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Caso Marielle: as tramas do único crime que pode derrubar governo Bolsonaro

Fato é, a investigação sigilosa da Polícia Civil afunila em direção ao mandante do assassinato e os nomes em evidências são respectivamente Carlos e seu pai
Frederico Rochaferreira
Diplomatique Brasil
São Paulo (SP)

Tradução:

O assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, em 14 de março de 2018, no Rio de Janeiro,  se deu um mês depois do Estado cair sob intervenção federal. Três dias depois, o interventor general Walter Souza Braga Netto, em sua primeira aparição pública, evitou a imprensa e não deu qualquer declaração sobre a execução de Marielle, que era relatora da comissão criada, pela Câmara dos Vereadores, para acompanhar a ação dos militares na intervenção federal no Rio de Janeiro.

Um mês após o assassinato, o ministro da Segurança Pública na época, Raul Jungmann, dizia que as investigações apontavam para o envolvimento da milícia, declaração que incomodou não só o interventor general Braga Netto, mas também, o secretário de Segurança Pública, general Richard Nunes, que exteriorizaram suas insatisfações ao comando das Forças Armadas, sendo então assinada em julho, a “lei do silêncio” entre o interventor Braga Netto e o presidente Michel Temer, sobre o caso Marielle. Esse “pacto de silêncio” fez com que o ministro Jungmann afirmasse que “tinha certeza do envolvimento de ‘políticos poderosos’ na execução de Marielle e do motorista Anderson” e as informações privilegiadas do ministro viriam a se confirmar quatro meses depois com a prisão dos milicianos Ronnie Lessa e Élcio Queiróz como executores de Marielle e Anderson 7 e 11 meses depois, quando veio a público o nome de “políticos poderosos” margeando o caso Marielle, os Bolsonaros.

Dois meses antes do “pacto de silêncio”, tinha entrado em cena a testemunha Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha, levada para ser ouvida na Polícia Civil pelos delegados da Polícia Federal, Hélio Kristian, que já tinha sido investigado pela PF por atividades ilícitas, Lorenzo Martins Pompilio e Felício Laterça, este último, um deputado federal do PSL, partido que elegeu Bolsonaro. Na ocasião Ferreirinha incriminou Orlando Oliveira de Araújo, preso no complexo penitenciário de Bangu desde 2017 e o vereador Marcelo Siciliano, como mentores do assassinato de Marielle, mas ambos sempre negaram qualquer relação com o crime. Posteriormente, Ferreirinha em novo depoimento à Polícia Federal, admitiu que mentiu no primeiro depoimento.

Depois da eleição de Bolsonaro, o ex-ministro Jungmann voltou a se manifestar sobre o caso Marielle, dizendo ter certeza de que “políticos poderosos, agentes públicos e milicianos estão envolvidos no assassinato da vereadora do PSOL e que a Polícia Federal investiga um suposto complô integrado por autoridades públicas para impedir a elucidação do caso”,  se referindo à um relatório reservado da Polícia Federal que apontava o então chefe da Polícia Civil do Rio, delegado Rivaldo Barbosa, de estar obstruindo o avanço das investigações mediante recebimento de propinas.

A desconfiança em relação ao chefe da Polícia, fez com que a investigação sobre o assassinato de Marielle a cargo do delegado Giniton Lages, chefe da Divisão de Homicídios, seguisse sigilosa até mesmo para a cúpula da polícia, resultando assim na prisão do policial militar reformado Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos e o ex-policial militar Élcio Vieira de Queiroz, apontado como motorista do veículo. Após o desfecho da Operação que pegou a cúpula da Polícia Civil de surpresa, o delegado Giniton Lages foi imediatamente afastado do caso.

Vale lembrar que Ronnie Lessa, um mês depois do assassinato de Marielle, quando ainda era um ilustre desconhecido no caso, sofreu uma tentativa de queima de arquivo, cuja investigação nunca avançou.

Com a prisão de Lessa e Queiróz as investigações avançam em sigilo, até que em outubro de 2019, a Rede Globo divulgou o depoimento dado à Polícia Civil, pelo porteiro do condomínio em que Bolsonaro, seu filho Carlos, e Ronnie lessa têm casa, na Barra da Tijuca. No depoimento o porteiro diz que foi o “seu Jair”, da casa 58, (casa de Jair Bolsonaro) quem autorizou a entrada de Élcio Queiróz, no condomínio, mas que Élcio foi direto para a casa de Ronnie Lessa, colocando assim, o nome Bolsonaro no caso.

O porteiro ouvido pela polícia não só confirmou o que registrou no livro do condomínio, como disse que interfonou duas vezes para a casa de Bolsonaro, a segunda para avisar que Élcio Queiróz havia se dirigido para a casa de Ronnie Lessa, recebendo a confirmação da autorização para a visita de Élcio ao condomínio.

Depois que a reportagem da TV Globo foi ao ar revelando o depoimento do porteiro, o filho do presidente, Carlos Bolsonaro teve acesso à gravação da portaria do condomínio e afirmou que não não houve qualquer contato entre a portaria e a casa do pai. Carlos divulgou um áudio mostrando que o porteiro interfonou para a casa 65, de Ronnie Lessa e não para a casa 58, de Jair Bolsonaro, desmentindo o depoimento prestado à polícia e divulgado pela Rede Globo. Ocorre que o áudio apresentado por Carlos não era do porteiro que prestou depoimento à polícia, era de um outro porteiro do condomínio.

O presidente da República então entra em cena e em uma ação que caracteriza obstrução de justiça, se apropria das gravações do condomínio, determinando que o Ministério da Justiça acione a Procuradoria Geral da República para entrar no caso e o Procurador Geral Augusto Aras, acionado, determina à Polícia Federal que tome novo depoimento do porteiro.

À Polícia Federal, o porteiro muda a versão e diz que “errou” quando declarou à Polícia Civil, que um dos acusados do assassinato de Marielle procurou casa de Bolsonaro no dia do crime e que “errou” quando disse que a ordem para entrar no condomínio partiu da casa do seu “Jair”, disse também que “errou” ao anotar o número 58, da casa de Bolsonaro, no registro de entrada do local.

De fato não poderia ter sido “seu Jair” quem autorizou a entrada de Élcio no condomínio, naquele dia Jair Bolsonaro estava em Brasília, mas Carlos Bolsonaro, vizinho do pai e de Ronnie Lessa no condomínio, estava no Rio.

Pressionado o vereador Carlos Bolsonaro disse que não estava em casa no dia da morte de vereadora Marielle e do motorista Anderson Gomes, no dia seguinte porém, muda a versão e confirma que estava em casa naquele dia.

Fato é, a investigação sigilosa da Polícia Civil afunila em direção ao mandante do assassinato de Marielle e do motorista Anderson e os nomes em evidências são respectivamente Carlos Bolsonaro e seu pai, o presidente da República, que acusa o governador do Rio, Wilson Witzel de estar por trás das investigações contra sua família.

Convicto de que novos fatos virão à tona envolvendo seu nome, Bolsonaro entrou 2020, tomando a iniciativa. Em uma rede social no dia 4 de janeiro,  o presidente deu a entender que sabe quem está por trás da morte de Marielle, blefe que faz lembrar a máxima de Hélio do Soveral “quanto mais negamos um crime, mais a consciência nos obriga a pensar nele.”

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Frederico Rochaferreira

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