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Associação exalta García Lorca, fortalece kirchnerismo e repudia desastre macrista

Mais do que pedindo votos para Alberto Fernández e Cristina Kirchner, a Lorca vai fiscalizar para que os neoliberais sejam definitivamente derrotados
Leonardo Wexell Severo
ComunicaSul
Buenos Aires

Tradução:

“Há coisas encerradas dentro dos muros que, se saíssem de repente para a rua e gritassem, encheriam o mundo”

Federico García Lorca

A eleição presidencial deste domingo (27) na Argentina contou com um componente fundamental: a mobilização de centenas de milhares de militantes de entidades de base que farão a diferença pela dedicação, engajamento e consciência como encaram e encarnam a história, a cultura e a própria política.

Pela criatividade e desprendimento com que tem atuado nestes últimos anos, e também pela capacidade de aglutinar em rede os filhos, netos e até bisnetos das muitas centenas de milhares de espanhóis que fizeram da terra de San Martín e de Perón a sua segunda pátria, fomos ouvir os dirigentes da Agrupação Federico García Lorca.

Mais do que pedindo votos para Alberto Fernández e Cristina Kirchner, a Lorca vai fiscalizar para que os neoliberais sejam definitivamente derrotados e se abra um novo período de progresso e integração para o país e para a região. A prioridade agora é a construção de “uma Argentina para todos”, como diz o slogan da campanha.

Exaltando a coragem e a honradez do poeta e dramaturgo republicano assassinado pelos fascistas espanhóis em 1939, a Lorca tem ocupado lugar de destaque no último período seja na capital, Buenos Aires, ou no interior, sempre fortalecendo a luta por “verdade, memória e justiça” contra as ditaduras, profundamente comprometida com os processos populares da nossa América Latina.

Mais do que recordar, a Lorca está empenhada em dar carne e vida ao pensamento de um gigante que tombou de pé, conclamando a não nos deixarmos alienar ou abater.  Que ensinou com seu exemplo a que não devemos jamais renegar o que somos, nem para aonde iremos. “Há coisas encerradas dentro dos muros que, se saíssem de repente para a rua e gritassem, encheriam o mundo”, nos dizia.

Portanto, rompamos os muros.

Mais do que pedindo votos para Alberto Fernández e Cristina Kirchner, a Lorca vai fiscalizar para que os neoliberais sejam definitivamente derrotados

Foto: Leonardo Wexell Severo / ComunicaSul
Equipe de dirigentes da Agrupação Federico García Lorca

Confira a entrevista

ComunicaSul – Diante dos sucessivos ataques do governo de Macri ao presente e ao futuro dos argentinos, qual o significado desta eleição de domingo?

Gustavo Fernandez – Tratar de mudar o rumo neoliberal implantado por Mauricio Macri e voltar a ter um projeto nacional, com um caráter inclusivo. Com Macri, o neoliberalismo está tão marcado em todas as esferas de governo que devastou a vida de milhões de pessoas, sobretudo pela perda de emprego, jogando muita gente na marginalidade. Precisamos voltar ao mesmo projeto iniciado com Néstor Kirchner em 2003 que buscava a redistribuição da riqueza com um caráter social, diferente do esquema mercantilista atual. Acreditamos que o kirchnerismo representa essa corrente ideológica que busca se contrapor a um modelo de exclusão que vem sendo aplicado desde a época da ditadura.

Infelizmente, durante os 12 anos em que fomos governo, nunca estivemos no poder, que sempre esteve nas mãos do setor econômico, financeiro e dos grandes latifundiários. Nas mãos de uma oligarquia que trabalha em consonância com a Embaixada dos Estados Unidos e os interesses internacionais. Seu objetivo é claro: que a Argentina seja uma espécie de provedora de matérias-primas, com mão-de-obra barata, à custa da fome e da miséria do povo.

Para a manutenção do poder e desses privilégios em tão poucas mãos, qual tem sido o papel dos conglomerados privados de comunicação?

Clecia Volonteri – Durante todo o governo de Néstor e Cristina Kirchner os meios de comunicação massivos estiveram praticamente contra tudo o que eles faziam, porque obedecem a um conglomerado enorme que é o Grupo Clarín. São meios de comunicação hegemônicos que trabalharam abertamente para sabotar o governo de Néstor e Cristina. Quando subiu Macri houve perseguições a jornalistas que defendiam o interesse nacional e popular, multiplicando-se os presos políticos.

Macri implantou uma política de privatização e desnacionalização do patrimônio público. Como ela foi sustentada pela mídia?

Clecia Volonteri – Primeiro é preciso destacar, e isso é uma opinião minha, que Cristina foi excessivamente democrática ao permitir que a mídia caluniasse e difamasse as figuras de maior expressão do kirchnerismo, sem qualquer prova. Isso tudo dentro de uma estratégia.

A presidenta retirou uma disposição com a qual não se podia agredir ou difamar, acabou com a lei de calúnias, o que permitia que dissessem qualquer coisa com total impunidade. Desta forma, Macri, de posse dos meios de comunicação, se viu muito mais fortalecido e tirou do seu caminho a Lei da Mídia, que era uma conquista da sociedade. Os meios então se dedicaram a blindar o governo Macri, minando todas as figuras do Kirchnerismo com um slogan que marcou muito nas pessoas: “Eles roubaram tudo”. Isso sem ter nenhuma prova.

Gustavo Fernandez – Outro problema é que houve um setor da Justiça que validava esta mentira. Assim aparecia um juiz bancado por estes setores e logo uma investigação feita pela mídia repercutia, retroalimentando e validando sem provas. Assim foi no macrismo para justificar os monumentais reajustes de tarifas e uma política contrária ao povo.

Dessa forma passou a se ver pessoas com fome pelas ruas e corriam rumores que eram militantes que se vestiam de indigentes para criar um clima social desfavorável. Isso dá uma mostra do golpe que nos deram envolvendo imprensa, Justiça e política.

Clécia Volonteri – Um exemplo contundente foi a prisão de Milagro Salas, que expressa o tamanho do ódio de classe e a boa cota de racismo e de fascismo deste governo.

Qual o papel do Kirchnerismo na história argentina?

Gustavo Fernandez – O Kirchnerismo abre uma porta e faz um convite à militância para participar da política. Nós que somos descendentes de espanhóis temos uma identidade política marcada pelo exílio republicano e por todo o significado que tem o anti-franquismo na Argentina. São coisas que geraram este encontro, a sintonia com o projeto de Néstor Kirchner, do que ele representava, e dentro desta conjuntura nasce a nossa organização.

Neste contexto o que nos propomos é recuperar a identidade política dos anti-fascistas espanhóis dentro de uma luta mundial e traduzi-la para os tempos atuais, uma vez que os objetivos se assemelham aos daqueles da República espanhola. Há pontos muito coincidentes e, portanto, a reação da direita é coincidente. Pode não ser tão violenta como sofreram nossos avós, mas há toda a rede de mentiras e calúnias, da mesma forma que eles sofreram na República espanhola, com outra tecnologia, mas com o mesmo conteúdo. Temas que se repetiam, como o da construção de Franco como líder, a mesma ideia. Felizmente, temos uma bagagem política que nos permite ver as coisas do outro lado.

Clécia Volonteri – No meu caso sempre fui socialista, de esquerda, mas foi a partir de Néstor e Cristina que me aproximei do peronismo e da Agrupação Federico García Lorca, pois me sinto profundamente identificada com a República espanhola. A Argentina recebeu muitos refugiados republicanos e sempre deixou claro que esta não é uma causa da Espanha, mas da Humanidade.

Uma das linhas de atuação da agrupação de vocês é precisamente a defesa dos direitos humanos. Em relação a este ponto em especial, qual a diferença da política do atual governo para a dos Kirchner?

Gustavo Fernandez – Há uma visível diferença do Kirchnerismo, quando se pôde julgar os  genocidas e implementar uma política de verdade, memória e justiça, diferente daquela implantada na Espanha. Na Argentina, o Estado aportou tudo para que se pudesse investigar e adotar uma política de direitos humanos. Tanto é assim que lá nos tomam como exemplos. Temos inclusive uma ação contra os crimes de lesa-humanidade do franquismo, baseada no direito internacional, que tem grande significado e repercussão.

A vitória neste domingo dará continuidade e impulso a esta luta.

*Leonardo Wexell Severo é jornalista, colaborador da Diálogos do Sul e participa da cobertura especial das eleições argentinas realizada pelo Coletivo de Colaboração Comunicativa ComunicaSul.

 

* O Coletivo de Comunicação Colaborativa ComunicaSul está cobrindo as eleições na Bolívia, Argentina e Uruguai com o apoio das seguintes entidades: Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Hora do Povo, Diálogos do Sul, SaibaMais, Fundação Perseu Abramo, Fundação Mauricio Grabois, CTB, CUT, Adurn-Sindicato, Contee, CNTE, Sinasefe-Natal, Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos e Região, Sindsep, Sinpro-MG e Apeoesp.

É livre a reprodução desde que citada a fonte.

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
Leonardo Wexell Severo

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