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Foto: Volodymyr Zelensky / X

“Conferência pela Paz” de Zelensky: plano da Otan é manter guerra “até o último ucraniano”

Tanto Kiev (às ordens dos EUA) quanto Moscou – que não foi chamado para a reunião – mantém as já conhecidas exigências para um cessar-fogo
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Convocada pelo governo de Volodymyr Zelensky, a Conferência pela Paz Global, celebrada neste fim de semana em Bürgenstock, Suíça, não pode propiciar avanços em direção ao fim do conflito armado na Ucrânia ao excluir a Rússia, uma das partes beligerantes. Da mesma forma, nada contribui a capitulação exigida na sexta-feira (14) pelo chefe do Kremlin, Vladimir Putin, como condição para alcançar a paz o chefe do Kremlin, a qual já foi rechaçada por Kiev e o Ocidente.

Inútil conclave, os modestos resultados da Conferência em temas incluídos em praticamente todas as iniciativas de paz, mais de uma dezena, que foram formuladas – segurança alimentar, radioativa e nuclear, bem como questões humanitárias (trocas de prisioneiros e devolução de crianças, sobretudo), três dos 10 pontos da Fórmula para a Paz de Zelensky, que o Kremlin qualifica de ultimato –, dependerão da capacidade dos mediadores para facilitar entendimentos separadamente, como aconteceu com o chamado Pacto dos Cereais, selado em Istambul graças à Turquia e à ONU.

Tanto a Rússia quanto a Ucrânia, voltados em somar apoios da comunidade internacional, falam demais da reunião suíça; os primeiros, para minimizar sua importância pela ausência de China, Brasil, Arábia Saudita e outros países-chave; os segundos, para destacar a formação de uma coalizão de 80 países que a ajudam ou se mantêm neutros.

Para o próximo outono, Pequim e Brasília promovem celebrar sua própria conferência em torno da premissa compartilhada por eles de que é preciso sentar para negociar Moscou e Kiev após estabelecer um cessar-fogo que permita manter as posições de ambos nos campos de batalha. Porém, russos e ucranianos, no mais alto nível, rejeitam congelar a guerra e deixam claro que cessar hostilidades de modo temporário, sem solucionar suas controvérsias de fundo, apenas daria um respiro ao inimigo para preparar novos soldados e se rearmar com o fim de continuar os combates em condições mais favoráveis.

Em síntese, é impensável que Moscou e Kiev se sentem para negociar enquanto continuarem obstinados em acreditar que ainda podem vencer nos campos de batalha ou, pelo menos, não há motivos para jogar a toalha; uma porque ainda tem recursos para financiar sua campanha militar, e outra, armamento suficiente dos Estados Unidos e seus aliados.

Condições de Putin

O titular do Kremlin, Vladimir Putin, mencionou na última sexta-feira (14) as condições que a Rússia impõe tanto à Ucrânia quanto ao Ocidente – entendido como Estados Unidos e seus aliados –, para pôr fim ao conflito armado no país vizinho eslavo, ultimato que Kiev, Washington e Bruxelas rechaçaram de imediato.

“Assim que Kiev anunciar que está disposta a retirar completamente suas tropas de Donetsk, Lugansk, Kherson e Zaporíjia, assim como notificar oficialmente sua renúncia aos planos de ingressar na OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), imediatamente darei a ordem de cessar-fogo e iniciar negociações”, afirmou Putin ao se reunir no mesmo dia com a alta cúpula do ministério das Relações Exteriores da Rússia, cuja intervenção foi transmitida ao vivo pela televisão local.

Desta vez – sem recorrer a eufemismos como reconhecer “a realidade no terreno” (território “liberado”, segundo os russos; “ocupado”, de acordo com os ucranianos) –, Putin foi além ao dizer, pela primeira vez, que para que a guerra termine, a Ucrânia precisa renunciar a mais ou menos 20% de seu território, que o Kremlin já considera parte da Rússia, apesar de reconhecer que, quase dois anos e meio depois de sua operação militar especial, ainda não conseguiu chegar às fronteiras administrativas de nenhuma das quatro regiões que, para a Ucrânia, continuam sendo suas.

O mandatário russo ofereceu uma retirada “segura e sem obstáculos” ao exército ucraniano além dos limites que essas regiões tinham em 1991, quando a União Soviética se desintegrou, e reiterou que a Ucrânia deve se proclamar um país “neutro, fora de blocos e sem armas nucleares”, além de assumir o compromisso de desmilitarizar e “desnazificar” o Estado, objetivos que ele estabeleceu ao ordenar a operação em fevereiro de 2022.

“De forma inequívoca, devem ser plenamente garantidos os direitos, liberdades e interesses dos cidadãos russófonos da Ucrânia; deve ser reconhecido o status da Crimeia e de Sebastopol, bem como das repúblicas de Donetsk e Lugansk, e também das regiões de Kherson e Zaporíjia, como entidades da Federação Russa”, acrescentou.

O mandatário sublinhou que é necessário detalhar em acordos internacionais todas essas obrigações, além de que os Estados Unidos e seus aliados devem levantar todas as sanções contra a Rússia.

“A Rússia propõe não um cessar-fogo provisório ou congelar o conflito, mas realmente pôr fim à guerra na Ucrânia. Ou seja, chamamos a virar uma página trágica da história”, indicou.

E advertiu: “se Kiev e as capitais ocidentais renunciarem a isso, como fizeram no passado, serão, em última análise, responsáveis política e moralmente pela continuação do derramamento de sangue”.

O líder russo falou na véspera da Conferência pela Paz Global, e disse que “já podemos antecipar que (na Suíça) tudo se reduzirá a conversas vagas de caráter demagógico e a uma nova série de acusações contra a Rússia”.

Aproveitou também o encontro com diplomatas para lhes incumbir, diante do “fracasso do modelo euro-atlântico”, promover a criação de um sistema de segurança indivisível para a Eurásia, que permita a todos os estados não estarem sob ameaças, mediante um sólido compromisso vinculativo de garantias tanto no âmbito bilateral quanto multilateral.

“É importante partir do fato de que a futura arquitetura de segurança esteja aberta a todos os países euro-asiáticos que desejem participar. ‘Todos’, significa também países europeus, da Otan certamente”, destacou; “teremos que coexistir e trabalhar de alguma maneira, a geografia não se pode mudar”.

“Devemos aspirar a uma retirada gradual da presença militar de potências estrangeiras na região eurasiática”, indicou mais adiante tendo em mente os EUA.

De acordo com Putin, esse novo sistema de segurança coletiva “permitirá abordar de outra maneira, realmente construtiva, a solução de múltiplos problemas que há na atualidade”.

Na primeira reação de Kiev, Mikhailo Podolyak, assessor do escritório da presidência ucraniana, afirmou que “não se trata de nenhuma proposta de paz, mas sim do pacote padrão (de exigências) de um agressor”.

Enquanto isso, o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Lloyd Austin, disse que Putin não está em condições de dizer à Ucrânia o que fazer para alcançar a paz, e agregou: “Se ele quisesse, poderia acabar com a guerra hoje mesmo, só precisa retirar suas tropas do território soberano da Ucrânia”, expressou em Bruxelas ao término de uma reunião de ministros da Defesa da OTAN.

Por sua vez, o secretário-geral da aliança do Atlântico Norte, Jens Stoltenberg, que também participou desse encontro, enfatizou que “não é uma proposta de paz, é uma proposta de mais agressão, feita de má-fé porque a Ucrânia teria que ceder mais território do que a Rússia já ocupa”.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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