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Caça e tiro esportivo na mira: UE quer banir 44 mil toneladas de chumbo por ano na natureza

876 mil toneladas de chumbo em 20 anos, 156 milhões de aves ameaçadas e 13,8 milhões de pessoas expostas: UE quer barrar o metal tóxico, mas enfrenta resistência do setor de caça e tiro esportivo
Armando G. Tejeda
La Jornada
Madri

Tradução:

Beatriz Cannabrava

A União Europeia (UE) caminha para se tornar uma região livre de chumbo no meio ambiente, pelo menos aquele proveniente da caça e do tiro esportivo. A Comissão Europeia (CE) apresentou um projeto de lei que propõe a proibição do uso de munição de chumbo em todos os contextos e ambientes.

A restrição não se limitará aos solos úmidos – onde já havia sido proibida em 2023 –, mas se estenderá também à utilização de chumbo em equipamentos, especialmente os usados na pesca.

A Agência Europeia de Substâncias e Misturas Químicas (ECHA) estima que, com essas medidas, será possível evitar o despejo de aproximadamente 876 mil toneladas de chumbo no meio ambiente ao longo de duas décadas – cerca de 44 mil toneladas por ano. Com isso, aproximadamente 156 milhões de aves serão preservadas da contaminação.

O debate sobre o uso do chumbo na caça, no tiro esportivo e na pesca já se arrasta há anos dentro das instituições europeias. Diversas propostas para eliminar gradualmente esse material tóxico e nocivo ao ecossistema, que também impacta a cadeia trófica de diversas espécies consumidas por humanos.

Histórico da regulamentação

O primeiro grande passo foi dado em 2023, quando a União Europeia decidiu proibir totalmente o uso do chumbo em terrenos úmidos. Estudos científicos comprovaram uma alta contaminação das aves nativas nesses locais.

A nova proposta da CE estabelece um período de transição de três a cinco anos, além de algumas exceções, como nas modalidades de tiro esportivo, especialmente durante os Jogos Olímpicos e outras competições.

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O texto do projeto de lei destaca que 

“o chumbo está classificado como altamente tóxico para a vida aquática e prejudicial à reprodução, devido aos seus efeitos adversos sobre a fertilidade e o desenvolvimento do sistema nervoso fetal e infantil, causando danos permanentes e redução do coeficiente intelectual. Não foi identificado um limite seguro de concentração abaixo do qual o chumbo não cause impactos negativos à saúde humana. Além disso, a exposição ao chumbo está associada a um maior risco de doenças cardiovasculares, renais e do sistema nervoso central em adultos. Nos animais, especialmente nas aves, a intoxicação pode levar à morte.”

Caso as emissões continuem, “nos próximos 20 anos, aproximadamente 876 mil toneladas de chumbo serão despejadas no meio ambiente. Além disso, cerca de 135 milhões de aves estarão em risco de envenenamento por ingestão de balas de chumbo, 14 milhões por contaminação via consumo de alimentos e sete milhões por outras formas de exposição.”

Efeitos da contaminação e resistência do setor

A dispersão de grandes quantidades de chumbo nos ecossistemas provoca o envenenamento de diversas espécies, seja por ingestão direta – aves aquáticas confundem o chumbo com pedras –, seja pela cadeia alimentar, já que predadores e comedores de carcaças ingerem carne contaminada.

A organização de defesa do meio ambiente SEO-BirdLife alerta que “essa contaminação invisível, além de afetar a água e o solo, representa um risco à saúde humana. Fragmentos de chumbo são frequentemente ingeridos por aves aquáticas como cisnes, flamingos, patos e gansos, resultando na morte estimada de mais de um milhão de aves.” A entidade defende a substituição do chumbo por metais não tóxicos.

Embora a maior parte dos resíduos provenha dos cartuchos de balins – cujo disparo libera uma nuvem de perdigotos ao serem disparados –, o estudo europeu também incluiu as balas usadas na caça de grande porte e os pesos utilizados na pesca esportiva em rios. Estima-se que as balas deixem mais de 350 toneladas anuais de chumbo nos países da UE, enquanto os pesos de pesca despejem pelo menos duas mil toneladas extras nos leitos fluviais.

Além disso, calcula-se que, anualmente, cerca de 13,8 milhões de pessoas de famílias de caçadores – incluindo 1,1 milhão de crianças com sete anos ou menos – estejam vulneráveis à exposição ao chumbo presente na carne de caça.

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Apesar das evidências, a Federação Europeia para a Caça e a Conservação (FACE) criticou a proposta, alegando que “a avaliação de riscos da ECHA sobre o chumbo em munições se baseia em suposições e estimativas tendenciosas, com um claro viés político para a proibição total.” Segundo a entidade, o estudo teria uma “base científica frágil.”


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul Global.

Armando G. Tejeda Mestre em Jornalismo pela Jornalismo na Universidade Autónoma de Madrid, foi colaborador do jornal El País, na seção Economia e Sociedade. Atualmente é correspondente do La Jornada na Espanha e membro do conselho editorial da revista Babab.

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