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Povos indígenas de todo Brasil se manifestam contra PL que abre terras indígenas para exploração econômica

Pedido de vista coletivo tirou o projeto da pauta da CCJC pelo prazo de duas sessões; 44 parlamentares votaram para manter o PL anti-indígena na pauta
Tiago Miotto

Tradução:

O Projeto de Lei (PL) 490/2007 foi retirado da pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJC) da Câmara dos Deputados após um pedido conjunto de vista feito na manhã desta quarta (16). Com o pedido, o PL 490 fica fora da pauta da CCJC por um prazo de duas sessões do plenário da Câmara e pode retornar já na próxima semana, com risco de votação.

Povos indígenas de todo Brasil têm se manifestado de forma contínua contra o projeto, que abre terras indígenas para grandes projetos de exploração econômica e inviabiliza, na prática, novas demarcações. Cerca de 800 indígenas de 40 povos estão presentes em Brasília e participam do Levante Pela Terra, mobilização em defesa dos seus direitos constitucionais que tem a luta contra o PL 490 como uma de suas principais pautas.

“O PL 490 permite que o governo tire da posse de povos indígenas áreas oficializadas há décadas, escancara as terras indígenas a empreendimentos predatórios, como o garimpo, e, na prática, vai inviabilizar as demarcações, totalmente paralisadas pelo governo Bolsonaro”, afirma Kretã Kaingang, da coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

Pedido de vista coletivo tirou o projeto da pauta da CCJC pelo prazo de duas sessões; 44 parlamentares votaram para manter o PL anti-indígena na pauta

Reprodução: Adi Spezia/Cimi
Do lado de fora da CCJC, enquanto parlamentares decidiam não retirar o PL 490 de pauta, indígenas manifestavam-se contra o projeto, cercados

Na manhã desta quarta-feira, o PL 490 era o primeiro item na pauta da reunião da CCJC. Como tem ocorrido todas as vezes que o projeto é pautado, centenas de indígenas marcharam até o Congresso Nacional e manifestaram-se do lado de fora do Anexo II, pedindo o arquivamento da proposição.

No início da reunião, deputados e deputadas da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Indígenas pediram a inversão da pauta e, depois, solicitaram que o PL 490 fosse retirado de votação. As duas propostas foram derrotadas: a primeira, por 38 votos a 23, e a segunda, por 36 votos a 29. Confira, abaixo, os nomes dos 44 parlamentares que votaram contra os pedidos – e, portanto, a favor do PL 490.

Com a manutenção da pauta, o relator do projeto, deputado Arthur Maia (DEM-BA), realizou a leitura de seu parecer sobre o PL 490 e demais projetos apensados. O parecer de Maia condensa uma série de ataques aos direitos territoriais indígenas e é considerado inconstitucional por várias razões – a começar por sua forma: é um projeto de lei ordinária que busca retirar direitos garantidos na Constituição.

Além disso, o projeto, na versão relatada por Maia, também estabelece a aplicação do marco temporal como critério para a demarcação de terras indígenas, sob a falaciosa justificativa de que esta seria uma definição do Supremo Tribunal Federal (STF).

“As pessoas estão acreditando que existe uma matéria definida pelo Supremo. Há um caso de repercussão geral que trata do marco temporal e está sendo discutido pelo STF”

Povos indígenas manifestam-se contra o PL 490 em marcha na Esplanada dos Ministérios. Foto: Tiago Miotto/Cimi

“As pessoas estão acreditando que existe uma matéria definida pelo Supremo. Há um caso de repercussão geral, inclusive, que trata do marco temporal e está sendo discutido pelo STF”, afirmou no plenário a deputada Joenia Wapichana (Rede-RR), chamando atenção para o caso de repercussão geral cuja votação chegou a iniciar no STF, mas foi interrompida após destaque do ministro Alexandre de Moraes.

“A nossa Constituição deixa bem claro que os direitos indígenas são originários, imprescritíveis, inalienáveis, indisponíveis”, prosseguiu a deputada. “Esse projeto vai desfigurar os direitos constitucionais dos povos indígenas”.

A parlamentar Perpétua Almeida (PCdoB-AC) criticou a falta de diálogo com os povos indígenas sobre o tema. “Isso é inaceitável, é uma vergonha para o parlamento. Centenas de lideranças estão aqui fora fazendo um apelo para que esse projeto seja retirado”, afirmou.

“O que se está cometendo nessa comissão é um verdadeiro crime contra os direitos dos povos indígenas. É a legitimação do esbulho. Os povos indígenas que foram expulsos das suas terras podem não ter mais o direito a elas. É rasgar a Constituição brasileira. Essa proposição interessa àqueles que querem se apoderar dos territórios que não lhes pertence”, criticou a deputada Erika Kokay (PT-DF).

“Não consigo compreender essa sanha, esse desejo exagerado de botar a mão nas terras indígenas, como se não tivesse terra suficiente no Brasil”, questionou o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS).

“Esse projeto é totalmente inconstitucional”, criticou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP). “Ele ataca os direitos fundamentais dos povos indígenas, infringe acordos internacionais”.

Depois de algumas horas de discussão, com centenas de indígenas manifestando-se do lado de fora da Câmara, mas sendo ignorados pela maioria dos integrantes da CCJC, a deputada Joenia Wapichana (Rede-RR)  apresentou o pedido conjunto de vista, em nome dela e dos deputados Edio Lopes (PL-RR), Gervásio Maia (PSB-PB), José Guimarães (PT-CE), Maria do Rosário (PT-RS), Paulo Teixeira (PT-SP) e Rui Falcão (PT-SP).

Uma nova reunião da CCJC ocorreu nesta quinta-feira (17) e, devido ao pedido de vista, o PL 490 não entrou na pauta. Na próxima semana, transcorrido o prazo de duas sessões, pode ser novamente pautado e votado, sem possibilidade de novos pedidos de vista. Se aprovado na Comissão, o PL passa ao plenário da Câmara dos Deputados, ao Senado e, finalmente, à sanção presidencial.

 


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Tiago Miotto

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