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Leonel Radde: o deputado e policial antifascista na mira da extrema-direita de Porto Alegre

Para novo membro da Assembleia Legislativa do RS, eleição vai definir se Brasil vai reconstruir sua democracia, ou se de fato vai mergulhar no fascismo
Amaro Augusto Dornelles
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

* Atualizado em 10/11/2022 às 17h27.

Vereador em Porto Alegre desde 2020, ele se destacou no combate ao avanço do fascismo, racismo, entre outros crimes de direitos humanos. Seu gabinete monitora redes de ódio, o que já levou à prisão de neonazistas. Com currículo assim, não causa espanto ele ter já sido ameaçado de morte por grupos neonazistas. Além de ser investigado pelo Gabinete de Segurança Institucional do ex-capitão aspirante a ditador do Brasil.

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A última eleição para a Assembleia do Rio Grande do Sul trouxe uma novidade, até o momento praticamente desconhecida no resto do País: a eleição de um deputado assumidamente antifascista. Trata-se de Leonel Radde, do PT, 41 anos, policial civil e vereador da Câmara de Porto Alegre, que vai cumprir o atual mandato até o final de 2022.

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O candidato recebeu 44.300 votos e vai compor a bancada de 11 integrantes do Partido dos Trabalhadores. No começo de 2022, sua ação antifascista na Polícia e na Câmara lhe valeu ameaças de morte. De acordo com ele, o atentado – que se estenderia a Lula (PT), candidato à presidência da República e à Maria do Rosário (PT) deputada federal – tinha até data marcada: 31 de outubro.

O nome de Radde apareceu em dossiê elaborado sigilosamente pelo Ministério da Justiça em 2020, no qual foi identificado um grupo de 579 servidores federais de segurança, segundo o UOL. Todos teriam sido apontados como participantes de um movimento antifascista, críticos do governo de Jair Bolsonaro. Através de colegas, ele ficou sabendo que estava sendo investigado por agentes do Gabinete de Segurança Institucional, GSI, do gabinete da Presidência da República. 

Para novo membro da Assembleia Legislativa do RS, eleição vai definir se Brasil vai reconstruir sua democracia, ou se de fato vai mergulhar no fascismo

Foto: Amaro Augusto Dornelles
“Não é questão de gostar ou não, isso é política pública", afirma Radde sobre legalização da maconha




Contra o poder

A ingerência político-ideológica dentro da Polícia Civil foi um dos fatores determinantes para sua opção pelo trabalho parlamentar. Aprovado em concurso para Polícia Civil, ele começou a trabalhar em 2010. A partir daí, Leonel pôde constatar, na prática, como a política influencia a atividade policial, a política partidária e a política de governo. Além das perseguições daí decorrentes – quando o policial tem opção política que não se alinha com o poder.

Mas para entender melhor o que leva um policial eleito vereador e depois a deputado, com a bandeira antifascista – justamente em tempos em que o nazifascismo renasce com força no estado, no País e no mundo – é preciso conhecer melhor a vida do protagonista.

O novo deputado estadual do PT gaúcho vem de uma família ligada à arte e ao movimento sindical: “Meu pai, Ronald Radde, era diretor de teatro. Fundou o PDT, meu nome em homenagem ao Brizola, era do Movimento da Legalidade, fazia parte do Grupo dos 11. Minha mãe fundou o PT em 80, foi líder sindical dos bancários”. Ele vem de uma família que administrava a tradição do movimento sindical, social, com uma base artística que ultrapassou os limites do RS, como foi o caso do Teatro Novo. 

Aliás, sua entrada na polícia se dá depois de um tempo trabalhando com arte e cultura, antes de se formar em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS. Atualmente, ele cursa Ciências Econômicas, além de ser pós-graduado em Direito Penal, Processo Penal, Direito Público e História Contemporânea. Sua história de vida está ligada aos palcos, como ator, iluminador e músico. Esse veio ainda está ativo: é vocalista do grupo Calibre, que divide com amigos apreciadores do velho e bom rock'n roll.


Perseguição ideológica

Leonel já cursava direito quando abriu concurso para a Polícia Civil, com 29 anos: “Era uma área em que estava me interessando, pois eu dava treinamento para agentes da Segurança Pública na parte de artes marciais, imobilização, algemação, defesa pessoal para a Guarda Municipal. Desde os 16 comecei a treinar artes marciais”. A partir daí ele começou a se interessar pelo trabalho como policial – já fazia Direito, depois de se graduar em História.

Leonel Radde começou a trabalhar na Polícia na época do governo Tarso Genro (PT) de 2011 a 2015. De acordo com ele, Genro valorizou demais as carreiras, tanto no tocante a investimento, quanto no respeito e valorização dos servidores. Foram 2 anos e depois a transição para o governo José Ivo Sartori (MDB, 2015/19). O governo do emedebista teria sido um “inferno; brutal ruptura, muito grande, com muito aparelhamento e perseguição ideológica, político-partidária”, desabafa.

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E cita alguns exemplos. Sua entrada na política teria ocorrido por que a partir de 2015 teria passado a sofrer perseguição política uma depois da outra, por parte da Corregedoria da Polícia. Foi por isso que ele teria resolvido se candidatar em 2016. Em 2014, recorda, fizera campanha para Tarso: “Os delegados já queriam me punir. Houve uma reunião e o delegado que trabalhava comigo, ligado à campanha do Sartori, disse que não iria me punir”.


Candidatura ou demissão

“Mas ele me avisou que iriam me punir. Pois em 2015 a primeira sindicância movida contra policial foi contra mim, por que eu criticava o governador”. A segunda investigação teria ocorrido por ele criticar a sindicância. E última quando Leonel denunciou que faltava papel nas delegacias. “Meu pai estava na UTI, entubado, em coma, eles sabiam disso e me ferraram igual”. A sindicância era política: “Porque tu estás aqui se é comunista?”, indagavam seus detratores. 

Sua opção pelo PT, partido no qual é filiado desde 99, foi o caminho natural. Mas até então ele era apenas mais um militante. Ele recorda que até então não havia a menor pretensão de ter carreira política representativa. Seu projeto era ajudar a eleger os projetos que eu apoiava, os nomes de sua confiança para prefeitos, governadores, deputados.

Não tinha vida orgânica partidária. Quando chegava o período de eleição, Leonel pegava o panfleto, ajudava a distribuir, fazia caminhadas, comícios de bandeira em punho. Distribuía adesivo, o militante clássico, sem vinculação com nenhuma tendência. Mas quando começaram essas perseguições, lá no final de 2015, depois de tomar o terceiro inquérito de cunho político, ele resolveu se candidatar:

“Era o período em que Dilma Rousseff estava sofrendo “impeachament”, ano eleitoral. Sartori estava fazendo todo o desmonte do estado junto com o MDB. Senti que era a forma que eu tinha de agir. Se continuasse naquela toada – de eu falar no meu espaço particular, fora do horário de serviço e mesmo assim sendo punido – eles iriam me demitir, mais cedo ou mais tarde”. Ou ele recuava ou ia pra linha de frente sendo candidato.


Prisões de neonazistas

Candidato (não eleito) à Assembleia Legislativa 2015, seu objetivo era ser candidato durante 3 meses, “bater forte como candidato” e voltar para Polícia até o final do ano. Assim eles não poderiam puni-lo, pois disputava eleição e tinha imunidade. “Voltei em 2016 e eles me mandaram para outro departamento, me perseguindo da mesma forma, dentro dos limites que eles podiam”. Foi isso, até chegar à eleição de vereador, em 2020, e agora de deputado estadual. Seu mandato como vereador começou em 2021, permanecendo até o final de 22. Aí começa o mandato como deputado estadual.

Fazendo um balanço de sua atuação na Câmara Municipal, o petista ressalta que seu objetivo era fazer o debate antifascista, monitoramento das redes de ódio, do avanço da extrema direita, em cima da violência política do Estado. “Aprovamos projeto de lei primordiais, que tinham a lógica dos direitos humanos, direitos das mulheres, luta anti machista. Temos uma operação aqui no mandato que identifica neonazismo, intolerância. Conseguimos prisões em relação a isso” exemplifica Leonel, citando também aprovação da criação da Casa da Mulher Vítima de Violência. Foi aprovado também a distribuição de absorventes para mulheres vulneráveis. 

Sólida, histórica e antifascista: a oposição contra ovo de serpente que gerou bolsonarismo

Outra lei de sua autoria aprovada foi a que obriga a colocação de câmeras no uniforme dos guardas municipais. A lista é grande, e inclui legislação para preservar o meio ambiente, Antirracista, Antifascista, Antimisoginia e Anti LGBTfobia. Assim como a aprovação do Dia da Visibilidade Trans, Projeto Indicativo Trans Cidadania, para pessoas trans e travestis terem acesso à educação. E também a sensibilização dos funcionários da Prefeitura para lidar com esse público. Outra iniciativa polêmica tomada em sua gestão foi a discussão do uso da cannabis sativa medicinal e também recreativa: já seriam dois projetos tramitando. 


Apropriação da segurança pública

“Sou favorável à regulamentação e comércio da maconha. Essas são pautas que defendo tranquilamente”, assume ele, acossado, como diz, por uma legião de colegas que o atacam por defender tais pautas. Em sua defesa, ressalta que, justamente por ser policial, tem a obrigação de defender uma política pública para o tema: “Não é questão de gostar ou não, isso é política pública. Regulamentação e legalização, independentemente de gostar ou não, é tudo política pública”.  E observa que Canadá já o fez, EUA, Suíça, México, Colômbia e Paraguai estão fazendo, o mundo global que já está aderindo. Em sua avaliação, na hora em que o aspecto financeiro aparecer, a disputa vai se dar entre opção orgânica, agricultura familiar, multinacionais e agronegócio.

Mexer em temas tabus como esses já lhe renderam vários pedidos de cassação de seu mandato, movidos por vereadores da extrema direita. A Comandante Nádia, do PP (ele jamais cita cargo policial ou profissional de seus pares na Câmara, pois dentro do parlamento todos são iguais) e Fernanda Abarth (PSC) outra representante da extrema direita, são dois exemplos. Na verdade Leonel Radde assume ser o alvo primordial na Câmara Municipal de Porto Alegre. E se diz preparado para enfrentar o mesmo problema a partir de 2023 na Assembleia Legislativa. 

Tem uma disruptiva nesse processo, analisa ele, a partir de sua experiência pessoal: “Ora, eu sou um policial da linha operacional. Até um dia antes de assumir na Câmara eu trabalhava na Delegacia de Homicídios, cumpria mandatos, investigações. Me formei em operador tático, policial de ponta nas operações. Sou policial operacional mesmo”. A direita, raciocina, se sentiria desmoralizada mesmo. E e tentaria destruí-lo de qualquer modo. Ele apareceria como o ponto fora da curva, capaz de desmanchar o discurso da extrema direita de apropriação da segurança pública.


“Não se resolve dia 30”

Fazendo um exercício de autoavaliação, ele diz assumir seu perfil combativo, na maioria das vezes até duro. Mas por outro lado atua também com a lógica diplomática, da política tradicional. Na ótica de Radde, não se pode fazer política só na porrada, o que o impediria de fazer a política pública, necessária para atender às necessidades da população.

Fascismo no Brasil não é modelo passageiro, mas geracional

Para o novo deputado estadual do PT-RS, essa eleição vai definir se o Brasil vai reconstruir sua democracia, ou se de fato o País vai mergulhar no fascismo, com sistema autoritário. A extrema direita e parte do centro vão naturalizar a ação deles, prevê. Com ampla maioria na Câmara Federal e no Senado a situação estará à feição deles: 

– Nesse processo que estamos vivendo, essa disputa, a extrema direita está com muito poder financeiro. Precisamos ficar atentos ao que estamos vivendo, precisamos articular ações para impedir que esse grupo tenha força necessária para implementar esse golpe de estado. Mas isso não se resolve com a eleição de 30 de outubro.

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Este é o primeiro texto de uma série de três reportagens sobre a situação de Porto Alegre (RS) sob a ótica do deputado estadual Leonel Radde (PT). Confira também Eduardo Leite nem reassumiu governo do RS e Porto Alegre já virou um inferno e Fascistas nas ruas, serviço público precário e prefeito negligente: Porto Alegre volta a 1964.

Amaro Dornelles | Colaborador da Diálogos do Sul.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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