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ToggleApós o mandatário dos Estados Unidos, Donald Trump, “pausar” o fornecimento de armamento à Ucrânia, e antes mesmo de falar diante do Congresso sobre sua gestão para deter a guerra na Ucrânia, entre outros temas, seu colega ucraniano, Volodymir Zelensky, publicou na terça-feira (4) nas redes sociais uma mensagem que busca demonstrar sua intenção de alcançar a paz “o mais rápido possível e sob a firme liderança do presidente Trump”.
O líder ucraniano começou com um parágrafo alinhado à retórica de Trump: “Nenhum de nós quer uma guerra interminável. A Ucrânia está pronta para se sentar à mesa de negociações para alcançar a tão desejada paz. Ninguém quer mais a paz do que os ucranianos. Minha equipe e eu estamos dispostos a trabalhar sob a firme liderança do presidente Trump para alcançar uma paz sólida. Estamos prontos para agir rapidamente para pôr fim à guerra.”
O texto continuando propondo como primeiro passo – parte do plano que a Ucrânia está acordando com o grupo de países liderado pelo Reino Unido e pela França – “libertar todos os prisioneiros de guerra, estabelecer um cessar-fogo imediato no espaço aéreo, proibindo mísseis, drones de longo alcance, bombardeios a infraestruturas energéticas e a outros alvos civis, assim como o fim imediato das hostilidades no mar, se a Rússia fizer o mesmo”.
Depois, Zelensky, em outro gesto para Trump, afirma: “Queremos avançar rapidamente nas próximas etapas (de um eventual entendimento) e, junto com os Estados Unidos, definir um acordo final sólido.”
Pedido de desculpas
Em seguida, o mandatário ucraniano expressa palavras que podem ser interpretadas como um pedido de desculpas que, em qualquer caso, são do agrado de Trump: “Nosso encontro em Washington, na Casa Branca, na última sexta-feira (28), não transcorreu como o previsto. É lamentável que tenha acontecido assim. É hora de fazer tudo da maneira correta. Gostaríamos que nossa cooperação e comunicação fossem construtivas.”
Zelensky então conclui com um verdadeiro presente ao líder estadunidense: “Quanto ao acordo sobre recursos naturais e segurança, a Ucrânia está disposta a assiná-lo a qualquer momento e em qualquer formato que seja conveniente. Consideramos que esse pacto é um passo para o fortalecimento da segurança ucraniana e uma garantia firme dessa segurança, e confio sinceramente que a simples presença de estadunidenses na Ucrânia servirá como uma espécie de garantia de segurança e funcionará com eficácia.”
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A mudança de atitude de Zelensky, que até a noite de segunda-feira, (3 de fevereiro, horário da Ucrânia) estava convencido de que não havia cometido nenhum erro em Washington, ocorreu por razões tão pragmáticas quanto a pressão exercida por seu homólogo estadunidense: devido à diferença de fuso horário em relação a Washington, Kiev e outras cidades do país vizinho acordaram na terça-feira com a notícia – inicialmente extraoficial – do congelamento do fornecimento de armamento estadunidense. Não demoraram a se espalhar previsões alarmistas de legisladores e especialistas sobre quanto tempo a Ucrânia poderia resistir aos ataques russos sem essa ajuda.
Armas para 6 meses
O deputado Fedor Venislavsky, membro do comitê de Defesa da Rada Suprema (Parlamento), declarou à imprensa ucraniana que o exército do país possui armamento suficiente para resistir “pelo menos meio ano, mesmo sem receber ajuda adicional dos Estados Unidos”, supondo que Trump não decida reverter a pausa no fornecimento de armas imposta na segunda-feira (3).
Venislavsky esclareceu que essa estimativa se baseia em informações de inteligência recebidas durante uma reunião a portas fechadas de seu comitê legislativo. Se a “pausa” for mantida e a Ucrânia não encontrar uma maneira de substituir as armas fornecidas pelos EUA – sobretudo os sistemas de defesa antiaérea Patriot, os lançadores múltiplos de foguetes Himars e os mísseis de médio alcance Atacms –, o país estará em uma posição mais desfavorável diante da Rússia. No entanto, isso não significa que, dentro de seis meses, a linha de frente vá desmoronar, sugerem analistas militares como Yuri Fiodorov e Roman Leviyev.
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O Kremlin, por meio de seu porta-voz, Dmitry Peskov, classificou a decisão de suspender temporariamente a entrega de armas à Ucrânia como uma “notícia positiva”, que “pode efetivamente levar o regime de Kiev a participar de um processo de paz”, mas pediu que se aguarde uma confirmação oficial de Washington.
Ele acrescentou que, caso os Estados Unidos tornem irreversível o fim do fornecimento de armas à Ucrânia, isso representaria “a maior contribuição para a causa da paz” que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, poderia fazer. Tanto Moscou quanto Kiev estão cientes de que, devido à peculiar forma de Trump fazer política, tudo pode mudar a qualquer momento.
Antes de Zelensky ceder: os planos europeus
Na segunda-feira (3), o Kremlin criticou a nova iniciativa europeia para a Ucrânia, promovida por Grã-Bretanha e França, ao afirmar que armar o exército ucraniano não é um plano de paz. “Aí (em Londres, no domingo, 2 de fevereiro) foram feitas declarações sobre a necessidade de garantir com caráter urgente um maior nível de financiamento para a Ucrânia, o que claramente não é um plano de paz, mas sim fornecer recursos para continuar as ações bélicas”, assinalou o porta-voz Dimitri Peskov.
Após mencionar que a posição dos Estados Unidos e seus aliados em relação ao conflito armado na Ucrânia “se fragmentou” após o retorno de Donald Trump à Casa Branca, com o surgimento de “distintos matizes”, Peskov, em alusão à Grã-Bretanha, França e aos demais países que participaram do encontro na capital britânica, afirmou: “Resta um grupo de países que são, na verdade, uma espécie de ‘partido da guerra’, que declara estar disposto a continuar apoiando a Ucrânia para prolongar a guerra e garantir recursos para as operações militares”. Para o porta-voz da presidência russa, “esses países não dizem que é necessário, o quanto antes, criar condições que possibilitem a paz”.
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Segundo Peskov, a discussão aos gritos que ocorreu na última sexta-feira (28) entre o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e seu convidado, Volodymyr Zelensky, líder da Ucrânia — a qual ele qualificou como “um fato sem precedentes” — demonstrou a dificuldade de se entrar em uma trajetória de solução política com Kiev.
Isso porque, em sua opinião, “a Ucrânia e Zelensky não querem a paz, querem continuar a guerra”. Ele sustenta que “não será fácil chegar a uma solução negociada”, pois “os esforços de Washington e a vontade de Moscou claramente não são suficientes” e acrescentou que “alguém deve obrigar Zelensky a querer a paz; se os europeus conseguirem, melhor para eles”.
“Garantias de segurança’
Do outro lado das barricadas, em uma mensagem à nação ucraniana, logo após retornar da reunião em Londres na madrugada de segunda-feira (3), Zelensky destacou o apoio oferecido à Ucrânia pelo grupo de países liderado por Grã-Bretanha e França. “Todos concordamos em um ponto essencial: para uma paz real, são necessárias garantias de segurança reais”, indicou o líder ucraniano.
“Uma paz robusta e duradoura, assim como os termos corretos de um pacto para encerrar a guerra, são verdadeiramente nossa prioridade compartilhada”, sublinhou Zelensky, que mencionou, entre outros parceiros europeus, Grã-Bretanha, França, Noruega, Turquia e outros países do continente.
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Com essa iniciativa conjunta, segundo analistas, a Ucrânia e os membros do grupo liderado por Grã-Bretanha e França até então confiavam em convencer Trump a aceitar a exigência de Zelensky para estabelecer garantias de segurança vinculantes para a Ucrânia antes de declarar um cessar-fogo e iniciar negociações formais com a Rússia.
Após Trump criticar duramente Zelensky pelo que chamou de “a pior declaração que ele poderia ter feito”, quando disse que via “muito, muito distante” um possível entendimento com a Rússia, o líder ucraniano publicou em sua conta na rede social X:
“É muito importante que tentemos fazer com que nossa diplomacia seja consistente para podermos encerrar esta guerra o quanto antes. Precisamos de uma paz verdadeira, e os ucranianos a desejam mais do que ninguém, pois esta guerra destrói nossas cidades, nossas comunidades. Estamos perdendo nosso povo. Precisamos deter a guerra e garantir a segurança”.
E concluiu sua mensagem com uma deferência a Trump: “Estamos trabalhando junto com os Estados Unidos e nossos parceiros europeus, e confiamos muito no apoio de Washington neste caminho para a paz. A paz é necessária o quanto antes”.
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