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"Bolsonaro não gosta de pobre, só de rico", diz moradora ao receber cesta na periferia de SP

Conhecemos Marlene em uma entrega de alimentos no bairro de Eldorado, zona sul. Conversamos sobre o Brasil em tempos de pandemia. Assista ao vídeo:
Semayat S. Oliveira
São Paulo (SP)

Tradução:

Era um sábado de manhã. Uma senhora aguardava autorização para entrar na fila de doação de cestas básicas no bairro de Eldorado, zona sul da cidade de São Paulo. O nome dela não estava na lista e, por isso, as organizadoras pediram que esperasse alguns minutos até terem certeza de que haveria o suficiente. Foi o que ela fez, aguardou.

Não demorou muito até que recebesse um sim. Seu nome é Marlene de Lourdes de Souza, 68 anos. Ela era mais uma mulher em meio a dezenas de outras que aguardavam os mantimentos para mais um período de quarentena.

Depois de receber todas as orientações, Marlene conversou com o Nós, mulheres da periferia. Em sua fala, destacou a dificuldade de manter a sobrevivência e como a atual gestão presidencial a deixa descontente. A entrevista foi realizada no dia 17 de abril.

Conhecemos Marlene em uma entrega de alimentos no bairro de Eldorado, zona sul. Conversamos sobre o Brasil em tempos de pandemia. Assista ao vídeo:

Reprodução: Nós mulheres da periferia
Marlene de Lourdes de Souza, durante entrevista ao site N´´os mulheres de periferia

Assista ao vídeo

Leia abaixo a entrevista na íntegra:

Mulheres da periferia: Como a senhora tem feito para se manter? 
Marlene de Lourdes de Souza: Ajuda dos outros, as minhas filhas mandam um feijão, um arroz, mas agora elas estão no mesmo barco que eu. Aí não tem. Foi aí que minha filha e uma moça que conhece essa associação trouxe o meu RG. Eu não tinha nem como vir porque eu não tinha máscara, já peguei essa daqui emprestada. E disse que quando eu pegar em dinheiro eu pago. Meu nome não tava na lista e a moça me deixou no cantinho, mas graças a Deus ela me deu. É como eu vou me manter. Mora eu, um neto e um filho que não é bom de saúde.

E a senhora tem aposentadoria? 
Olhe, aposentadoria completa assim, não. Eu tenho uma ajuda. Mas essa ajuda não dá pra nada. Porque quando eu pego aquela ajuda, a filha que tá precisando, eu divido com ela. Fica aquele pouquinho. Mas é minha filha, qual é a mãe que vê a filha ou o filho precisando e não ajuda?

 E suas filhas trabalham com o que?
Faxina nas casa do povo. Uma que deu o nome aqui não veio porque foi fazer uma faxina desde ontem e eu acho que ela não terminou e ficou de terminar hoje. Eu sai de casa e ela não tinha chegado ainda. Ela tem dois filhos, um casal, mas ela cuida de duas netas. Que a filha dela que mora em Recife mandou pra ela.

Os patrões da sua filha estão ajudando?
Olha, eu digo pra senhora uma coisa. Patrão gosta de serviço. Vai dizer: ‘o meu patrão gosta de mim’. Não, não existe isso. Patrão gosta do serviço da pessoa. Não é assim? Digo porque eu também já trabalhei muito, já lavei muita roupa dos outros pra fora. E o meu resultado qual foi? Pegar aquelas trouxas na cabeça.

 Qual foi o resultado pra senhora? 
Esse que eu to agora. Precisando. Vocês (a associação) que eu não conheço, to conhecendo agora, é que tão me ajudando. Num é assim? Então a gente tem que reconhecer aquilo que as pessoas fazem com a gente. Se a senhora precisa de mim, então eu vou te ajudar. Eu divido o quilo de feijão que eu tiver, eu divido.

E como a senhora tem conseguido manter os cuidados dentro da sua casa?
Olhe, eu arrumei um bocado de álcool. Comprei um pedaço de sabão, daqueles que o povo faz em casa. E quando eu chego, passo pano com álcool nas minhas coisas, que é uma cama de solteiro pra mim e meu neto. E meu filho dorme num sofá que me deram. E aí eu digo: ‘vamo limpar direitinho, meu filho’.

Meu Deus, minha mãe tem 89 anos e não mora aqui, mora em Recife. Que Deus dê muitos anos de vida à minha mãe, ela nunca há de pegar uma coisa dessa. Que Deus proteja ela e todos nós. Porque eu nunca vi, minha filha. A minha casa só tem uma porta. É um barraquinho de tábua. Eu fecho a porta e fico dentro de casa pedindo a Deus por misericórdia. Cinco horas da manhã eu abro a porta pedindo: ‘meu Deus, tenha misericórdia desse povo’. Tem gente que merece e tem gente que não merece. Porque eu vejo tantos aproveitando da oportunidade. Se você não tem,  você pega R$ 10 e vai numa barraca comprar as coisas e, quando chega lá, não tem nada. Porque tão aproveitando da situação. Não é assim que se faz. Se eu tivesse condições a vida era outra pra maioria do povo. Se eu tivesse condições, mas infelizmente a minha condição é estar precisando. Quem sabe amanhã eu não possa ajudar. 

E como você acha que nossos governantes deveriam agir nessa situação? 
Minha filha, eles deveriam ajudar demais aqueles que precisam. Aqueles que precisam eles deveriam ajudar.

“Porque R$ 600 não é dinheiro não, minha filha, que eles tão dando. Não é dinheiro. Que você chega no mercado, você não traz nada. Mas olha, me desculpe. Eu não gosto desse Bolsonaro. Meu Deus me perdoe, Eu não gosto desse Bolsonaro porque ele não gosta de pobre, ele só gosta de rico. Ele não gosta de pobre, minha filha.”

Eu queria ter a oportunidade de dizer a ele, que eu dizia. Eles deviam ajudar e ir visitar, mas não em dia de eleição não, que eles querem é subir, puxar pra família deles e os pobres morrer lá, a míngua. Não é assim, minha filha? Pronto, então estamos conversadas. 

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Semayat S. Oliveira

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