Pesquisar
Pesquisar
O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol (Foto: Reprodução / Facebook)

Coreia do Sul: fã da ditadura, Yoon Suk Yeol calculou errado apoio à aventura autoritária

Votação unânime de parlamentares para revogar lei marcial, com apoio de seu próprio partido, frustrou tentativa de Yoon Suk Yeol de ressuscitar regime sanguinário de 1980
Julian Borger
elDiario.es
Madri

Tradução:

Ana Corbisier

Ao tentar declarar a lei marcial, o presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, tentou ressuscitar fantasmas que o restante do país acreditava estarem enterrados para sempre. A última vez que a lei marcial foi decretada, em 1980, centenas de pessoas morreram nas mãos do ditador militar Chun Doo-hwan, que enviou manifestantes a um campo de concentração para receber “educação purificadora”.

Durante sua meteórica ascensão ao poder, de procurador a presidente, Yoon indignou grande parte do país ao fazer comentários elogiosos sobre Chun, afirmando, há três anos, que muitas pessoas achavam que o general tinha feito um bom trabalho em termos políticos, apesar de seu golpe de Estado e da repressão violenta aos protestos.

Yoon, advogado e recém-chegado à política, viu-se obrigado a pedir desculpas e a visitar, em Gwangju, o monumento em memória do maior massacre da era Chun. No entanto, muitos de seus críticos questionaram a sinceridade de sua retratação. Eles também se alarmaram com o fato de Yoon ter promovido a altos cargos membros do Movimento Nova Direita, grupo que combina a defesa da economia de mercado com uma visão revisionista sobre o período colonial japonês e as ditaduras anteriores.

A breve declaração de lei marcial feita por Yoon parece ter sido uma aposta desesperada diante de uma popularidade em queda livre — com índices positivos que mal superam os 10% — em meio a uma greve de médicos e a uma forte oposição política, que inclui cada vez mais membros de seu próprio partido, Poder Popular. O líder do partido, Han Dong-hoon, afirmou que a declaração de lei marcial foi um “passo equivocado”.

Os partidos da oposição sul-coreana anunciaram nesta quarta-feira que apresentaram uma moção para destituir o presidente devido à declaração de lei marcial, segundo a AFP. “Apresentamos uma moção de censura elaborada com urgência”, declararam representantes de seis partidos de oposição, incluindo o principal, o Partido Democrático, em uma entrevista coletiva transmitida ao vivo. Eles acrescentaram que discutiriam quando submetê-la a votação, o que poderia ocorrer já nesta sexta-feira.

O erro de cálculo de Yoon Suk Yeol

É possível que Yoon tenha pensado que sua nostalgia pelo autoritarismo encontraria eco em pelo menos parte do espectro político sul-coreano, mas a votação unânime na Assembleia Nacional para revogar sua declaração, inclusive com apoio de seu próprio partido, sugere que ele calculou mal. Em questão de horas, foi forçado a recuar, e a lei marcial foi formalmente revogada após uma reunião do gabinete.

John Nilsson-Wright, diretor do programa sobre Japão e as Coreias da Universidade de Cambridge, afirma: “O fato de ter agido dessa forma é um sinal de que o governo está em uma situação de crise. Não acredito que reflita uma forte nostalgia da direita pelo autoritarismo; penso que é um reflexo da personalidade de Yoon. O impulso político já estava escapando de suas mãos, e talvez por isso ele tenha decidido agir assim. Mas foi uma decisão temerária e profundamente equivocada”.

O chefe do Estado-Maior do Exército, general Park An-su, chegou a declarar a proibição de toda atividade política e a imposição do controle militar sobre “todos os meios de comunicação e publicações”, mas essas declarações foram completamente ignoradas. A Assembleia Nacional estava em ebulição, as ruas cheias de manifestantes, e os meios de comunicação da Coreia do Sul continuaram informando sobre os acontecimentos à medida que se desenrolavam.

Não está claro se as declarações iniciais de Park se deveram à mera incerteza sobre a legalidade constitucional de uma situação sem precedentes ou a um autêntico entusiasmo golpista. Em seu discurso noturno, Yoon afirmou que as tropas retornariam aos quartéis, mas, historicamente, exércitos que experimentaram o poder político raramente se curam totalmente do vício.

A invocação por Yoon de uma ameaça estrangeira, representada por “forças comunistas norte-coreanas” e seus supostos simpatizantes no Sul, parece extremamente frágil, mas corre o risco de se tornar uma profecia autorrealizável.

Aliança Rússia-Coreia do Norte reconfigura geopolítica e devora hegemonia dos EUA na Ásia

Em Pyongyang, Kim Jong-un está desfrutando de um ressurgimento, saindo do isolamento graças à necessidade de ajuda militar de Vladimir Putin na Ucrânia. É altamente provável que ele tente explorar o momento de fraqueza de Seul. Qualquer movimento agressivo do Norte poderia oferecer uma justificativa retrospectiva para Yoon e os militares.

“Para um presidente que se concentrou tanto na reputação internacional da Coreia do Sul, isso faz com que o país pareça muito instável”, disse Mason Richey, professor da Universidade Hankuk de Estudos Estrangeiros de Seul, à agência Reuters: “Isso terá um impacto negativo nos mercados financeiros e cambiais, além de prejudicar a posição diplomática da Coreia do Sul no cenário global”.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Julian Borger

LEIA tAMBÉM

Guerra na Ucrânia conflito pode chegar ao fim em 2025
Ucrânia | Guerra terminará em 2025 como prometeu Trump?
Tensões criadas por Trump impõem à América Latina reação ao imperialismo
Trump exacerba as contradições entre EUA e América Latina
Amyra El Khalili Qasem Soleimani desnudou a imoralidade do imperialismo e colonialismo sionista
Amyra El Khalili: Qasem Soleimani desnudou a imoralidade do imperialismo e colonialismo sionista
Síria as promessas de al-Julani e os sinais de um novo Estado Islâmico
Síria: as promessas de al-Julani e os sinais de um novo "Estado Islâmico"