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Quem paga a conta do apagão no Amapá e da incompetência de Bolsonaro? Você, caro leitor!

Foi graças ao apagão do honorável presidente Fernando Henrique Cardoso que José Serra (PSDB) perdeu a eleição para Lula, em 2002
Amaro Augusto Dornelles
Diálogos do Sul
São Paulo (SP)

Tradução:

O apagão estourou no Amapá no final de 2020. A concessionária espanhola Isolux quebrou e repassou a bronca à Gemini Energy, pertencente aos fundos de investimentos Starboard e Perfin.

Onde os investidores bonzinhos foram buscar a solução para tirar o Amapá inteiro das trevas? Na boa e velha estatal Eletronorte, ora pois. 

Leia também: Vícios privados, virtudes públicas: como terceirizar lucros e socializar prejuízos na marra

Em meados de novembro, o governo federal autorizou a contratação emergencial de usinas térmicas para abastecer o estado. O custo? Foi embutido nas contas de luz de todo o país, já a partir de dezembro. Ou seja, lucros privados, prejuízos públicos. Ganhar dinheiro assim é mais fácil do que roubar doce de criança.

Esta é a aula prática de tudo o que o professor Paulo Feldmann vem pregando nos últimos 30 anos. Feldmann é professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA), da USP; e professor visitante em duas universidades húngaras, além de pesquisador da Universidade Fudan, na China e presidiu a Eletropaulo (estatal), entre outras empresas ao longo de 35 anos.

A bem da verdade, lembra, a própria legislação brasileira estabelece que as diretorias das agências regulatórias deveriam ser substituídas a cada seis anos. Mas há cláusulas que permitem a nomeação para “cargos de confiança”. O descalabro que desabou na vida de todo morador do Amapá deve servir de lição para demonstrar o absurdo que a Privatização da economia do Brasil executada por indigentes morais proto nazistas, pode levar o Brasil à bacia das almas.

Orgia Tropical

Em 19 de novembro de 2020, a Justiça do Amapá determinou a troca da diretoria da Aneel diante da tragédia da falta de luz no estado. Um dia depois, a liminar foi suspensa um dia depois a pedido da própria agência. Ou seja, não foi preciso nem 24 horas para que o interesse do capital acabasse com o arroubo do Juiz amazônico e fizesse valer seus interesses. Os moradores do Amapá? Que se explodam, como dizia o antológico Justo Veríssimo, personagem de Chico Anísio.

“Infelizmente esta é a ‘orgia’ em que se vive no Brasil. Não se dá estabilidade para as agências reguladoras, que servem muito mais aos interesses políticos do que à população, que acaba tendo de pagar a conta no final”, diz o professor mestre doutor.

Foi graças ao apagão do honorável presidente Fernando Henrique Cardoso que José Serra (PSDB) perdeu a eleição para Lula, em 2002

Panorama Mercantil
Paulo Feldmann é professor da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA), da USP.

Inepto e Vendido

O problema dos privatistas é que no setor elétrico fica muito difícil estabelecer competição. “Não se pode escolher de quem vai comprar eletricidade a cada mês, não há esta opção”, informa o engenheiro, com doutorado pela FGV. De qualquer forma, é fundamental que a agência regulatória seja forte. 

De acordo com ele, no segundo mandato de FHC, na época das privatizações, chegou a haver competição no setor de telecomunicação. Apareceram as empresas espelho para não deixar ninguém como dono do mercado nas diversas regiões do país. Com o passar do tempo, no entanto, as empresas concessionárias começaram a nomear diretores e a ditar as regras.

Para o professor Feldmann, o resultado do apagão no Amapá acabou sendo bom para o Brasil – apesar do alto custo para a população daquele estado. A lição é tão simples quanto vital: quando a empresa era estadual nunca acontecera um black out. A estatal visava o bom atendimento a seus clientes, não o lucro simplesmente. Tudo muito didático. Portanto, o serviço de geração, distribuição e entrega de eletricidade não pode ser privatizado. O problema é que, além de inepto, o governo é vendido ao norte.

FHC + Malan = Apagão

Igualmente didático foi o apagão do governo Fernando Henrique Cardoso, em 2001. Pena que a lição ‘do professor’ não tenha sido assimilada. Ortodoxo defensor do Consenso de Washington, o tucano foi o responsável pelo fim do planejamento em todos os ministérios – até então cada um deles tinha seu próprio núcleo de planejamento. O setor elétrico tinha tudo planejado, integrado. Nem José Sarney, seu antecessor, ousou mexer no que estava funcionando tão bem.

Aí chegou FHC com seu ministro Pedro Malan, da Fazenda (Economia de hoje) defensor da máxima segundo a qual “o livre mercado resolve tudo”. Malan conseguiu destruir os núcleos de planejamento de todos os ministérios. 

Com isso, as empresas geradoras deixaram de saber quanta energia deveriam produzir. O mesmo passou a valer para a transmissão e o transporte para as diversas regiões. Elas precisam ser interligadas. “O Brasil é muito grande, precisa saber quando e quanto gerar para um dos geradores, quanto desta geração vai chegar a ser transportada e distribuída” ressalta o estudioso.

Apagão e vitória de Lula

Trata-se de atividade muito complexa, envolvendo empresas municipais, estaduais e federais. Tudo tem de ser muito bem-planejado, integrado, quando vai gerar, para onde vai, qual empresa vai receber, ensina. 

“O resultado da filosofia do estado mínimo do ministro Pedro Malan foi o fim do planejamento energético, que andava tão bem no país. Estas são as bases do apagão nacional do Brasil em 2001.

Houve seca em grande parte do país, problemas de toda ordem. “Mas nada era novidade”. Jamais houve um apagão como aquele. Se houvesse planejamento, como se tinha até FHC, “seria possível prever onde haveria falta maior de eletricidade e excesso, para haver o remanejamento de energia”, ensina Feldmann.

O sistema elétrico é muito dependente da água, é gerado nas hidrelétricas, o que é ótimo, pois não polui, segue o especialista. Quando não chove o previsto, são gerados problemas. 

Aí entram em ação as termoelétricas, que usam carvão, gás ou diesel, explica ele: “o apagão aconteceu porque não havia planejamento capaz de transferir energia onde ela havia em excesso para regiões onde faltava”. Foi graças ao apagão do honorável presidente Fernando Henrique Cardoso que José Serra (PSDB) perdeu a eleição para Lula, em 2002. O povo ficou indignado com a falta de luz. O apagão bolsonariano não foi nacional.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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