nenhum país seguindo as cartilhas do neoliberalismo alcançou as Metas do Milênio para desenvolvimento e erradicação da pobreza. A realidade é o aumento da desigualdade, por toda parte.

Sobre Soberania

A palavra soberania aparece 16 vezes na Constituição Federal de 1988: soberania dos vereditos, soberania popular exercida pelo voto, livre formação de partidos políticos resguardados a soberania nacional, abarcam também as terras indígenas. Como é de se imaginar que pouca gente tem a pachorra de ler, e menos ainda estudar a Carta Magna, vale reproduzir alguns artigos.

Título I, dos Princípios Fundamentais, Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

  • I – a soberania;
  • II – a cidadania
  • III – a dignidade da pessoa humana;
  • IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
  • V – o pluralismo político.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

  • I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
  • II – garantir o desenvolvimento nacional;
  • III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
  • IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. 

Art. 91. O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado democrático, e dele participam como membros natos: 

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

  • I – soberania nacional;

A Carta de 88 repete um conceito presente em todas as Constituições anteriores, a de que as Forças Armadas têm a responsabilidade de preservar a Soberania do Estado e a Integridade da Nação.

Sahid Maluf, teórico citado inúmeras vezes em documentos oficiais, assevera que jamais existirá Estado soberano se não houver supremacia total e absoluta de sua soberania. As forças militares foram criadas para garantir a soberania, segundo se consagra desde a Revolução Francesa.

Navios cargueiros iranianos estão parados no porto de Paranaguá, Paraná, porque a Petrobras, que tem o monopólio do combustível, se nega a abastecê-los. Um enorme prejuízo porque cada dia parado no porto custa R$ 17 mil para as embarcações. 

Esses navios desembarcaram uréia iraniana, indispensável para a produção de adubo e outros químicos, e estão carregados de milho brasileiro comprado pelo Irã, importante sócio comercial. Tão importante que a balança comercial entre os dois países é super-favorável ao Brasil. De janeiro a junho, primeiro semestre de 2019, o Brasil importou US$ 26 milhões em produtos enquanto o Irã comprou  US$ 1,3 bilhões de produtos brasileiros. Quase que essencialmente alimentos: milho, carne bovina e de ave.

Então, porque a Petrobras não abastece os barcos iranianos?

Porque o Brasil desde há muito tempo abdicou da Soberania. 

Primeiro porque a Petrobras já não é 100 estatal, é empresa de capital aberto negociados nas bolsas de Nova York e Londres. A empresa nasceu exercendo soberania sobre todo o ciclo do petróleo: extração, transporte, refino, petroquímica. 

Segundo porque tanto a Petrobras como a Economia do Brasil como um todo estão em mãos de agentes financeiros empenhados na desindustrialização e desnacionalização da produção. E terceiro, como se não bastasse, para não contrariar o governo dos Estados Unidos que decretou um bloqueio contra a Nação iraniana. 

Três atentados à Soberania numa tacada só.

Soberania Alimentar

Soberania Alimentar. o povo é livre e soberano quando consegue suprir as necessidades alimentícias de seu povo com independência, sem depender das injunções externas. E ainda é capaz de produzir excedentes para exportação.

A Cúpula Alimentar da ONU de 1996 complementa esse conceito ao definir Segurança Alimentar e Nutricional é quando o Estado consegue garantir alimentos com qualidade para toda a população, em quantidade suficiente e de modo permanente.

Infere-se que se alcança soberania e segurança alimentar quando não haja uma só criança com fome, um só idoso pedindo comida, um morador de rua catando comida no lixo, uma dona de casa sendo presa e espancada por ter sido obrigada a roubar comida pra seus filhos.

Levantamento realizado pelo Estadão (20/07/2019) com dados do SUS constatou que morrem de fome (desnutrição é fome) 17 pessoas por dia no Brasil, 63.712 pessoas entre 2008 e 2017. Somando outros 60 mil que morrem assassinados, vítimas de violência, 20 milhões de desalentados e/ou desempregados e 40 milhões de marginalizados abaixo do nível de pobreza aceitável para uma vida digna, temos um país de 100 milhões de pessoas que não alcançaram a cidadania.

Cidadania 

O conceito implica a relação do cidadão com o Estado, seus direitos e deveres vis a vis os direitos e deveres dos outros. Está escrito na Constituição

  • II – a cidadania
  • III – a dignidade da pessoa humana;
  • I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
  • III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

Percebe-se que os quatro conceitos assegurados pela Carta de 88 caberiam numa só palavra: Cidadania. Construir uma sociedade livre, justa e solidária que respeite a dignidade humana é construir cidadania assim como erradicar a pobreza é respeitar a dignidade humana e construir cidadania.

O supremo ministro Dias Toffoli, presidente do Conselho Nacional de Justiça e do STF, constatou e informou que 80% dos presos, calculados em 797 mil pessoas não possuem nem cédula de identidade (RG), nem tem cadastrado como contribuinte (CPF). 

Isso entre os presos. Quantos serão os indocumentados na população? Como exercer cidadania sem ter sequer reconhecida sua identidade?

Dois números absurdos. População carcerária, amontoadas em 2.500 presídios, é a terceira no mundo perdendo só para Estados Unidos e China. 95% dos presos no Brasil são homens, e todos os cárceres estão superlotados, na maior promiscuidade, condições indignas. 

Na Nicarágua no tempo da ditadura do Clã Somoza, apoiada pelos EUA, só a população dos grandes centros urbanos, branca ou mestiça, era censada e documentada. Os indígenas e camponeses eram indocumentados. Era como se não existissem para o Estado. Cidadão com plenos direitos? Só quem era da turma.

É isso que queremos para o Brasil?

Gente! para endireitar este país basta que se cumpra com a Constituição e as Leis e Códigos que a regulamentam. Uma Frente de Salvação Nacional tem que ter a Legalidade, a Segurança Jurídica como prioridade. Isso requer a construção da soberania, só possível com independência.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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