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Ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021 (Foto: TapTheForwardAssist / Wikimedia Commons)

Congresso dos EUA certifica vitória de Trump sob os fantasmas do ataque ao Capitólio

Enquadrada como “Evento de Segurança Nacional”, cerimônia mobilizou milhares de tropas da Guarda Nacional e provocou o fechamento de ruas ao redor do Capitólio
David Brooks, Jim Cason
La Jornada

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Nesta segunda-feira (6), o Congresso dos EUA certificou oficialmente o resultado eleitoral, confirmando que Donald J. Trump será o próximo presidente dos Estados Unidos. O evento foi cercado pelos fantasmas da tentativa de golpe de Estado ocorrida nesse mesmo Capitólio exatamente quatro anos atrás, e que agora reafirmou que já não há consenso sobre a legitimidade das contagens eleitorais nem sobre o traslado pacífico do poder.

A sessão conjunta do Senado e da Câmara de Representantes foi realizada atrás de uma cortina de grades de 3,6 metros de altura, reforçadas por barreiras de concreto e protegidas por oficiais da polícia e da Guarda Nacional portando armas automáticas — medidas implementadas porque, há quatro anos, quando o Congresso se reuniu para certificar o triunfo eleitoral de Joe Biden, o então presidente Trump incitou seus apoiadores, dentro e fora do Congresso, a tentar descarrilar, com violência, a contagem e a certificação dos votos.

Este ano, pela primeira vez na história dos Estados Unidos, o secretário de Segurança Interna determinou que essa contagem oficial era um “Evento de Segurança Nacional” e mobilizou milhares de tropas da Guarda Nacional, além de ordenar o fechamento de ruas ao redor do Capitólio, em Washington. Legisladores federais e a imprensa foram obrigados a passar por diversos pontos de inspeção, com o uso de cães farejadores de explosivos, enquanto milhares de policiais metropolitanos, junto com outros de apoio vindos de várias cidades, foram posicionados por toda a área federal. Todo esse processo foi ainda mais complicado por uma tempestade de neve que causou o fechamento das operações do governo federal e de grande parte da cidade, incluindo escolas.

Como exige a Constituição, a vice-presidente Kamala Harris, candidata democrata derrotada por Trump na eleição de novembro, presidiu a sessão conjunta, durante a qual os legisladores relataram, em ordem alfabética por estado, os resultados de cada unidade e o total de votos obtidos no sistema do colégio eleitoral, que garantiu a vitória de Trump. Nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, não há voto direto; cada estado realiza uma eleição, da qual são escolhidos delegados para um colégio eleitoral. É necessário um mínimo de 270 votos eleitorais, maioria simples, para vencer a eleição (o voto popular é secundário e, às vezes, não determina o vencedor).

Após a leitura dos resultados estaduais, Harris declarou: “Donald J. Trump, do estado da Flórida, recebeu 312 votos”. Depois de um aplauso da bancada republicana, acrescentou, falando em terceira pessoa: “Kamala D. Harris, do estado da Califórnia, recebeu 226 votos”. Com a certificação de sua própria derrota, Harris enviou uma mensagem de respeito ao processo e ao princípio do traslado pacífico do poder. Harris rapidamente declarou encerrada a sessão conjunta do Congresso e se retirou da Câmara. Em comentários aos jornalistas na saída, proclamou, em clara referência aos fantasmas de quatro anos atrás: “Hoje, a democracia dos Estados Unidos se sustentou”.

Mas outros não estavam tão confiantes. O senador democrata Andy Kim foi um dos vários democratas que ainda na segunda divulgaram imagens do violento ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021, quando os apoiadores de Trump invadiram o edifício para tentar descarrilar essa mesma contagem e a certificação dos votos do colégio eleitoral. O ataque obrigou o então vice-presidente Mike Pence e legisladores de ambos os partidos a se refugiarem em locais seguros dentro do complexo legislativo ou nas ruas, enquanto a polícia enfrentava manifestantes violentos por horas. Ao final, quando as forças de segurança conseguiram expulsar os invasores do Capitólio, a contagem interrompida foi concluída, e o triunfo de Biden foi certificado. No entanto, as repercussões desse incidente sem precedentes ainda persistem.

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Dos aproximadamente 12 mil participantes do ato violento, 1.580 foram acusados formalmente de delitos, mais de mil se declararam culpados e outros 220 foram condenados em julgamentos, segundo um cálculo da CBS News baseado em dados do Departamento de Justiça. Mas até a presente data, o ex-presidente Trump se recusou a reconhecer sua derrota e afirmou que entre seus primeiros atos ao retornar à Casa Branca estará emitir indultos presidenciais para aqueles que foram condenados por suas ações naquele dia. Não se sabe quantos, ou se todos, serão beneficiados.

Biden, em um artigo publicado no Washington Post também na segunda-feira, insistiu que sua eleição e a última de Trump comprovam que o sistema democrático estadunidense continua funcionando, mas afirmou que “a democracia – ainda nos Estados Unidos – nunca está garantida”. Ele advertiu que “um esforço incessante tem sido feito para reescrever – até apagar – a história daquele dia [6 de janeiro de 2021]. Para nos dizer que não vimos o que todos vimos com nossos próprios olhos. Para descartar preocupações sobre isso como se fosse algum tipo de obsessão partidária. Para justificá-lo como um protesto que simplesmente saiu de controle”.

Biden, nesse ponto, está correto. Dos legisladores que, na época, certificaram a eleição de Trump, 157 republicanos são pessoas que até hoje se recusam a reconhecer a derrota de Trump há quatro anos, incluindo o atual presidente da Câmara dos Representantes, Mike Johnson.

O próprio Trump continua argumentando que aquele 6 de janeiro, há quatro anos, foi “um dia de amor” e que aqueles acusados de cometer delitos são “prisioneiros políticos”, vítimas do mesmo Departamento de Justiça que o acusou penalmente por tentar bloquear a certificação do processo eleitoral.

Nem todos os republicanos compartilham a posição de seu líder máximo. Em dezembro, um grupo de advogados que trabalhou em governos republicanos declarou que conceder amplos indultos aos acusados de violência no 6 de janeiro de 2021 poderia enfraquecer o sistema político ao “enviar uma mensagem aos americanos de que atacar as instituições democráticas é apropriado e justificável”.

Em um editorial, o conservador Wall Street Journal argumentou que conceder indultos aos culpados pelos atos do 6 de janeiro “enviaria uma mensagem péssima sobre a percepção [de Trump] da aceitabilidade da violência política cometida em seu nome”. Mas Trump se recusa a conter seu apoio à violência política ou a proteger aqueles que violam as leis ao defendê-lo.

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As pesquisas nacionais durante o último ano indicam que quase um terço da população americana ainda acredita que a eleição de quatro anos atrás foi uma fraude. Para os 77 milhões que votaram em Trump desta vez, em 2024, suas mentiras documentadas sobre o sistema democrático dos EUA são aparentemente menos importantes do que suas promessas sobre um futuro em que “a América será grandiosa novamente”.

Com isso, concluiu-se formalmente o processo eleitoral. Trump será empossado como presidente em frente ao mesmo Capitólio no dia 20 de janeiro.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul Global – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.
Jim Cason Correspondente do La Jornada e membro do Friends Committee On National Legislation nos EUA, trabalhou por mais de 30 anos pela mudança social como ativista e jornalista. Foi ainda editor sênior da AllAfrica.com, o maior distribuidor de notícias e informações sobre a África no mundo.

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